//Ânimo Novo — 4ª Semana

Saleiro
Saleiro
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2 min readMar 27, 2017

O cristão de amanhã será um místico, alguém que experimentou alguma coisa, ou não será nada.” — Karl Rahner

Muitos irmãos temem que o processo de secularização acabe minando as bases da fé, e que, por conseguinte, a vida com Deus vá se inibindo em uma decantação progressiva até acabar de uma vez.

Minha impressão pessoal é justamente contrária. A secularização poderia ser equiparada à noite escura dos sentidos. É a purificação mais radical da imagem de Deus. Justamente por isso, o crente da era secularizada poderá viver, finalmente, a fé pura e despida, sem falsos apoios.

A imagem de Deus esteve muitas vezes revestida de uma multiplicidade de roupagens: nossos medos e inseguranças, nossos interesses e sistemas, nossas ambições, incapacidades, ignorâncias e limitações. Para muitos, Deus era a solução mágica para todas as coisas impossíveis, a explicação para tudo que ignorávamos, o refúgio dos derrotados e incapazes.

Nessas muletas apoiavam-se a fé e a “religiosidade” de muitos cristãos.

O fim do mito está demolindo todo esse conjunto de imagens, retirando essas roupagens, graças à secularização, começa a aparecer o verdadeiro Rosto do Deus da Bíblia: um Deus que interpela, incomoda e desafia. Não responde, pergunta. Não soluciona, põe em conflito. Não facilita, dificulta. Não explica, complica. Não gera meninos, faz adultos.

O Deus da Bíblia é um Deus Libertador, Aquele que nos arranca de nossas inseguranças, ignorâncias e injustiças, não fugindo delas mas enfrentando-as e superando-as.

Deus não é o “seio materno” que liberta (aliena) os homens e mulheres dos riscos e dificuldades da vida. Ao contrário, assim que são criados no paraíso, Deus lhes corta rapidamente o cordão umbilical, deixa-os sozinhos na luta aberta da liberdade e da independência, e lhes diz: Agora sejam adultos, levem adiante o universo e dominem a terra (Gn 1.26). Portanto, o verdadeiro Deus não é alienador mas libertador e torna homens, mulheres e os povos adultos, maduros e livres.

Por isso, voltamos a insistir em que o processo de secularização é uma verdadeira noite escura dos sentidos. Mais à frente, a fé e a vida com Deus serão uma aventura cheia de riscos.

A aventura da fé consistirá em queimar navios, deixar de lado todas as regras do senso comum e todos os cálculos de probabilidade como fez Abraão, esquecer raciocínios, explicações e demonstrações, desprender-se de todas as trilhas razoáveis e, de pés e mãos amarrados, dar o grande salto no vácuo da noite escura, abandonando-se no absolutamente OUTRO. SÓ DEUS, na fé pura e escura.

— Inácio Larrañaga*

*Trecho de introdução do livro “Mostra-me o Teu Rosto — Para Intimidade com Deus”. Copyright © 1975 por CEFEPAL-Chile, publicado pela Paulinas.

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