A perfeição feita pelo Rei
Conseguir um jogo perfeito é algo bem raro na rica história do beisebol. Apenas 23 vezes ocorreu do arremessador não ceder uma base sequer nos 27 duelos. Para alcançar o feito não é necessário apenas ser um extraordinário arremessador. Clayton Kershaw e Justin Verlander são dois ótimos exemplos disso. Tudo tem de ser perfeito. Sintonia entre catcher e pitcher, total atenção dos defensores com cada jogada, conseguir não prolongar os duelos e manter a fadiga num nível que consiga se controlar a localização dos arremessos. É o feito mais raro do jogo e sua recompensa é ter imortalizado seu nome na história desse esporte.
Caminho até o grande dia
Felix Abraham Hernández García, venezuelano, nascido em 8 de abril de 1986. Desde muito cedo (foi descoberto aos 14 anos e já arremessava uma fastball de 90mph) já se esperava muito de Felix. Assinou com a franquia de Seattle em 2002. Fez o caminho completo pelas ligas menores, passando por todos os níveis em três anos, sempre com desempenhos impressionantes, principalmente no quesito strikeouts. Em 2005, entrou na Triple-A como o arremessador prospecto mais bem ranqueado pela revista especializada Baseball America. Mostrava potencial de ace para as grandes ligas. Teve o melhor ERA da liga naquele ano (2.25). Após uma campanha de 9–4 em 14 jogos como titular, foi retirado em função de dores no ombro e depois de recuperar a forma foi promovido.
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Felix novato e um pouco mais gordinho do que hoje (Foto: AP Photo/Paul Sancya)[/caption]
Estreou nas grandes ligas em meados de 2005 e terminou com 12 jogos como titular, 4–4 e ERA de 2.67. Correspondeu as expectativas que carregava. Felix tinha apenas 19 anos. Entre 2006 e 2008 teve altos e baixos. Conseguia shutouts, imaculate innings, poucos jogos completos e muitos strikeouts. Porém, todo ano alguma contusão tirava dele o ritmo que era necessário alcançar para ter um desempenho em alto nível. Seu ERA no ano de 2007 foi de 3.92. No entanto, ninguém duvidava do seu talento, pois ele saltava aos olhos de quem o via.
Em 2009, aos 23 anos, teria de se provar como um grande jogador. Era o momento decisivo da sua carreira. No começo da temporada, assinou contrato de um ano e 3.8 milhões de dólares. Mereceu cada centavo, mas não logo de cara. Após um começo mediano e irregular, o manager de Seattle à época, Don Wakamastu, disse que já era hora de Felix se comportar como grande jogador que podia ser. Depois disso, Felix se apresentou como um ace. Perdeu apenas mais 2 partidas naquele ano. Fez a sua melhor temporada completa nas grandes ligas até então: 19–5, ERA de 2.49, 238.2 IP e 217K. Terminou em segundo na votação para Cy Young e foi selecionado pela primeira vez para o All-Star Game.
Aquela altura, Felix tinha um ótimo controle de arremesso, chegava mais longe nas entradas e não perdia a sua capacidade de retirar rebatedores por strikeout.
Janeiro de 2010: Felix assinou um contrato de 5 anos na casa dos 78 milhões de dólares. Mais uma temporada sólida para o ace de Seattle. 13–12, ERA de 2.27 (seu menor até os dias de hoje), começou 34 jogos, 6 jogos completos e 1 shootout (2 rebatidas cedidas). 249.2 IP, 8.4 K/9 e 2.5 BB/9. Liderou a liga em jogos completos, ERA, entradas arremessadas, quality starts, menor número de rebatidas a cada 9 entradas. Esses números lhe credenciaram a ganhar o prêmio de Cy Young daquele ano. Felix alcançava os feitos que se mostravam dignos do seu potencial. Já tinha conseguido seu milésimo strikeout da carreira. Levou um no-hitter até a 8ª entrada quando Nelson Cruz isolou a basebola.
