Aprendizado de Máquina na Prática: Um Manual para Projetos Bem-Sucedidos

Guilherme Bernieri
Senior Sistemas
Published in
11 min readDec 12, 2023
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Neste manual, apresentamos de forma prática as etapas de um projeto de aprendizado de máquina. Com foco na aplicabilidade prática, este manual está repleto de dicas úteis, exemplos concretos e as melhores práticas. Exploraremos as diversas fases de um projeto de aprendizado de máquina, que incluem a definição de objetivos claros, a coleta e preparação de dados, a análise e exploração de dados, a seleção e ajuste de modelos, entre outros aspectos. Nosso objetivo é fornecer a você um entendimento mais profundo de cada fase, capacitando-o a aplicar estes conceitos de forma eficaz em seus próprios projetos. Se você está buscando aprimorar suas habilidades em aprendizado de máquina ou implementar soluções inovadoras em sua organização, este manual é o ponto de partida ideal para sua jornada de aprendizado e descoberta.

1. Definindo o problema e o panorama geral

Primeiramente, busque entender o problema e identificar claramente o objetivo do projeto em relação ao negócio. Considere todas as possíveis abordagens e soluções, mantendo a criatividade e o pensamento crítico. Além disso, é importante envolver as partes interessadas para garantir que suas expectativas sejam consideradas e seus conhecimentos sejam incorporados no projeto. Algumas perguntas que podem ajudar nesta etapa são:

  • Como a solução será utilizada?
  • Existem soluções alternativas para o problema? Essas soluções já foram testadas ou implementadas?
  • Qual abordagem de aprendizado de máquina é mais adequada (supervisionado, não supervisionado, reforço, online ou offline)?
  • Quais problemas são comparáveis? Analisar estudos de caso e soluções aplicadas em problemas semelhantes pode fornecer insights valiosos.
  • Como o desempenho deve ser medido e qual é o valor mínimo aceitável? Determine métricas relevantes, como precisão, revocação, F1 score, área sob a curva ROC, erro médio quadrático, entre outras, dependendo do tipo do problema abordado.
  • Quais são as limitações de tempo e recursos para o projeto? Estabeleça um cronograma realista e considere as habilidades e experiências da equipe.
  • Os dados necessários estão disponíveis? Caso contrário, como os dados podem ser coletados ou gerados? Considere questões éticas e legais relacionadas à coleta e uso de dados.

2. Coleta, armazenamento e proteção dos dados

A obtenção de dados de qualidade é fundamental para o sucesso do projeto. Automatize o processo de coleta de dados e mantenha a organização, garantindo que as informações sejam obtidas, armazenadas e protegidas adequadamente. Lembre-se de que a coleta de dados é um processo contínuo e pode ser necessário coletar dados adicionais à medida que o projeto avança. Algumas etapas nesta fase incluem:

  • Identificar quais dados são necessários e suas fontes: considere a possibilidade de utilizar dados públicos, de terceiros ou internos da empresa.
  • Obter as autorizações de acesso aos dados: verifique se há restrições legais e éticas ao uso dos dados e obtenha consentimentos, se necessário.
  • Criar um espaço de trabalho adequado: configure um ambiente de trabalho eficiente e seguro para armazenar e manipular os dados, como bancos de dados, sistemas de arquivos ou ambientes de nuvem.
  • Converter os dados para um formato fácil de manipular: escolha formatos de arquivo adequados, como CSV, JSON ou Parquet, para facilitar o processamento e análise dos dados.
  • Proteger informações sensíveis, garantindo a anonimização dos dados: utilize técnicas como a tokenização, pseudonimização ou mascaramento de dados para proteger a privacidade dos indivíduos.

Além disso, considere as seguintes dicas:

  • Estabeleça um processo de controle de versão dos dados para acompanhar as alterações e permitir a colaboração entre os membros da equipe. Por exemplo: 2023–12–08–16–13_dataset.csv
  • Faça backup dos dados regularmente para evitar perdas e garantir a recuperação em caso de problemas.
  • Documente o processo de coleta de dados, incluindo as fontes, métodos e quaisquer transformações aplicadas, para garantir a reprodutibilidade e rastreabilidade do projeto.
  • Monitore a qualidade dos dados, verificando a integridade, a completude e a consistência das informações coletadas.
  • Implemente medidas de segurança, como criptografia, controle de acesso e políticas de gerenciamento de dados, para proteger os dados contra ameaças e violações.

