Diga-me como consideras alguém e te direi como trepas

Mariana Farinas
Sexualidade em minúcias
3 min readJul 7, 2018

Como consideramos e somos considerados por alguém é parte do que fundamenta a intimidade erótica. Sempre transamos com quem – ou com o que – alguém é para nós.

Transa-se com um grande amor, com um desconhecido excitante, com uma companheira, com o pai de seus filhos e por aí vai. No caso da violência sexual, transa-se com alguém cuja vontade e desejo não vale nada ou com um predador que se relaciona com bonecas vivas. São muitas as nunaces que podem ser percebidas na relação erótica entre duas pessoas.

Quando alguém é verdadeiramente curioso em relação a como uma pessoa enxerga a vida – aquela curiosidade em que se está constantemente atento e aberto – há também um grande interesse em como ela irá, por exemplo, sentir um toque. Presta-se atenção minuciosa as suas reações, investiga-se o corpo em busca do que acontece e se demora mais aonde alguma reação diferente aconteceu. De outra forma, quando um vê o outro como alguém a quem deve-se explicar as coisas da vida, o sexo pode ter outros moldes. Na cama, o sabe tudo pode definir mais as posições, não ser tão afetado pelas reações alheias e, diante do que o outro quer fazer, pode participar de forma mais passiva, como que só deixando. Tem quem veja alguém como digno de atenção, na conversa e na cama, ou alguém que precisa ser conduzido, no passeio público e na intimidade. E tem que considere o outro como alguém que merece uma atenção íntima e especial as suas particularidades.

Alguém é sempre um corpo e um corpo é sempre alguém. O sentido do contato entre os corpos é temperado por quem aquela pessoa é para nós. Essas pernas são a elegância desse caminhar, essas mãos que já fizeram tanto e que pegam desse jeito que só elas mesmo, essa parte íntima que é uma verdadeira cura para a psicose do cotidiano. E esses pés que levantam tão leves do chão que só podem carregar um corpo que não tem peso algum. Essa presença que comove por sua precisão, autenticidade e delicadeza, tanto na mesa do jantar quanto na cama. Aquela presença que encurrala carinhosamente num cantinho de proteção e contenção tanto caminhando pelas ruas perigosas do centro da cidade, como namorando no sofá.

Frutas, animais, paisagens, tudo isso também faz parte do onirismo que permeia nossa consideração pelos outros. Quem sabe alguém que é doce como uma fruta, que se quer sugar e mamar até se lambuzar. Alguém que tenha a maciez de uma ovelha, na qual se pode aconchegar, roçar e se afundar. Que seja potente como um cavalo, que aguenta um bom tranco sem se abalar. Alguém leve como uma gazela, que se pode apreciar caminhando e jogá-la de lá pra cá. Talvez alguém com o olhar plácido e bonachão como o de um touro manso, que não se abala com nada mas que está sempre a gozar. Alguém que é uma brisa, que nos excita a pele com arrepios e nos faz suspirar, ou alguém quente e intensamente contido como o alaranjado de um por-do-sol de um dia abafado de verão.

Como consideramos alguém é justamente aquilo que orienta nossos gestos – inclusive os sexuais.

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