Clubhouse: 5 lições de Design para projetos de inovação

Lições interessantes sobre a importância do pensamento de Design quando se desenvolve um projeto.

Leila Ribeiro
salaoficial
6 min readFeb 15, 2021

--

Pandemia na vibe da mutação, vacinação contra Covid-19 em apenas 3% da população brasileira, eleições na Câmara dos Deputados, Banco Central na mira da privatização, biela batendo, engrenagem empenando… e todo mundo (= bolha do Twitter) achando que o BBB ia abafar todas essas discussões, mas o que ninguém imaginava era que o assunto polêmico mesmo seria uma rede social: Clubhouse!

Clubhouse chegou causando: funciona apenas por áudio, é síncrona, não tem interações com emojis, textos, stickers, memes, imagem, NADA, só a voz! Resgatou o feeling dos anos 2000 no início do Orkut — só com convite — e o início da década com o Instagram — só para o sistema Apple (iOS). Pronto! Joga na internet e deixa a galera trabalhar os extremos: lovers e haters da rede! Sucesso garantido: check.

Dito isso, quero te convidar a ter um olhar menos extremista sobre a rede para observar lições interessantes sobre a importância do pensamento de Design quando se desenvolve um projeto, seja ele qual for, mas aqui vamos usar o Clubhouse como exemplo. Vale lembrar que o pensamento de Design não é apenas para designers, mas sim uma forma de se pensar e fazer inovação, inclusive é apontado como uma competência de Futuro do Trabalho pelo Institute For The Future. Então vamos lá para cinco pontos que observei.

1. OUVIR SEU PÚBLICO

Clubhouse foi bem inteligente ao perceber que o público que é heavy-user de redes sociais está cansado da falta de conexão com as pessoas, de estar em um espaço de apenas aparências e muita exposição sem conteúdo. A rede social nova observou isso e juntou com a tendência que estava sendo apontada: o áudio. Pronto, agora era só trabalhar na dinâmica da rede: sem imagens, sem edições, sem “biscoito” (likes/números) e aproximando as pessoas por meio da voz.

2. OBSERVAR TENDÊNCIAS

Em 2019, no SXSW, foi anunciado a Nova Era de Ouro do Áudio, onde apontava que podcasts iriam mudar seus formatos para além de cultura pop e entretenimento, direcionando-os para o storytelling e conhecimento (foi o que aconteceu em 2020) e que o modelo “rádio” iria voltar repaginado. Clubhouse trouxe tudo isso porque é uma rede baseada em conteúdo real time e por ser uma rede de áudio síncrono, é possível zapear entre salas como em estações de rádio até encontrar um assunto que te interessa.

3. DESIGN VISUAL COMO COMUNICAÇÃO

A identidade visual da rede já mostra a que veio: não tem logo e sim uma foto de algum membro da rede com uma história interessante, como o atual ícone do app que é o músico Axel Mansoor, indicado ao Emmy e faz shows toda noite dentro da plataforma. Isso já quebra de cara com o conceito que há nas outras redes: a identidade visual com uma logo, que vira o símbolo da rede. Aqui o símbolo, até o momento, são as pessoas e isso é uma puta comunicação sobre do que se trata o Clubhouse. Além disso, dentro da rede tudo é bem simples e direto. Não há distrações, apenas cores neutras e o uso do verde quando aponta para alguma ação ativa como abrir uma sala ou usuários online no chat. O foco, por enquanto, é nas salas e nada mais. A conversa é o que importa.

4. EQUIPE MULTIDISCIPLINAR E DIVERSA

A rede ganhou muita crítica no Brasil por não ser acessível — apenas aparelhos iOS, minoria no país — e por não ter acessibilidade — não há recursos para pessoas não-ouvintes. Uso isso para ressaltar o motivo dos projetos de design exigirem equipes multidisciplinares (composta por profissionais de várias áreas) e diversa (com participantes com diversidade socioeconômica, de raça, de gênero, de regiões e com PCDs -pessoa com deficiência). Ao projetar algo — seja um produto ou serviço — é preciso ter em mente o que está sendo criado, pois será inserido no mundo de conexões complexas, ou seja, o resultado do projeto terá impacto nesse ecossistema e ouvir os diversos lados ajuda a criar soluções que atendam as diferentes complexidades do problema. Isso não se resume à equipe de desenvolvedores, mas também à equipe de decisão. Achei interessante ler no blog da Clubhouse que eles têm essa visão e, inclusive, os co-fundadores têm buscado investidores com essa característica de diversidade e inclusão também. Falta ainda muito, mas há sinais de mudanças, pois na última atualização do app houve a habilitação do serviço nativo do Iphone de transcrição de áudio e está contratando desenvolvedores para Android.

5. CONTEÚDO CO-CRIADO

Na minha opinião, a parte mais legal do Clubhouse: salas por tópicos com a liberdade de criar o título maluco que quiser! Lembrou muito as famosas comunidades do Orkut, onde você encontrava de tudo: da zueira à assuntos sérios e engajados. É fato que tem muita coisa chata como os “gurus do marketing digital e suas fórmulas milagrosas”, mas tem também clube do livro, grupos de meditação, Disk Amizade (Gregório Duvivier arrasou demais nessa sala hahah), médicos que debatem sobre doenças degenerativas, educadores discutindo sobre volta às aulas em meio a covid, assuntos da atualidade política e salas para todos ficarem em silêncio (e as pessoas ficam lá em silêncio mesmo hahaha). O céu é o limite (ou não! rs)

Não sou nem da galera lover, nem da galera hater desta rede, na verdade, estou muito mais interessada no movimento de mudança da tecnologia de comunicação, que pode marcar mais um capítulo de transformação nas nossas relações pessoais e profissionais, como foi o Snapchat e o TikTok com os vídeos. Isso não é apenas “mais uma rede social que vai morrer”, pois as redes consolidadas já estão incorporando ações como essas, como o Twitter que tem o Espaços, em teste desde dezembro e lançando no Brasil nesta quinta (11/2), o Facebook que já anunciou o desenvolvimento de uma ferramenta similar de áudio e o Spotify, que liberou o acesso de ouvir no modo grupo para geral (em teste para alguns usuários desde junho passado).

O que me preocupa é que mesmo uma nova rede, com tantas mudanças, o modus operandi do algoritmo ainda continua baseado no FOMO (fear of missing out), no sistema de recompensa por movimentar a rede (mais seguidores, mais engajamento, etc), além de ser bastante invasivo na privacidade dos dados pessoais (você precisa autorizar os seus contatos de telefone).

Apesar de ser uma rede que coloca as pessoas em tempo real juntas, ignora questões sérias que envolvem o emocional e, consequentemente, o comportamental. Ainda há muito por avançar no desenvolvimento de redes sociais digitais como uma ferramenta de conexão entre as pessoas, mas não há como negar que há alguma mudança tecnológica em curso, seja boa ou ruim, com o surgimento da Clubhouse.

Conheça mais a Sala aqui

Conecte-se em nossas redes @salaoficial

--

--

Leila Ribeiro
salaoficial

Design, inovação e criatividade tudo na perspectiva da aprendizagem que pode acontecer em qualquer lugar. PhD, autora e sócia da sala.org.br