A sorte que eu inventei
Não sou supersticiosa. Minto, muito aleatoriamente sou.
Não ligo se quebrar todos os espelhos da minha casa, passar por um desfile de gatos pretos. Não ligo se levanto todos os dias com o pé esquerdo, inclusive tenho um espírito de padre Quevedo interior que faço de propósito, só pra provar pro universo que não é verdade.
Mas confesso aqui pra vocês, mandingas de fim de ano me seduzem. Sim, romãs, 7 ondinhas, calcinha colorida, tudo isso. Inclusive inventei algumas pra agregar uma personalidade na minha própria sorte. Por exemplo, tudo que eu carrego, ou não carrego comigo no exato momento da virada representa algo. E as teorias são inúmeras. Levo carteira comigo, este ano será de conquistas financeiras, se não levo, será um ano de desapego material e crescimento espiritual. Se estou bêbada, um ano de festas, sentadinha com alguém, um ano de romance. Se passo com pessoas queridas pra mim, um ano de parcerias, se com deconhecidos, um ano de novas descobertas. E assim por diante.
Não sei bem porque, mas cada ano que passa, isso se concretiza pra mim. E tá bom assim. Antes eu crie minhas próprias crenças do que sair dia e noite no mercado público a procura de frutas exóticas e comidas elaboradas que algum site me disse que traziam algo específico.
Esse ano me tirou as palavras. Me tirou o fôlego, de tanto chorar, de tanto rir. Me tirou tudo. Me fez leve.
Não sei se isso é bom, mas decido que é. Na verdade essa é uma mania chatérrima que a gente tem, de querer achar alguma coisa dos ocorridos da vida. Os acontecimentos são só acontecimentos, bom ou ruim é coisa da nossa cabeça.
Esse ano eu perdi um grande amor. Foi péssimo, mesmo. Dificultoso, desafiador. Mas o tempo me ensinou a enxergar as coisas de uma maneira diferente. Eu aprendi comigo mesma que sou capaz do que achei que não era. E isso foi muito mais maravilhoso do que não ter perdido esse amor. Até porque, disse bem, o amor eu perdi, a amada continua na minha vida, por minha decisão. Mais difícil? Sim, e daí? Achei vantagem, e vi crescimento muito maior do que só fingir que nada nunca existiu. Existiu e passou, o que foi bom ficou, o que foi ruim foi conversado e perdoado. Engraçado né, as pessoas enchem a boca pra dizer que isso não é saudável mas a mim, carregar um defunto da pessoa em mágoa nas costas, é que não é saudável. Porém, cada um tem seu caminnho, lógico.
Esse ano eu perdi grandes amigos. Minto, perdi pessoas que me pareciam amigos. Já muito escrevi sobre isso e pouco publiquei. Mas é algo marcante de 2013 que não deixou barato em mim. Me custou adaptação, me custou positividade sobre tudo. Me custou algumas lágrimas. Mas ao mesmo tempo me fez mais forte, me fez independente. Me fez gostar das pessoas que me aproximo sem querer ter posse sobre elas, só aproveitando o que elas tem a me oferecer no momento. Não quero que fiquem na minha vida pra sempre, quero que fiquem enquanto se sentirem bem. Quem quiser, esteja à vontade, mas a porta está aberta o tempo todo. Meu instinto é meu melhor amigo.
Esse ano perdi dinheiro. Sim, muito. Vamos passar a parte que eu tento dizer que não dou valor pra isso, etc, e ir direto ao ponto. Que ano! Ano esse que tive que pagar diária dupla no Rio por me atrasar meia hora do check-out no último dia. Ano que fui pra SC fazer uma surpresa romântica e dois dias antes brigo e termino, perco as diárias e a passagem, viajo sozinha pra não jogar dinheiro fora. Ano que pago adiantado uma tatuagem imensa e esqueço de remarcar a hora, perco o dinheiro todo. Sim, não vou superar isso nunca. Ano que fui demitida uma vez e me demiti uma. Motivos variados. Ano que, sim, fui às manifestações na rua, por motivos imbecis, e tive que voltar da zona leste até minha casa de taxi, e quem sabe onde moro já imagina quanto deu a brincadeira. Convenhamos que essa parte não parece haver muitos lados bons, mas há. Aprendi a ver a hora antes de viajar, a não marcar surpresas num relacionamento bipolar, a anotar as coisas e principalmente, a largar a erva. Quanto ao dinheiro perdido, virá mais. O universo me proverá.
Perdi quase tudo, sabe. Ano que vivi talvez os momentos mais felizes e certamente os momentos mais tristes da minha vida.
Há quem diga que o que sobrou foi uma pessoa sozinha, desperdiçada em pessoas e coisas. Mas há quem diga que o que sobrou foi uma versão de pessoa polida, lapidada um pouco mais pela vida.
Esses dias eu tava pensando na primeira desilusão amorosa que eu tive. Era tudo tão novo, eu fazia tanta merda. Tudo que eu sentia, queria gastar até não ter mais. Tanto amor quanto dor. Lembro de ficar escutando The Only Ecxeption repetidas vezes só pra ver o olho encher de lágrima toda vez. Só pela novidade do sentimento. Eu abria caminhos que não sabia onde daria. Aí pensei, nossa passei por isso já duas vezes, e parece tão mais atalhado o caminho, depois desse tempo todo. É muito engraçado ver isso. E assustador.
Até minha cadela eu perdi esse ano. Paçoca, onde você estiver, estou pensando em você. (choro e ranger de dentes)
A gente sempre tem a impressão que tá no fim do caminho quando tá nem na metade. Mas independente de onde a gente tá, é o mais longe que já fomos, e isso diz alguma coisa. Diz: continue.
Esse ano eu me dei conta de que eu sou uma pessoa sal. Não sei se queria ser, mas fico feliz em me dar conta.
Há quem tenha problema de pressão com muito sal, há quem precise de um pouco debaixo da língua todo dia pra não desmaiar. Mas o principal é que o sal é o que dá gosto à comida. Mas ninguém elogia o sal, todos elogiam a comida.
Pode ser que eu esteja enganada, mas ao longo do caminho a gente nota um comportamento padrão. O que eu sem querer acrescento, de ruim ou de bom, às pessoas, raramente levo crédito, mas todos notam. E assim eu vou pipocando na vida das pessoas, deixando um pouco de mim em cada uma delas, esperando que seja um pouco da parte boa ao invés do pouco da minha imensa bagunça.
Esse ano eu quero que fique na história, como uma grande mandinga pro ano que vem. Que tudo isso que aconteceu seja uma cachaça, uma pipoca, um bode sem as patas traseiras, nessa mandinga que eu mesmo to criando agora pra 2014.
A desilusão amorosa significa que será um ano de liberdade. De independência, de novos amores, novos sentimentos. Os amigos perdidos significam novas pessoas na minha vida, novos lugares, novas piadas, quem sabe até um novo cachorro. O dinheiro que perdi, bom, significa dinheiro que vou receber. Novo, em estampas diferentes, de preferência.
Até minha decepção com os DJs que vi na Dream Valley, será uma grande mandinga pra atrair boa música eletrônica pra minha vida, e muitas, mas muitas raves boas.
Já não sei se quero um ano disso ou daquilo, visto que os melhores anos são os que não esperava nada do que aconteceu. Sei é que a minha sorte sou eu quem invento, sim, pra me distrair.
A bem da verdade, sou uma pessoa supersticiosa. Mas minto, muito aleatoriamente, que não sou.