Lenda da seleção brasileira, Kleber Ojima é o novo reforço do The Pitchers

por Almir Lima Jr.

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8 min readJun 26, 2018

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Ojima, de 42 anos, foi um dos grandes nomes da seleção brasileira dentro do campo neste século e agora tenta carreira nas cozinhas do The Pitchers. (Foto: Eric Akita/The Pitchers)

Dos campos para as cozinhas. Parece ser uma transição drástica de atividades, mas para Kleber Ojima, uma das maiores lendas da história da história da seleção brasileira de beisebol, isso não é novidade. “Eu já estou me preparando para recomeçar de novo, não é uma coisa que eu penso que vou chegar e já vou fazer”, disse ele. Agora aos 42 anos, o ex-arremessador está de volta ao Brasil após uma temporada morando no Canadá para reforçar o time do The Pitchers Burger and Baseball, hamburgueria temática de beisebol localizada em São Paulo que acabou de fazer dois anos — e recentemente abriu sua segunda loja na capital paulista (o Food Stadium, do qual você pode saber mais aqui).

Ojima foi a estrela principal da seleção que disputou o Mundial de 2003 em Cuba; nas quartas de final, em um dos maiores jogos da história do beisebol brasileiro, ele silenciou a seleção cubana por oito entradas, ficando a três eliminações de mandar o Brasil para as semis, porém acabou sendo derrotado na última entrada com um walk-off home run de duas corridas de Kendrys Morales (hoje rebatedor designado dos Blue Jays). Ele teve uma carreira vitoriosa, que incluiu passagens por Taiwan, até se aposentar da seleção em 2008 nos jogos de comemoração ao centenário da imigração japonesa e em 2010 definitivamente do esporte. A história de sua carreira está resumida na autobiografia “Arremessos vencedores”, lançada em 2008 pela editora Nivaldo Maringoni.

“A partir desse momento [da aposentadoria], eu comecei a pensar na minha carreira pós-beisebol. Era difícil pensar em viver somente de beisebol no Brasil, porque infelizmente ainda era muito amador, e continua sendo”, diz Ojima. “Viver só de beisebol depois que você termina sua carreira é difícil em qualquer lugar do mundo, na verdade. Eu cheguei a conversar com o pessoal que jogou naquela época comigo em Taiwan e aposentou, a maioria pós-carreira também não teve a oportunidade de trabalhar com beisebol. Normalmente quando você trabalha como treinador, ou o salário é baixo, ou é voluntário, mesmo em grandes centros. Somente quem consegue uma carreira são os superstars. São casos raros. No Brasil é ainda pior”.

Ojima já era formado em Fisioterapia, mas não quis seguir carreira na área. “Foi uma coisa que eu até pensei, mas eu achei que trabalhar com comida era algo que mexia mais comigo. Seria algo mais interessante”, admite ele. “Nessa época, um grande amigo tinha acabado de abrir uma casa de cachorro quente [Alex Isozaki, dono do Alekão, lanchonete de hot dogs que está completando 10 anos em 2018]. Ele já estava com a casa há algum tempo, então fui conversar com ele e falei ‘Olha, eu me interesso em trabalhar com você, quero aprender a trabalhar com comida’. Ele aceitou”, diz Ojima. Foram quatro anos na cozinha do Alekão até que ele resolveu tentar a sorte no estrangeiro. “Aprendi muita coisa lá sobre o conceito de venda e parti com esse conceito para o Canadá em 2014, quando decidi mudar”.

No exterior, Ojima continuou a trabalhar em restaurantes, porém o estilo era um pouco diferente. “Eu trabalhei num restaurante que era especializado em brunch e tenho certeza que a clientela é muito diferente pelo fato da própria cultura. Basicamente, a cozinha tem mais ou menos o mesmo ritmo, mas com certeza o conceito, a comida e os clientes são completamente diferentes”, explica. Na mente, como qualquer outro imigrante em busca de uma nova vida, havia um sonho de melhorar. “Quando você chega num país, normalmente começa de baixo, nos trabalhos que eles chamam de entry level, mas eu já tinha planos pra futuramente ter minha própria loja”.

“O Canadá é um país fantástico, é um país justo, correto, com boa qualidade de vida, país seguro. Mas não tem jeito, o meu coração é brasileiro, o meu sangue é brasileiro, isso faz diferença”. O ex-arremessador transformado em ajudante na cozinha fora do país agora estava enfrentando um dilema pessoal relativo ao desafio de morar no exterior. “As pessoas quando planejam ir para um país como o Canadá, elas pensam muito na segurança, saúde, distribuição de renda, dignidade, emprego, tudo. Mas eu acho que qualidade de vida engloba muito mais que isso. Eu percebi isso quando vi que ficar longe da minha família, dos meus amigos, era muito pesado. Pra mim, hoje, a qualidade de vida é estar perto das pessoas que você ama e fazendo coisas que você ama”, revela Ojima.

Em uma de suas visitas à família no Brasil, o caminho de Ojima se encontrou com o do The Pitchers. “No final de 2016, eu voltei pro Brasil pra visitar a família e aí passei no The Pitchers pra encontrar com os meus amigos. E durante os dois meses que fiquei aqui, criaram a ideia da homenagem pra mim e pra seleção de 2003”. O evento de homenagem, que contou com a retransmissão daquele jogo histórico de 2003, mexeu com o agora veterano Ojima. “Pra mim ficou muito marcado o fato de depois de tanto tempo, com o beisebol não fazendo mais parte da minha vida, eles resgatarem uma paixão que eu nunca esqueci. Pra mim foi emocionante, inesquecível”, diz ele.

