Ilustração — Cruz (Fonte: Pixabay)

Os responsáveis pela morte de Cristo

Regina Fernandes Sanches
Editora Saber Criativo

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Por Mário Amaral

Para entendermos os motivos da morte de Jesus Cristo Stott inicia pela identificação de quem foi ou quais foram o(s) responsável(is) pela morte de Jesus. Primeiramente, ele analisa o papel desempenhado por Pilatos[1], com sua astúcia administrativa e justiça implacável. Pilatos condenou Jesus à morte mesmo dizendo “Não acho culpa alguma neste homem” (Lc 23:4). As ações de Pilatos denunciam incapacidade de assumir posição contrária à vontade do povo. Ele seguiu a opção mais fácil e entregou Jesus aos soldados para que fosse morto.[2]

Em segundo lugar, os judeus e os sacerdotes que os manipulavam, têm culpa na crucificação. Os primeiros, que o haviam aclamado na entrada da Páscoa (Cf. Mt 27:1–31), pela inconstância diante das situações. Os segundos por conspirarem contra a ameaça de Jesus ao status quo[3] e à tradição. Jesus revelava a vulnerabilidade de sua posição e como poderiam perder o controle sobre o povo. Viam Jesus como um rival ameaçador, que manipulava o povo, e levaram a multidão a pedir sua morte como um bandido[4].

Em terceiro lugar, Judas Iscariotes, o discípulo traidor de seu mestre. Ele que, mesmo instigado por Satanás (Cf. Jo 13:2 –27 e Lc 22:3), fez sua escolha pessoal em trair Jesus, mostrou o seu caráter, sua falha moral e ganância.

Em quarto e último, quem crucificou Jesus foi à humanidade e os seus pecados. Entendemos que a responsabilidade é de todos; dos sacerdotes e judeus, de Pilatos e dos romanos, de Judas, de todos os discípulos, em resumo de toda a humanidade, em todos os tempos. Devemos compreender que: “antes que possamos começar a ver a cruz como algo feito para nós (que nos leva a fé e a adoração), temos de vê-la como algo feita por nós (que nos leva ao arrependimento)”. Para Stott, Jesus se entregou para a cruz, voluntariamente, por obediência e amor, desde o início do seu ministério, pois era sua missão. Os escritores neotestamentários escreveram sobre essa entrega voluntária de Jesus, para isso, utilizaram o verbo paradidom, o passivo teológico, cujo sujeito é Deus indicando que Jesus foi entregue à morte (Cf. Ef 5:25; Lc 23:46). Em Gl 2:20, “o filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou (paradontos) por mim” evoca Isaías 53:12: “derramou (paradothe) a sua alma na morte”. [5]

Stott afirma a necessidade de conservar as duas formas de interpretação. A primeira, que Judas entregou Jesus aos sacerdotes, que entregaram a Pilatos, que entregou aos soldados, que o crucificaram. A segunda, que o Pai o entregou e ele se entregou para morrer pela humanidade. Na medida em que se entende a cruz, podemos entender que “Eu o matei [Jesus], meus pecados enviaram a cruz; e ele se matou; seu amor o levou a cruz”[6]. E, respaldando-se nas cartas de Pedro[7], que atribui a morte de Jesus simultaneamente ao plano de Deus e a maldade do ser humano.[8]

Nessa segunda forma de interpretação, Stott identifica quatro estágios: a) “Jesus morreu por nós” (Cf. Jo 10:11, 15; Lc 22:19); b) que Cristo morreu para conduzir a humanidade a Deus (Cf. 1Pe 3:18)[9]; c) Cristo morreu pelos pecados da humanidade[10] (Cf. Rm 5:12; 1Co 15:3)[11]; d) Cristo sofreu a morte da humanidade, ou seja, o “salário do pecado” (Rm 6:23)[12]. Ele resume esse tópico como:

Esta construção quádrupla preliminar, que Cristo morreu por nós, para o nosso bem; que esse “bem” pelo qual ele morreu era a nossa salvação; que a fim de no-la assegurar, ele teve de enfrentar os nossos pecados; e que, ao morrer por nossos pecados, foi a nossa morte que ele sofreu “.[13]

Sendo assim, Stott contribui para a reflexão sobre a cristologia, que passa pela compreensão tanto da natureza humana quanto da divina de Jesus. Ressalta a missão salvífica e a obediência ao Pai, na soteriologia mostra a morte de Cristo pela humanidade pecadora. Esse sacrifício inevitável e o seu significado salvífico serão o alvo da reflexão no próximo item.

(Trecho do livro Cristianismo de Cruz — Mário Amaral)

[1] Procurador da província da Judéia, nomeado por Tibério ali serviu por 10 anos de 26 a 36 d.C. (Cf. STOTT, 1991, p.42).

[2] STOTT, 1991, p. 41 –44.

[3] Status quo é uma expressão latina (in status quo ante) que designa o estado atual das coisas, seja em que momento for.( WIKIPEDIA; Disponível em :<http://pt.wikipedia.org/wiki/Statu_quo>)

[4] Cf. STOTT, 1991, p. 44–47

[5] Ibidem, p. 50–52.

[6] STOTT, 1991, p. 53

[7] At 2:23; Cf. 4:28. Mais tarde, em sua primeira carta, Pedro descreve ao cordeiro como tendo sido escolhido “antes da criação do mundo” (1Pe 1:19–20). (Cf. STOTT, 1991, p.329).

[8] STOTT, 1991, p. 53.

[9] Conforme Stott, pelo viés negativo, como redenção, perdão ou libertação e pelo viés positivo, vida nova (Cf. STOTT, 1991, p.54–55).

[10] A soteriologia patrística confirma as afirmações e, Agostinho de Hipona, ratifica esse estágio ao dizer que Jesus “foi sacrificado pelo pecado, oferecendo a si mesmo como o pleno holocausto na cruz de sua paixão” (Cf. AGOSTINHO apud MACGRATH, 2005, p. 471).

[11] 1Pe 3:18, Hb 9:26; 10:12, 1Jo 1:7 e Ap 1:5–6 em todos esses textos, enfatiza-se a morte substitutiva, vicária e suficiente de Jesus (Cf. STOTT, 1991, p.55).

[12] Cf. STOTT, 1991, p. 54–56

[13] Ibidem, p. 56.

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