3. Analisando e explorando os dados

Nesta etapa, o objetivo é analisar profundamente os dados em busca de informações valiosas, o que pode envolver o uso de técnicas estatísticas, visualizações e conhecimento do domínio. Ao colaborar com especialistas no assunto, você obterá uma visão mais completa do contexto dos dados e garantirá que os insights gerados sejam relevantes. Utilize visualizações explicativas para facilitar a compreensão das informações e compartilhar suas descobertas com as partes interessadas, promovendo discussões construtivas e orientando as próximas etapas do projeto. Alguns passos importantes nesta fase são:

  • Criar uma cópia dos dados para exploração: isso permite que você manipule e analise os dados sem afetar o conjunto original.
  • Estudar as características de cada variável (nome, tipo, valores ausentes, distribuição, etc.): compreenda o significado e importância de cada variável no contexto do problema.
  • Utilize técnicas de visualização de dados: crie gráficos de dispersão, histogramas, box plots e mapas de calor, para explorar padrões, tendências e outliers nos dados.
  • Identificar a variável-alvo para tarefas de aprendizado supervisionado: essa é a variável que o modelo tentará prever ou classificar.
  • Analisar correlações entre variáveis e identificar transformações promissoras: procure relações lineares e não lineares e considere a possibilidade de criar novas variáveis (feature engineering).
  • Identifique possíveis vieses nos dados: dados enviesados podem afetar a qualidade e a justiça dos modelos de aprendizado de máquina, o que pode gerar uma discriminação contra grupos minoritários.
  • Documentar suas descobertas e aprendizados: isso facilitará a comunicação com outras partes interessadas e ajudará na tomada de decisões futuras.

4. Preparação dos dados

Prepare os dados aplicando técnicas de limpeza e feature engineering. Mantenha o conjunto de dados original preservado e trabalhe com cópias, garantindo que as transformações sejam aplicadas de maneira eficiente, sem alterar permanentemente os dados originais. A preparação dos dados é fundamental para garantir que os modelos de aprendizado de máquina possam aprender com eficácia e produzir resultados confiáveis. Algumas ações nesta etapa incluem:

IMPORTANTE: Divida os dados em conjuntos de treinamento, validação e teste antes de aplicar quaisquer transformações nos dados, para evitar vazamento de dados (data leakage). O vazamento de dados ocorre quando informações do conjunto de teste são usadas, inadvertidamente, no processo de treinamento, levando a uma avaliação imprecisa do desempenho do modelo.

  • Limpeza de dados: tratar valores ausentes e remover ou corrigir outliers; considere técnicas como imputação, remoção de registros ou substituição por valores médios, medianas ou modas, conforme apropriado.
  • Seleção de atributos: eliminar variáveis irrelevantes ou redundantes para a tarefa; utilize técnicas como seleção univariada, seleção recursiva de atributos ou métodos baseados em modelos, como importância de atributos em árvores de decisão.
  • Feature Engineering: discretizar variáveis contínuas, decompor atributos complexos e criar novas variáveis a partir das existentes; considere a criação de interações entre variáveis, agregações e transformações matemáticas, como logaritmos ou raízes quadradas.
  • Padronização ou normalização de variáveis: ajuste a escala das variáveis para facilitar a comparação e melhorar o desempenho dos algoritmos de aprendizado de máquina; aplique técnicas como StandardScaler, Min-Max Scaling, Z-score ou escala logarítmica.
  • Criar um pipeline com todas as transformações a serem realizadas: isso simplifica o processo de aplicação das transformações e ajuda a garantir que elas sejam aplicadas de maneira consistente em todos os conjuntos de dados (treinamento, validação e teste).

É importante destacar que as transformações, tais como o escalonamento, aplicadas aos dados de treinamento, devem ser igualmente aplicadas aos dados de validação e teste. No entanto, um novo ajuste (fit) não deve ser realizado exclusivamente com os dados de validação ou teste. Isso assegura que todos os conjuntos de dados estejam na mesma escala.