A homenagem foi uma força que ajudou a começar a concretizar as ideias que ele tinha de voltar para o Brasil. “Foi nessa junção de coisas que eu fui percebendo que o beisebol já fazia parte de mim e que eu precisava de algum vínculo. Independente se fosse minha função principal, eu precisava contribuir para o beisebol porque foi algo que eu fiz a minha vida inteira. [A homenagem] foi como um click, foi importante para resgatar aquela vontade que já estava um pouco apagada. Com o tempo eu fui procurando me inteirar com o beisebol daqui novamente durante o ano passado, que era algo que eu não tinha mais tanto vínculo, e aí mais pro final do ano eu comecei a ter mais contato com os meninos [do The Pitchers] e surgiu a ideia”, diz Ojima. “Quando surgiu a proposta, pra mim foi o máximo porque tinha tudo a ver com o que eu também tinha em mente: trabalhar com comida e ainda estar envolvido e poder contribuir com o esporte que foi algo que eu sempre fiz a minha vida inteira”.

“Eu precisava achar algo que realmente me fizesse voltar de vez. Não podia voltar pro Brasil sem nada na mão. Então quando eles falaram, já veio na minha cabeça na hora. Foi um belo de um casamento”, comemorou Ojima. “O mais importante pra mim era justamente essa junção da culinária com o esporte, tem tudo a ver com aquilo que eu também tinha como objetivo. Então, lógico, se além da minha vontade de trabalhar aqui, também poder contribuir com o beisebol, vai ser sempre bom”.

“Pensando de forma racional, o The Pitchers tem tudo para ser um excelente negócio futuramente, com o potencial para crescer muito”, diz ele. “Falando de coração, era tudo que eu esperava fazer um dia: trabalhar com algo com que hoje eu tenho certo domínio, na cozinha, e poder contribuir com o beisebol, que foi a minha paixão, junto com pessoas extremamente competentes num ambiente fantástico”. Agora, voltando para o Brasil em uma nova função, ele se sente rejuvenescido. “Me vejo como aprendiz. Tô chegando aqui primeiramente pra aprender a trabalhar com o conceito do The Pitchers. Então eu não penso ainda em somar. Acho que só vou poder fazer isso no momento em que estiver em condições. É poder aprender pra poder somar”.

Para Ojima, o retorno para o Brasil não significa que a estadia no Canadá foi ruim, muito pelo contrário. “Muita gente pensa que porque eu estou voltando não deu certo. Eu acho que não, que deu muito certo, por ter ido e conhecido uma cultura nova, ter aprendido muita coisa nova. Uma oportunidade que se eu não tivesse feito eu nunca saberia o que eu realmente queria fazer da vida”, diz ele. “Hoje eu tenho muito mais convicção. Meu sangue é verde e amarelo, eu quero estar aqui. É diferente de quando eu fui para lá, eu já fui com pretensão de que ia conseguir mudar, de que é melhor viver lá porque a qualidade de vida é melhor. Mas eu percebi que qualidade de vida não é só isso”.

Com a oportunidade única de enaltecer o beisebol por meio da culinária, Ojima se disse extremamente feliz pela nova oportunidade no The Pitchers. “É muito mais que somente um trabalho. Lógico que o objetivo é o lucro, porque a gente precisa de dinheiro pra pagar as nossas contas, mas é muito mais a realização de um sonho, em todos os sentidos. Hoje, como atleta, não posso mais contribuir, mas posso contribuir junto com os meninos de uma outra forma, tanto pro esporte, quanto para o The Pitchers”, disse ele. “O The Pitchers tem tudo pra ser gigante. Eu tenho muita esperança nisso pq os meninos são fantásticos. Já conheço os lanches, sei da qualidade, então sei que tem tudo pra dar certo pra ser um gigante”, enalteceu ele, que ainda se mostrou extremamente feliz por essa junção de paixões. “Hoje, no momento, eu só tenho pensado na minha carreira no The Pitchers, mas paralelo a isso, já sei que o The Pitchers tem um trabalho grande extra-campo, e é assim que eu tenho pensado hoje, auxiliar de uma outra forma”.

Agora, essa pequena hamburgueria cheia de potencial (recentemente foi eleita uma das quatro melhores da cidade de São Paulo em votação popular no Guia do Hambúrguer, uma das maiores referências no assunto) terá uma lenda do beisebol brasileiro em sua cozinha. “Por mais que a gente fale que não podemos viver do passado, é gratificante saber que as pessoas te valorizam por algo que você fez com carinho”, disse Ojima. Para ele, estar junto do The Pitchers é uma forma de ajudar a relembrar não só a sua contribuição para o beisebol, mas a das outras gerações também. “Muita gente começou a entrar no beisebol mais recentemente e não tem a memória do esporte. É justamente porque não teve divulgação. Como não teve divulgação, as pessoas não sabem o que foram as gerações anteriores, o que representou. Quando eu comecei a jogar, eu tinha meus ídolos do esporte dentro do próprio país, queria ser como eles. Eu acho que esse resgate não é questão de ficar falando do passado, mas resgatar a memória de grandes gerações que passaram é importante pra se ter uma base, um espelho”.

Ojima será uma das atrações do The Pitchers Food Stadium, a filial do The Pitchers Burger and Baseball, localizado nas dependências do Arena Beisebol, o primeiro centro de treinamento de beisebol indoor do país, que fica a menos de cinco minutos a pé da estação Tatuapé do metrô.

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