Am(ar-te)

Yurajyánay Andaluz
SEMIÓTICA // turma 2018.2
3 min readMay 3, 2019

Me recordo como se fosse hoje… Em uma aula de literatura durante o ensino médio, na qual minha professora parou diante de uma turma com aproximadamente quarenta pessoas e se virou de costas. Se virou e parou para observar a pintura de Monet que estava sendo projetada no quadro, fez isso enquanto que respirava calma e compassadamente. Após esse momento de contemplação que para alunos de colégio pouco sentido fez ela soltou a seguinte frase: “quando observamos arte nós olhamos para ela e deixamos ela olhar de volta para nós”. Com essa única frase minha professora mudou completamente a forma como eu interagia com o mundo, com as pessoas e com o que eu compreendia por arte, que a partir desse dia se tornou um conceito em expansão. Ela me deu um presente maior, deixou como herança essa mudança de olhar que se estende até os dias de hoje.

Na mitologia japonesa existe um mito de que há uma corda vermelha amarrada no seu mindinho e a outra ponta no mindinho da sua respectiva alma gêmea. É assim que eu me sinto todas as vezes que me deparo em estado de contemplação ou de devaneio perante a arte. Sinto como se estivesse criando um novo laço vermelho com a expressão artística diante de mim.

Ao analisar qualquer tipo de expressão artística é importante saber separa seus elementos do contexto. Isso nos permite dialogar melhor com a obra e transitar não somente pelo que acreditamos ser a ideia que o autor quer nos passar, como também incorporar nossas próprias ideias. No cartaz acima, produzido por Lívia Pastichi, consigo identifcar diversos elementos que constituem um todo:

  • O fundo de papel azul
  • As folhas de papel cortadas em formato de labaredas nas cores amarelo e laranja, cujo formato é acentuado pelo marcador preto
  • O papel preto cortado em formato que remete a uma flor, símbolo que é acentuado pela presença dos traços brancos sobre o papel
  • O papel vermelho cortado em forma de coração
  • O papel marrom cortado também em formato de coração, com pequenos traços brancos nele
  • O texto “que se espalha onde tem fé” escrito com um marcador preto

Ao bater o olho no cartaz os elementos que mais me chamam a atenção são as chamas em laranja e amarelo, cores que remetem a muita energia. Me chama atenção também o fato de que o papel que remete às chamas amarelas foi cortado de forma irregular, o que somente acrescenta à construção da imagem ligada ao signo fogo. A frase “que se espalha onde tem fé”, escrita com uma tipografia tremida, agrega ao aspecto visual flamejante do cartaz, dá a ideia de movimento, perturbação, inquietação. E tudo isso aparenta estar saindo do coração. Coração este simétrico e colocado debaixo do também simétrico recorte do papel marrom que remete a couro costurado. Há também o elemento das flores pretas que para mim parecem mais engrenagens desse coração mecênico e robusto produzido pela artista. Não é somente um recorte de um coração de papel, é algo que te emociona, que te contagia e que acaba por se espalhar dentro da pessoa que observa o cartaz. E ainda assim todos esses elementos estão dispostos sobre um azul que me remete a muita tranquilidade e calma. É um turbilhão de sentimentos deitado sobre uma cama de esperança de que essas sensações são benéficas.

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