Trans-humanismo e teologia

Regina Fernandes Sanches
Editora Saber Criativo
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2 min readMay 28, 2021

Alexandre de Jesus

A concepção de que o próximo passo para a evolução do homem será realizado pelo próprio homem, por meio do controle possibilitado pelo conhecimento científico e pelo desenvolvimento tecnológico, se harmoniza com o pensamento trans ou pós-humanista. Isto se fundamenta na noção de que agora a humanidade possui a capacidade de construir tecnicamente o caminho rumo ao seu futuro como espécie, projetar-se e executar o projeto através da eliminação do que considera indesejável ou sinal de fraqueza, limitação, não precisando mais entregar-se ao acaso da seleção natural. Para isto ser possível, a tecnologia desempenha um papel extremamente importante, como o poder de realizar transformações, operar “milagres”, revolucionar o mundo, alterar a ordem das coisas. A tecnologia, deste modo, permite uma intervenção na ordem natural, possibilita a crença que impulsiona a ação rumo ao anseio de moldar artificialmente o mundo.

A noção de criaturas artificiais construídas pelo homem à sua imagem tem sido abordada por um conjunto de narrativas, que recorrem a diversas linguagens, tanto à linguagem da literatura, da religião ou da arte, quanto à linguagem das ciências e das técnicas. Mudam-se os tempos e os costumes vigentes, porém é certo encontrar uma preocupação comum, capturar o humano, imitando-o; a preocupação de representar o humano através de algum dispositivo artificial, moldado, segundo a época, pelo mito, pela técnica, pela arte, pela literatura, pela ciência. […]

Com o nascimento formal da Inteligência Artificial como uma nova disciplina distinta na área de informática, fortalece-se o entendimento de que num futuro breve as máquinas poderiam pensar, aprender e criar, e mais ainda, que o campo das suas possibilidades seria conduzido a um alargamento de tal magnitude que as máquinas estariam aptas a tratar uma gama de problemas até então somente apreendidos pelo espírito humano.

Do anseio por moldar seres à sua própria imagem, em discursos como o dos pós-humanistas, o homem parece encantar-se tanto pela ideia que faz dos seres que almeja poder trazer a existência e planeja se fundir às suas criaturas, crendo poder criar algo não somente semelhante a si mesmo, mas superior. Anseia poder desvendar o mecanismo da inteligência e os meandros da vida, o homem projeta transcender-se, superar o que compreende ser limitador, fraqueza, maldição, a sua carne representativa da sua conditio humana.

Desde os óculos de grau até as modernas próteses biônicas, passando por dispositivos como o marca-passo, os implantes dentários e os órgãos desenvolvidos em laboratório, o homem experimenta essa ligação com o artificial, com o não-biológico que se incorpora ao seu organismo, ampliando capacidades ou reestabelecendo aptidões perdidas. Esses avanços levam a pensar que se vivencia hoje uma transição rumo ao pós-humano, uma etapa posterior à existência humana tal como pensada até então, graças aos progressos tecnológicos.

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