5. Seleção dos modelos mais promissores

Explore uma variedade de modelos de aprendizado de máquina e selecione os mais promissores com base em seu desempenho e capacidade de generalização. Adote uma abordagem iterativa e sistemática, testando diferentes técnicas, ajustando hiperparâmetros e avaliando seu desempenho com precisão. Alguns passos nesta fase são:

  • Treinar diversos modelos usando parâmetros padrões: considere algoritmos de aprendizado de máquina adequados ao seu problema, como regressão linear, árvores de decisão, k-Nearest Neighbors (k-NN), Support Vector Machines (SVM) e redes neurais, dependendo do tipo de tarefa (regressão, classificação, etc.).
  • Medir e comparar o desempenho dos modelos utilizando validação cruzada: isso fornece uma estimativa mais robusta do desempenho do modelo em dados não vistos.
  • Analisar as variáveis mais significativas para cada algoritmo: isso pode ajudar a entender a importância das variáveis e identificar possíveis melhorias na feature engineering ou na seleção de atributos.
  • Identificar os tipos de erros cometidos pelos modelos: isso pode ajudar a entender as fraquezas dos modelos e ajustar suas estratégias, se necessário.
  • Realizar rodadas de seleção de atributos e feature engineering: aprimore os dados e os modelos iterativamente, buscando sempre melhorar o desempenho.
  • Utilize métricas de desempenho relevantes para o problema: utilize métricas como acurácia, precisão, revocação, F1-score, área sob a curva ROC (AUC-ROC) ou erro quadrático médio (MSE), dependendo do tipo de tarefa e dos objetivos do projeto.
  • Avalie a complexidade dos modelos e a capacidade de generalização: modelos mais complexos podem sofrer de overfitting, enquanto modelos muito simples podem não ser capazes de capturar a estrutura subjacente dos dados.
  • Selecionar de três a cinco modelos mais promissores, preferindo aqueles que cometem diferentes tipos de erros: isso permitirá a construção de um ensemble de modelos, aumentando a capacidade de generalização e robustez do sistema final.

6. Ajuste fino do modelo

Ajuste os hiperparâmetros dos modelos selecionados utilizando validação cruzada e técnicas de otimização, como pesquisa aleatória, grid search ou otimização bayesiana, para melhorar o desempenho do modelo. Automatize o processo o máximo possível e use o maior volume de dados disponível para essa etapa. Um ajuste cuidadoso dos hiperparâmetros e das configurações do modelo pode resultar em melhorias significativas no desempenho do sistema e aumentar a eficiência do projeto. Algumas ações importantes aqui incluem:

  • Explorar métodos de ensemble combinando os melhores modelos: isso pode incluir técnicas como bagging, boosting ou stacking, que ajudam a aumentar a robustez e a capacidade de generalização do sistema final.
  • Ajustar os hiperparâmetros de cada modelo de forma sistemática e controlada, mantendo registros detalhados de cada experimento e seus resultados: isso facilitará a análise e a comparação das diferentes configurações e ajudará na identificação das melhores combinações de hiperparâmetros.
  • Realizar análises de sensibilidade e robustez para entender como variações nos dados de entrada afetam o desempenho do modelo: isso pode ajudar a identificar áreas de melhoria e informar decisões sobre a coleta de dados adicional ou o ajuste de feature engineering.
  • Medir o desempenho do modelo final no conjunto de teste para estimar o erro de generalização: essa medida fornecerá uma estimativa realista do desempenho do sistema em dados não vistos e ajudará a garantir que o modelo não esteja sofrendo de overfitting.
  • Priorize a simplicidade e a interpretabilidade dos modelos sempre que possível: modelos mais simples geralmente são mais fáceis de entender, explicar e manter.

7. Apresentação da solução

Documente todo o processo e elabore uma apresentação que explique como a solução atende ao objetivo do negócio. Apresente pontos interessantes e aprendizados adquiridos durante o projeto, bem como quaisquer limitações do projeto. Utilize visualizações explicativas e afirmações de fácil memorização para comunicar os principais resultados. Além disso, considere os seguintes elementos para tornar sua apresentação eficaz e interessante:

