Pior anfitrião da história das Copas

Victor Savani
Sem Clubismo F.C.
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4 min readJun 5, 2018

Existem seleções que aproveitam, e muito, o fator casa nas edições de Copa — das 20 edições, 6 foram vencidas pelos anfitriões. Nessa lista, estão inclusas as polêmicas vitórias da Itália em 1934, da Inglaterra em 1966 e Argentina em 1978, todas com supostas ajudinhas da arbitragem. Entretanto, nós brasileiros sabemos como ninguém que também é possível passar um enorme vexame em casa.

A África do Sul sediou a Copa de 2010 e tinha tudo para fazer história. Na Copa das Confederações do ano anterior, os Bafana Bafana foram uma grata surpresa alcançando a terceira colocação do torneio e dando um grande trabalho para seleções gigantes como Brasil e Espanha, que suaram e muito para conseguir bater os donos da casa por 1 a 0 e 3 a 2, respectivamente.

Torcida em festa durante a Copa das Confederações (Leo Lara)

Depois de mudanças no comando técnico, com a saída de Joel Santana e a entrada de Carlos Alberto Parreira, a sensação dos torcedores e habitantes da África do Sul era de que a sua seleção poderia surpreender mesmo caindo em um grupo dificílimo com França, Uruguai e México. Apesar de todas as adversidades técnicas, a torcida fazia muito barulho e o ambiente era favorável para os sul-africanos.

A estreia foi diante da seleção mexicana no belíssimo estádio Soccer City, em Joanesburgo. Com um primeiro tempo morno e sem fortes emoções, parecia que as equipes tinham deixado tudo para o final. A etapa complementar iniciou e já aos 10 minutos, em excelente contra-ataque, o meio campista Tshabalala acertou um lindo chute de longe e abriu o placar. Na comemoração, uma dança bem carismática ao lado de seus companheiros. Com o golaço, as vuvuzelas tocavam sem parar e o estádio pulsava de tanta alegria. Mas como nem tudo são flores, o México decidiu abafar a festa da abertura. Aos 34', Guardado cruzou, a bola passou por todo mundo na grande área até chegar no experiente zagueiro Rafa Marquez, que dominou e tirou as chances de defesa de Khune. 1 a 1 no placar, frustrando grande parte dos 84.490 torcedores.

O Soccer City tem capacidade para 91.141 espectadores (Boogertman Urban Edge and Partners)

O segundo confronto foi diante do excelente Uruguai, que havia segurado os franceses no primeiro embate em um 0x0. Com um ataque ineficiente, os sul-africanos pouco incomodavam o goleiro Muslera e sua defesa. Melhor para Diego Forlán e Luis Suárez que fizeram uma atuação magnífica. Aos 24 minutos de jogo, o primeiro balde de água fria veio com um golaço de Forlán em um chute de fora da área que contou com um desvio fatal, matando o goleiro Khune. A vida dos Bafana piorou aos 30'. Suárez tentou duas vezes na área. Na primeira, Khune defendeu. Mas a bola voltou para o camisa 9, que driblou o goleiro e foi derrubado. Pênalti e cartão vermelho para Khune, que saiu desolado de campo por perder o duelo decisivo contra a França. Parreira foi obrigado a tirar Pienaar e colocar Josephs no gol. Forlán cobrou no alto e marcou: 2 a 0. Já no apagar das luzes, Álvaro Pereira recebeu de Suárez e tocou para o gol vazio, 3x0 e fim de papo. Com o resultado, a situação dos anfitriões estava delicada no grupo A.

No último e decisivo jogo, os Bafana necessitavam de uma goleada diante da França e tinham que torcer para o Uruguai fazer pelo menos 3x0 no México, para alcançar a heroica classificação para a fase final. A França vivia uma enorme crise nos bastidores; jogadores como Anelka (expulso da delegação), Evra, Malouda e Govou (ambos barrados), eram a certeza de que o clima estava péssimo. Voltando para dentro de campo, ambas as equipes necessitavam vencer para sonhar com a vaga para a próxima fase.

Seleção francesa só foi ao Mundial graças ao gol de mão de Henry (Clive Mason)

O começo foi muito animador para os donos da casa que abriram o placar aos 20 minutos de jogo. Tshabalala bateu escanteio, Lloris falhou feio e o zagueiro Khumalo abriu a contagem para os sul-africanos. O pesadelo aumentou para os franceses quando Gourcuff foi expulso após acertar uma cotovelada. No banco, o barrado Evra e o preterido Henry se olharam com aquela cara de “o que é que nós estamos fazendo aqui?”. Minutos depois chegou o nocaute e ele veio com o atacante Mphela aproveitando a falha da marcação e entrando com bola e tudo para marcar o segundo gol. Aos 24' da etapa complementar, os três melhores jogadores franceses na partida apareceram juntos. E, aleluia, deu resultado. Sagna arrancou pelo meio e enfiou a bola para Ribéry, que deixou Malouda livre diante do gol vazio. O meia, que tinha substituído Gignac, balançou a rede para os Bleus pela primeira — e única — vez naquele Mundial. Por um momento, as vuvuzelas se calaram no Free State Stadium. As fichas foram caindo e os donos da casa foram eliminados de forma melancólica dentro de seu próprio país.

O triunfo uruguaio diante do México por 1 a 0 não foi suficiente e acabou classificando ambas as seleções latino-americanas para as oitavas de final. E com isso, a África do Sul foi a pior anfitriã da história das copas e foi a única seleção dona da casa a ser eliminada na fase de grupos de uma Copa do Mundo.

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Victor Savani
Sem Clubismo F.C.

25 anos. Bacharel em Sistemas de Informação. Mestrado em Big Data Aplicado ao Futebol. Apaixonado por futebol e membro do @SemClubismo_FC.