A história e a lição de uma estreia improvável nas Grandes Ligas

por Leonardo Parrela

Segunda Base
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3 min readMay 27, 2017

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Após batalhar muito, Ngoepe se tornou o primeiro africano a atuar nas Grandes Ligas. (Foto: Getty Images)

Gift Ngoepe estreou na MLB no final de Abril. Dia 26 de abril, o jogador de campo interno vestiu pela primeira vez o uniforme do Pittsburgh Pirates e logo em sua estreia conseguiu a primeira rebatida. Ali se encerrava um duro ciclo de oito anos nas Ligas Menores e foi o começo da caminhada do primeiro africano negro a representar uma equipe da MLB. Aquele foi o clímax da história do sul-africano de 27 anos, mas falemos sobre a caminhada.

Natural de Randburg, na África do Sul ele é o primeiro negro africano a jogar nas Grandes Ligas. Assinou contrato de Ligas Menores em 2008, numa atividade que a MLB realizou na Itália e então era o sexto africano que conseguia um contrato na MiLB.

A mãe de Ngoepe, Maureen Ngoepe trabalhou num time de beisebol em Randburg e sempre era acompanhada do filho. O moleque até tentou jogar críquete e futebol, esportes mais populares na África do Sul, mas não conseguiu deixar de lado a vontade de jogar beisebol. Sabia do tamanho do desafio que teria a frente e seguiu. Quando pequeno morava dentro das dependências do humilde Randburg Mets e, quando começou sua caminhada pelas ligas menores, em 2009, sua mãe o acompanhou.

Após quatro anos sem conseguir subir do nível A (oscilava entre Rookie e A+), ele finalmente tinha conseguido uma promoção para o nível Double A. Foi quando, após mais um jogo dentre os 761 realizados antes do chamado para MLB, ele recebeu a notícia que a mãe tinha morrido. Em entrevista, Ngoepe disse que demorou mais de duas semanas para voltar aos EUA e dar continuidade a carreira. Obviamente o pensamento de desistir e ficar em sua cidade natal para ajudar os irmãos (ele é o segundo, dentre três filhos) passou várias vezes a cabeça.

Porém, seguindo o que acredita que seria a vontade da própria mãe, que o incentivou e o acompanhou desde os 10 anos de idade, decidiu seguir em frente com o beisebol. Agora, o jogador estava sozinho nos Estados Unidos e com muito a provar.

Mais dois anos oscilando e em 2015 ele chegou ao time AAA da franquia, o Indianapolis Indians. A paixão e sua habilidade haviam o carregado até ali e ele flertava com bons desempenhos, mas ainda oscilava. Sempre forte e ágil defensivamente, Ngoepe precisava desenvolver mais o lado ofensivo. E, no Spring Training deste ano, ele passou a confiança que a franquia desejava. Em 21 jogos, 42,9%/50,0%/50,0% e finalmente um jogador com paciência no bastão, com bom percentual de ocupação em bases e inteligência para atacar as bolas mais atrativas, apareceu.

Mais que o chamado, a participação de Ngoepe é emblemática pra própria MLB. Um esporte com boa participação negra entre os americanos e latinos ainda não tinha contado com a presença de um africano negro. Isso diz bastante, sobre a própria liga. Os esforços para globalização da marca e do jogo ainda são pequenos comparados a outras organizações como, por exemplo, a NBA. No início da última temporada, a liga de basquete mais famosa do mundo contava com jogadores de 41 países diferentes.

Atualmente a MLB conta com jogadores de 22 países diferentes, sendo a maioria deles da América Central. Rob Manfred já falou algumas vezes sobre a tentativa da liga de expandir a marca para lugares como África e Europa, onde a liga pode descobrir um público forte e desenvolver mais uma enormidade de jogadores. Como o próprio Ngoepe disse: “Minha presença mostra que não necessariamente o jogador precisa de ser de um grande país como Estados Unidos para alcançar o sonho de jogar na MLB”.

Num jogo onde a participação negra deixou de ser tabu há 70 anos com Jackie Robinson, a Liga ainda se mostra ineficiente em popularizar o jogo para locais onde ele não é conhecido. A NFL já expande horizontes para Inglaterra onde existe o Rúgbi. A MLB pouco faz para se aproximar de países onde o críquete é um esporte influente.

As lições deixadas por Ngoepe são enormes, assim como todos os jogadores que chegam das Ligas Menores sem badalação. Perseverança, concentração, trabalho e determinação. Todas essas características foram recompensadas. Com o perdão do trocadilho, todo jogo é um pequeno presente para Ngoepe.

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