  • Comece com uma introdução clara, descrevendo o problema de negócio e a motivação por trás do projeto de aprendizado de máquina. Relacione o objetivo do projeto às metas de negócio e estabeleça um contexto para a audiência.
  • Descreva o processo de desenvolvimento do projeto, incluindo as etapas de coleta e preparação de dados, seleção e ajuste de modelos e avaliação de desempenho. Destaque as decisões críticas tomadas ao longo do caminho e explique como elas contribuíram para a solução final.
  • Apresente os principais resultados e métricas de desempenho do modelo. Utilize gráficos, tabelas e outras visualizações para ilustrar as descobertas e facilitar a compreensão dos resultados. Compare o desempenho do modelo com benchmarks relevantes ou soluções alternativas.
  • Discuta as implicações da solução para o negócio e explique como ela pode gerar valor. Forneça exemplos concretos de como a solução pode ser implementada e usada na prática.
  • Aborde as limitações do projeto e identifique áreas de melhoria ou expansão futura. Seja transparente sobre os desafios enfrentados e as suposições feitas ao longo do projeto.
  • Conclua com uma síntese dos principais aprendizados e resultados, reforçando a relevância da solução para os objetivos de negócio. Enfatize os próximos passos e recomendações para a implementação e manutenção do sistema de aprendizado de máquina.
  • Durante a apresentação, use uma linguagem clara e acessível, evitando jargões técnicos sempre que possível. Adapte seu discurso ao público-alvo, garantindo que as partes interessadas de diferentes áreas compreendam os conceitos e resultados apresentados.

8. Implantação, monitoramento e manutenção do modelo

Prepare o modelo para implantação em produção, garantindo a integração com os dados de produção e a implementação de testes de unidade. Monitore o desempenho do modelo em intervalos regulares e esteja alerta para possíveis degradações ou mudanças nos dados. Para garantir um processo de implantação e monitoramento bem-sucedido, considere as seguintes etapas e dicas adicionais:

  • Preparar o modelo para produção: certifique-se de que o modelo esteja otimizado para o ambiente de produção e compatível com os sistemas existentes. Isso pode incluir a conversão do modelo para um formato específico ou a criação de APIs e serviços para facilitar a integração.
  • Implementar monitoramento de desempenho e alertas: configure o monitoramento em tempo real e estabeleça limites para métricas de desempenho, como precisão, revocação e latência. Crie alertas para notificar a equipe quando esses limites forem violados ou quando ocorrerem anomalias no desempenho do modelo.
  • Verificar a qualidade dos dados de entrada: implemente verificações de qualidade de dados para garantir que os dados de produção estejam limpos e sejam consistentes com os dados de treinamento. Isso pode incluir a validação de formatos, valores ausentes e limites aceitáveis para cada variável.
  • Retreinar os modelos regularmente com dados atualizados: reavalie periodicamente o desempenho do modelo e reajuste-o conforme necessário com base nos dados de produção mais recentes. Isso pode envolver o uso de técnicas de aprendizado online ou a criação de um pipeline automatizado para retreinar o modelo em intervalos regulares.
  • Planejar e testar estratégias de reversão: esteja preparado para reverter rapidamente para um modelo anterior ou solução alternativa caso ocorram problemas com o modelo implantado. Teste os processos de reversão e garanta que a equipe esteja familiarizada com eles.

Conclusão

Ao longo deste manual, abordamos os aspectos fundamentais para a execução bem-sucedida de um projeto nesta área. Desde a definição clara do problema e o entendimento do panorama geral, passando pela coleta, armazenamento e proteção dos dados, até a análise, exploração e preparação desses dados, cada etapa desempenha um papel fundamental no sucesso do projeto.

Destacamos a importância da seleção cuidadosa de modelos, enfatizando a necessidade de uma abordagem iterativa e sistemática na escolha e ajuste desses modelos. Ressaltamos também a relevância de uma apresentação eficaz da solução, que não apenas comunica os resultados, mas também relaciona o projeto aos objetivos de negócio e aborda limitações e áreas para melhoria futura.

Por fim, discutimos a etapa crítica de implantação, monitoramento e manutenção do modelo, sublinhando a necessidade de preparar o modelo para produção, implementar monitoramento de desempenho robusto e garantir que o modelo permaneça eficaz e relevante ao longo do tempo.

Este manual oferece um roteiro detalhado para profissionais que buscam implementar soluções de aprendizado de máquina de forma eficiente e eficaz. Ao seguir as orientações e dicas fornecidas, os profissionais estarão bem equipados para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que o aprendizado de máquina oferece, garantindo projetos bem-sucedidos e inovadores.

REFERÊNCIAS

GÉRON, Aurélien. Hands-On Machine Learning with Scikit-Learn, Keras, and TensorFlow. 2. ed. Sebastopol, CA: O’Reilly Media, 2019.

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Guilherme Bernieri
Senior Sistemas

Pesquisador | Inteligência Artificial | Tecnologia e Inovação