Paudurescência de Priapo

Mariana Farinas
Sexualidade em minúcias
3 min readJul 28, 2018

Priapo era um deus menor. Baixinho, com um membro sempre ereto e desproporcional ao seu tamanho, ele era o deus dos jardins, das hortas, dos pomares, dos produtos hortículas e dos pequenos rebanhos. Era um deus humilde e não vivia no Olimpo junto aos outros. Ele, evidentemente, estava sempre pronto para o ato de gerar — em outras palavras, pronto para o sexo. Porém, esta imagem de um homem com um membro enorme vai pra além do puramente sexual.

O importante no jardim é fazer crescer e endurecer

A coisa incha, tornando-se cada vez mais carnuda. Sim, é isso que ocorre àquilo que cresce na horta e no jardim. E Priapo é — dizem até hoje — quem protege o que é cultivado nas hortas, jardins e pomares. Ele está sempre cheio de disposição para fazer o que é necessário para gerar, ajudando então a terra a dar frutos. Priapo mantém-se em estado contínuo, sereno e humilde de dilatação, que é o que caracteriza tanto a excitação sexual quanto o crescimento das plantas. Ele é, portanto, um exemplo para o entumescimento vegetal, corporal e espiritual.

E estando sempre túrgido, nada pode se apresentar a Priapo como broxante, nada pode impedir o entumescimento. O vigor transbordante da ereção de Priapo tinha a força é tamanho que tira do caminho qualquer mal que possa impedi-lo. Afinal, onde há ereção não há repressão. Com sua imbatível e incansável capacidade de manter-se teso ele protege de todo o mal o que está em estado polpudo e suculento. Priapo espanta os ladrões. O sorrateiro que quiser apropriar de um fruto, como um mamão papaya suculento ou um impressionante pepino, pelo qual não tenha zelado, irá se dar mal.

Se houvesse uma constelação de Priapo

Trabalhar é duro

A criatura produtiva, criativa e inteligente, ao invés de retraída e murcha, se expressa e se expande regular e incessantemente como a ereção de Priapo. Não à toa, consideravam-no protetor dos hoteleiros, pescadores, marinheiros e hetairas (prostitutas refinadas, que proviam também estímulo intelectual aos seus poucos e, muita vezes duradouros, clientes). Os marinheiros e os pescadores usam os braços e o corpo, agindo nos momentos certos com perspicácia. Os hoteleiros, se atentam a detalhes, se movimentam e manuseiam objetos para que esteja tudo em ordem. E as hetairas acolhem e atendem de maneira precisa as necessidades daquele outro corpo e alma com desejos tão diferentes dos seus.

Todos esses profissionais têm de se manter firmes diante das adversidades da vida, continuando seu estado de expansão mesmo diante dos algumas vezes broxantes eventos do cotidiano. Caso contrário, o jardim da vida murcha. Priapo não era um deus protetor daqueles que exerciam atividades puramente intelectuais, como as que se resumem a gerenciar o tempo, gerenciar os outros ou fazer o mesmo com ideias. Nem tampouco atividades que não exigem inteligência e que reduzem o humano a um burro de carga. Priapo protege os que em seu trabalho necessitam estar em estado propício para copular com o que se apresentar no momento, como por exemplo um peixe que mordeu a isca ou um vento que mudou de direção. Ele protege os modestos que, além de uma inteligência gestual, necessitam de muita disposição para não broxar diante das adversidades.

Priapo é aquele que, humildemente, não consegue evitar a simples segurança de desfrutar a si mesmo, independente dos acontecimentos. E como tal, não consegue senão fazer crescer.

- para saber mais e melhor: João Angelo Oliva Neto, Falo no Jardim. Priapéia Grega, Priapéia Latina. Ateliê Ed. e Ed. UNICAMP, 2006

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