Religiões & direitos humanos — RESENHA

Regina Fernandes Sanches
Editora Saber Criativo
4 min readMar 22, 2021

RIBEIRO, Cláudio de Oliveira. Religiões & direitos humanos: múltiplos olhares. Saber Criativo: Campinas, 2021.

Luis Fernando de Carvalho Sousa

Intrigante, desafiador e plural. Assim podemos definir o livro “Religiões e direitos humanos” organizado por Cláudio Ribeiro e escrito por pesquisadores e pesquisadoras de relevância nacional, no tocante ao tema das religiões e direitos humanos.

É um livro repleto de provocações e desafios que dialoga com as diversas religiões existentes no cenário brasileiro. Cláudio Ribeiro, além de organizar, inicia o livro com um texto de sua autoria articulando religiões, direitos humanos e o princípio pluralista. O autor tem se notabilizado por divulgar o princípio pluralista como elemento de mediação hermenêutica, que possibilita a interpretação das diversas realidades sociais pelo viés do encontro ou, em outras palavras, os entrelugares. Ribeiro faz correlações com diversos esforços sociais e políticos por meio dessa interpretação.

Outro expoente do pensamento pluralista que contribui para pensar a reconstrução dos direitos humanos e as religiões é Gilbraz Aragão. Em um texto em parceria com Mailson Souza, transitam por vários eventos históricos e sinalizam como a religião pode contribuir na temática dos direitos humanos.

Em tempos de acirramento da radicalidade política no Brasil e do apelo (por parte dos governos) de mecanismos coercitivos e violentos para “manter a ordem” e “pacificar” a sociedade Claudete Ulrich, Marga Ströher e Nívia de la Paz trazem a reflexão sobre liberdade religiosa, cristofascismo a necropolítica no Brasil. As autoras problematizam eventos recentes ligados a política e aos comportamentos sociais estimulados por falas autoritárias como as do presidente em exercício (2018–2022) Jair Bolsonaro, contrapondo-as por meio da premissa do estado laico, descrita na constituição, salientando também o papel dos direitos humanos nessa discussão. Além de ser um texto didático é profético, pois denuncia a política da morte.

O Brasil é um país com parcela expressiva da população negra. Uma das religiões que expressam a defesa das tradições negras, constituindo-se como “religião de resistência”, é o candomblé. Érica Carneiro problematiza a questão do racismo e mostra como o candomblé tem se posicionado para superar essa questão. Em suas palavras:

O candomblé, religião brasileira de matriz africana, tem se preocupado em fazer força à luta contra o racismo, unindo-se a outros movimentos. Os projetos analisados são exemplos de como a religião pode e deve criar esforços para assegurar os direitos humanos ao mesmo tempo respeitando as especificidades identitárias e culturais dos grupos afins (CARNEIRO, 2021, p.139).

Ana Gualberto e Camila Chagas contribuem também com uma reflexão no sentido de defesa das religiões de matriz africana por meio da ONG Koinonia. Somam-se à Érica Carneiro e fazem da configuração plural do livro um convite a pensar a importância da ecumenicidade na teologia, sobretudo, quando se trata de assuntos inerentes à vida, como é o caso dos direitos humanos.

A tradição espírita é representada por um texto de Grazyelle Fonseca, que pondera como entender a relação da teologia espírita da evolução espiritual e do plano material. Fonseca sinaliza que há determinada convergência nos dois planos fazendo com que alguns pressupostos coadunem e sejam tidos numa espécie de práxis. Com isso, nos traz um texto inspirador e pedagógico sobre a questão.

Magali Cunha apresenta um texto sobre a temática do racismo. Através de uma análise social e teológica a autora traz um pouco de sua experiência junto ao Conselho Mundial de Igrejas, para pensar respostas a um tema que é tão presente em diversas localidades. Um texto objetivo e desafiador, sobretudo, nos tempos de recrudescimento teológico no Brasil.

Cris Serra e Vanessa Leite provocam uma reflexão em torno da diversidade sexual e de gênero no contexto das disputas narrativas e de valores religiosos. O texto é construído visando salientar os direitos sexuais como inerentes a pauta dos direitos humanos. Por vezes o conservadorismo religioso tende a fomentar preconceitos e negar e efetividade desses direitos. As autoras, além de problematizar pontos importantes e necessários, indicam alternativas para a efetivação desses direitos como direitos humanos.

Alonso Gonçalves finaliza o livro trazendo à baila o tema do diálogo inter-religioso e os direitos humanos, para articular seus argumentos se utiliza dos conceitos de Paulo Freire e Kwok Piu-Lan e “brinda” o leitor (a leitora) com um texto profundo, dinâmico e com uma densidade teológica sem par.

O livro é uma obra imprescindível para se pensar a teologia, num sentido amplo e dinâmico, e a sociedade por meio dos direitos humanos.

Não se pode deixar de ressaltar também o papel da Editora Saber Criativo, que através de um compromisso ético e teológico, viabilizou a publicação dessa obra. Sem dúvidas quem ganha com a produção e publicação dessa obra são os leitores e leitoras.

CARNEIRO, Érica Jorge. Para além do terreiro: o candomblé combatendo o racismo. In:RIBEIRO, Cláudio de Oliveira. Religiões & direitos humanos: múltiplos olhares. Saber Criativo: Campinas, 2021

O livro pode ser encontrado em www.editorasabercriativo.com.br

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