CULTO E LITURGIA LUTERANA — As leituras (liturgia da Palavra)
Culto e liturgia luterana é uma série de pequenos artigos escritos pelo então Rev. Raul Blum, hoje professor do Seminário Concórdia, para a Revista Mensageiro Luterano em 1972.
Como uma forma de incentivar o estudo do culto e pelo fato de possuirmos pouca bibliografia sobre a liturgia luterana em português, estou resgatando esses artigos para ficarem de fácil acesso para aqueles que buscam compreender e estudar a teologia e prática do culto luterano.
Que este sirva de instrumento para a edificação da proclamação da Palavra de Deus.
Nossas mentes têm sido purificadas e elevadas enquanto ascendíamos os quatro degraus da contrição, súplica, louvor e petição. Até aqui havíamos falado em todas as partes. Agora queremos ouvir atentamente o que Deus nos tenha a dizer. Os trechos bíblicos possuem uma solenidade e dignidade especiais, pois sabemos que nada do que dizemos ou fazemos pode-se comparar à palavra de Deus.
O costume de ler partes das Sagradas Escrituras nos vem desde o culto na sinagoga do Antigo Testamento onde eram lidos trechos da Lei e dos Profetas. A igreja cristã primitiva seguiu este costume acrescentando trechos das Epistolas e dos Evangelhos. Depois reduziu-se a um os trechos do Antigo Testamento formando com a Epistola e o Evangelho, três seleções bíblicas. Mas a partir do século VI, as leituras do Antigo Testamento praticamente desapareceram a não ser em dias especiais e nas Matinas e Vésperas. Algumas igrejas e congregações atualmente usam novamente as leituras do Antigo Testamento.
Nos tempos apostólicos a leitura de trechos escolhidos da Escritura Sagrada era importante e constituiu-se também no ponto alto da primeira parte da liturgia cristã. De início não havia seleções definidas. Mas os domingos principais foram os primeiros a terem seleções especificas. E aos poucos desenvolveu-se uma seleção completa para todo o Ano Eclesiástico. A Reforma Luterana aceita o sistema histórico em geral. As seleções foram reconhecidas como apontando o tema para o dia, dando direções para o sermão e inspirando a criação de novos hinos e melodias.
O conteúdo geral das seleções históricas é admirável. Conservamos ainda hoje estas seleções, se bem que com algumas alterações, pois elas são uma garantia de um ensino completo da verdade cristã fundamental. Em geral os Evangelhos da primeira metade do Ano Eclesiástico contêm os degraus do desenvolvimento da vida de Jesus na terra (semester Domini, o semestre do Senhor). A segunda metade apresenta uma seleção de suas parábolas, milagres e ensinos (semester ecclesiae, o semestre da igreja).
A leitura do Antigo Testamento
Como já foi atestado, uma leitura do Antigo Testamento era feita regularmente antes da Epistola e do Evangelho no culto da igreja antiga. E se hoje não costumamos mais usar esta leitura, sem dúvida isto é uma perda. O Antigo Testamento tem uma grande mensagem para os nossos dias. Seja a lei eterna do Senhor falando a nós no mundo moderno ou a palavra ética e dinâmica falada através dos profetas, julgando e condenando nossa cena contemporânea, ou a história da nossa salvação proclamada através das personalidades que eram o objeto da ação divina através dos séculos que procederam a chegada de nosso Senhor como o Messias, ou traçado do dedo de Deus na história — esta é a palavra de Deus para nós e nós hoje precisamos ouvir o que ele tem a dizer através dela. Nossa fé é histórica. Ela está baseada na atividade de Deus através dos milênios de recordação histórica. Vemos assim que uma leitura do Antigo Testamento em nossos cultos tem também o seu valor.
Entre a leitura do Antigo Testamento e da Epistola pode-se cantar um salmo ou um hino baseado em um salmo.
A Epístola
As Epistolas são cartas que foram escritas na igreja antiga e enviadas, primeiro às congregações ou pessoas particulares e, depois, passadas a todas as igrejas, Nestas Epistolas encontramos a palavra da lei cristã, isto é, lei no Espírito de Cristo, oferecendo a única, última e melhor esperança para a humanidade de hoje e sempre.
As seleções para os nossos cultos são extraídas geralmente das cartas dos apóstolos, mas ocasionalmente do Antigo Testamento, do livro de Atos ou do Apocalipse.
O gradual e o Aleluia
Tal como o Intróito, o Gradual é um elemento coral, responso coral à Epistola e uma introdução ao Evangelho. Ele tem sido chamado uma canção de passagem das palavras das servas de Jesus às próprias palavras de nosso Senhor. Caso o Gradual não for cantado pelo coro poderá ser lido pelo ministro.
O Gradual é um arranjo litúrgico geralmente de partes de salmos, cantados originalmente de um dos degraus (gradus), do altar, donde nos vem o nome. A primeira parte constitui o Gradual propriamente dito e reflete o pensamento da Epistola. A segunda parte é conhecida como o Aleluia e serve como prelúdio ao Evangelho.
A palavra aleluia nos vem em uma forma original do hebraico. É um cântico de júbilo e triunfo que muito cedo penetrou na liturgia cristã. Acha-se em muitos salmos especialmente nos salmos de louvor. Significando Louvai ao Senhor, ele está apropriadamente na liturgia como uma expressão de júbilo ao ouvir-se a palavra de Deus. Por isso, na época de Paixão omite-se o Aleluia.
O Evangelho
O Evangelho para o dia é selecionado dos quatro evangelhos (Mateus, Marcos, Lucas e João), que encontramos na Escritura Sagrada. Estes evangelhos formam uma parte de destaque na Bíblia. Na sua simplicidade, sinceridade e poder eles nos revelam o Filho de Deus na fraqueza da sua humanidade e na majestade de sua divindade. Contam-nos os incidentes de sua vida diária e recordam seus atos, conversações e ensinos. Eles nos conduzem desde o drama do sofrimento, morte e ressurreição de Cristo até aos fundamentos certos sobre os quais a igreja cristã está construída a mensagem da salvação, o comissionamento dos apóstolos e a instituição dos sacramentos.
Os responsos cantados pela congregação, antes e após a leitura do Evangelho, tem o seu significado. Glórias a ti Senhor é uma expressão de louvor e adoração a Deus que nos deu a sua santa palavra. Glórias a ti, ó Cristo é um tributo adicional de louvor pelo dom que ele nos deu.
As leituras da Escritura Sagrada têm uma grande mensagem para nós. Ouçamos elas atentamente.
Rev. Raul Blum
BLUM, Raul. Culto e liturgia: com ordem e decência. Mensageiro Luterano, vol. 55, n.2, jun. 1972, p.13