Em 2011, mais um ano longe das lesões. Não foi brilhante, mas conseguiu chegar à terceira temporada seguida com mais de 200 strikeouts. Foi selecionado para mais um All-Star Game. Felix continuou estendendo suas atuações no montinho. Terminou a temporada com 14–14 em 33 jogos como titular. 5 jogos completos, 233.2 IP, 8.6 K/9 e 2.6 BB/9. ERA alto de 3.47 (FIP 3.13). Ao longo dos anos em Seattle, recebeu o apelido de King. Os Mariners separaram uma parte do seu estádio exclusivamente para os que torciam por Felix, espaço nomeado como King’s Court e ocupa três sessões no território de foul ball do lado esquerdo do campo no Safeco Field. Ele queria retribuir todo aquele apoio. Durante a temporada de 2012, Hernandez continuava mostrando todo o seu potencial e foi selecionado para mais um All-Star Game e ficou em 4º lugar na votação para Cy Young.. Naquele ano, liderarou a liga em shootouts (5), jogos completos (5), teve 4º melhor ERA (3.06), o 2º em IP (232), seu menor FIP da carreira (2.84), 8.7 K/9 e 2.2 BB/9.
O grande dia
Até aquele 15 de agosto de 2012, outros dois (!!!!) arremessadores conseguiram jogos perfeitos. Philip Humber, dos White Sox, e Matt Cain, dos Giants. Seattle viu um desses jogos perfeitos. Humber conseguiu o feito em pleno Safeco Field. Felix nunca escondeu o desejo de alcançar a perfeição. Ia longe nas entradas e conseguia controlar seus arremessos. Esperava ansiosamente pelo dia que conseguiria alcançar seu maior feito pessoal. O jogo era contra o Tampa Bay Rays. Entrando no jogo, essas eram os stats de Felix:
Starts/CG: 24/3
Record: 10–5
ERA: 2.74
Innings: 171 Walks: 44 Strikeouts: 162
HR: 11 Opponent AVG: 229.
Primeira entrada tranquila e os três primeiros rebatedores foram eliminados com ajuda da defesa de Seattle em 7 arremessos. O primeiro strikeout aconteceu abrindo a segunda entrada, seguida de duas eliminações e a entrada acabou tranquilamente com 10 arremessos. Um strikeout na terceira, entre duas eliminações por bolas no campo externo, em 7 arremessos.
Felix não ficava atrás na contagem e levou o jogo tranquilo por três entradas. Na quarta, o primeiro duelo (Sam Fuld) foi à contagem completa, mas Seager fez a eliminação no campo interno. B.J. Upton e Matt Joyce sofreram o strikeout em contagem 2–2. Felix continuava perfeito com poucos arremessos na cartela. 5ª entrada também passou sem sustos.
As três eliminações da 6ª entrada aconteceram via strikeout, 5º, 6º e 7º da partida, respectivamente, sobre o catcher Lobaton, o shortstop Eliott Johnson e o 3B Sean Rodriguez. Felix caminhava cabisbaixo e totalmente focado. Manteve a perfeição por seis entradas. Seria aquele o grande dia? Dizem que o segredo é pensar apenas no próximo rebatedor, mas seria isso possível? Veio a 7ª entrada e novamente os defensores de Seattle mostraram, mais uma vez, que estavam a serviço do Rei naquela tarde. Todas as eliminações na conta do time e a perfeição continuava. 8ª entrada.
Felix conseguiu o 8º strikeout, o segundo em cima do DH Evan Longoria. O 2B Zobrist tentou algo, mas rendeu o 9º strikeout da tarde numa contagem 1–2, cortesia da breaking ball de Felix. 1B Carlos Pena no bastão, mais uma contagem 1–2, mais um strikeout, o 10º. Faltavam 3 rebatedores pra Felix cravar o nome na história do beisebol. Os três strikeouts na 8ª entrada mostraram o quanto o King estava focado no seu objetivo. Nunca atrás na contagem e com uma capacidade de induzir swings absurda.
9ª entrada. Nesse contexto é a mais agonizante de todas. Tudo está muito perto e muito longe ao mesmo tempo. Novamente Felix trabalhou na contagem 1–2 e conseguiu o 11º strikeout na partida diante do PH Desmond Jennings.
Mais um PH em eff Keppinger, mais uma contagem favorável a Felix (1–2) e a bola cruzou o diamante para a 26ª eliminação da partida. A eliminação gloriosa (ou não) chegou num novo duelo contra Rodriguez. Felix já passava dos 100 arremessos, mas não parecia tão desgastado. Contagem chegou a 2–0. Felix anda em volta do montinho, respirou… procurou de novo a concentração para finalizar com louvor a sua tarde. Felix arremessou um slider, swing and a miss, e a contagem chegou a 2–1. Outra bola de curva na zona de strike. 2–2. Rodriguez esperou a breaking ball e conteve o swing. Felix lançou uma sinker de 92mph na zona de strike, na qual o rebatedor não teve reação e assim completou o seu jogo perfeito.
