Peraí, você joga de uniforme ou terno?

Será mesmo que “quem não é visto, não é lembrado”?

Esdras Pereira
segue o jogo

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Foto: (Ivan Storti / Santos FC)

Faça um teste com o seu amigo santista! Pergunte a ele quais são os três jogadores que ele mais gosta dos elencos de 2002 e 2004 (anos de títulos nacionais). A resposta foi Robinho, Diego e Elano? Talvez Robinho, Diego e Léo? Diego, como alguns sabem, não participou da volta olímpica do bicampeonato brasileiro, pois já havia sido negociado com o Porto, de Portugal. Os jogadores listados acima, realmente, deram o que falar à época. Muitos se esquecem, porém, de quem fez o serviço pesado, de quem segurou o piano. E esse alguém tem nome: Renato.

Revelado pelo Guarani, o volante chegou à Vila Belmiro em 2000. Acumula 349 partidas pelo alvinegro praiano e, em breve, será o 23º atleta com mais jogos pelo clube, ultrapassando Mauro Ramos, que tem 352. Após levantar os dois canecos do Campeonato Brasileiro, seguiu para o Sevilla, da Espanha, onde permaneceu por sete anos, até retornar ao futebol nacional, atuando pelo Botafogo. Voltou a vestir a camisa do Santos em 2014 e, desde então, tem sido um dos pilares da equipe.

Renato é discreto. Mas não pode ser esquecido! (Foto: Ivan Storti / Santos FC)

É claro que Robinho é lembrado pela habilidade que foi capaz de incendiar, em vários jogos, o alçapão santista; Diego pela visão de jogo inconfundível; e Léo pela identificação com a torcida.

Mas e o Renato, hein?! Para determinados torcedores, provavelmente valha aquela máxima de “quem não é visto, não é lembrado”. O volante, é evidente, não vai sair distribuindo canetas e chapéus por aí com tanta facilidade. Dificilmente vai proporcionar uma arquibancada uníssona com um drible ou algo do tipo. Mas, olha, às vezes, cabeça erguida e consciência tática são características até mais bonitas do que qualquer firula, concorda?

Para se ter uma ideia da importância do jogador ao clube que considera do coração, vamos a alguns números dele no Campeonato Brasileiro do ano passado — disponibilizados pelo FootStats -, em que o Santos ficou com o vice-campeonato:

Total de passes certos: 1839

No 1º turno: 973

No 2º turno: 866

· Contra o América MG, pela 38ª rodada, Renato acertou 96, seu maior índice na competição

Total de passes errados: 124

No 1º turno: 61

No 2º turno: 63

· O jogo em que errou mais passes (9) foi contra o Figueirense, pela 22ª rodada

Total desarmes: 78

No 1º turno: 39

No 2º turno: 39

Essas estatísticas evidenciam a regularidade do jogador e o seu grau de participação nos confrontos, mesmo que possa, aparentemente, ser discreto dentro de campo. E falando em participação, o volante, hoje com 36 anos, é exemplo a ser seguido: foi o único atleta de linha a estar presente em todas as 38 partidas do último Brasileirão (confesso que não sei se algum goleiro chegou à mesma marca). Sinal óbvio de que não recebeu suspensão ou se lesionou. Um motivo e tanto de orgulho num momento em que se reclama tanto por jogar às quartas e domingos no país.

Vigor físico do jogador impressiona até mesmo fisiologista do clube (Foto: Ivan Storti / Santos FC)

Sua presença, porém, não é à toa: Renato não come hambúrguer desde 2002 e não toma refrigerantes há quatro anos. Não sente falta, garante. “Se você olhar para o Renatinho, parece que o tempo não passou pra ele”, destacou a nutricionista do clube, Sandra Merouço, em entrevista ao Esporte Espetacular no ano passado. “Eu acho que pra ele tem que ser um motivo de orgulho e um reconhecimento por todo esse trabalho que fez durante a carreira”, completou o fisiologista Luís Fernando de Barros.

É claro que o experiente jogador não é de aço. Na temporada atual, sofreu com um estiramento na panturrilha. Tanto é que só disputou três partidas até agora: a estreia do Paulistão contra o Linense (vitória por 6 a 2, na Vila Belmiro), e as duas partidas da Libertadores (1 a 1 diante do Sporting Cristal, no Peru; 2 a 0 sobre o The Strongest, em casa, jogo em que marcou de cabeça após cruzamento de Lucas Lima).

Em entrevista recente ao programa Aqui com Benja, da Fox Sports, Renato afirmou, emocionado, que o “Santos é praticamente tudo na minha vida”. Uma das provas desse amor, no entanto, foi praticada no passado, quando, a caminho do Sevilla, não quis receber cerca de R$ 1 milhão referente à rescisão contratual com o clube, no que a diretoria da época considerou uma demonstração de gratidão das mais raras.

“Além de abrir mão de todos os seus direitos, solicitou que eu fosse ao vestiário de surpresa e, na frente de todos os atletas e comissão técnica, agradeceu à presidência, destacou a importância da contratação ainda jovem junto ao Guarani, enalteceu o clube e me deu uma linda placa”, confidenciou o ex-presidente do Santos Marcelo Teixeira, em entrevista ao ESPN.com.br.

Se você fizer a pergunta do começo deste texto ao mesmo santista, substituindo Robinho por Ricardo Oliveira, Diego por Lucas Lima, Elano por Vitor Bueno, Léo por Zeca, talvez, novamente, Renato fique de fora da lista. Eu aconselharia, porém, o amigo em questão, se possível, a reparar mais no grande jogador que está ali próximo do círculo central. Quem o nota, diz que, por cima do uniforme, ele poderia muito bem vestir um terno, por atuar com tanta sobriedade e elegância.

Renato, na cabeçada responsável pelo segundo gol diante do The Strongest, na Vila Belmiro (Foto: Ivan Storti / FC)

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