Então você decidiu moderar testes de usabilidade?

Ser um moderador iniciante é desafiador, mas há habilidades que você precisa ter e pode desenvolver para ser bom nisso.

Ingrid Layara
SiDi Design
8 min readNov 18, 2022

--

Fonte: Adaptado do Freepik

Artigo baseado no livro Handbook of Usability Testing: How to Plan, Design, and Conduct Effective Tests de Jeffrey Rubin e Dana Chisnell.

Moderar testes de usabilidade pode ser uma atividade desafiadora para quem está iniciando em aplicação de pesquisas com usuários. Para quem nunca viu um teste de usabilidade sendo feito e quer começar a aplicar, é comum que o nervosismo apareça e vários questionamentos sobre o que fazer surjam também.

"Tenho que falar e interagir o tempo todo com o participante?"

"E se algo inesperado acontecer?"

"Tenho que saber sobre o produto?"

"E se o participante executar a tarefa por outro caminho não previsto?"

Um moderador tem que não somente falar com várias pessoas diferentes durante os testes, mas também ser perspicaz para conseguir capturar as informações que gerem bons insights para o produto que está sendo estudado. Além disso, tem que influenciar o menos possível as respostas e ações dos participantes para a obtenção de dados reais.

Nos testes que participei como moderadora ou observadora, percebi que a execução do teste de usabilidade é sempre uma caixinha de surpresas: a gente nunca sabe exatamente o que os participantes vão nos contar, ou nos perguntar. Porém, há alguns comportamentos comuns feitos pelos participantes que exigem que o moderador tenha habilidades-chave e conheça alguns truques para contornar as situações, sem gerar dados enviesados e colocar a sessão de teste a perder.

Buscando aprender mais sobre moderação de testes de usabilidade, acabei encontrando uma lista de quais seriam as características ideais para ser um bom moderador. A seguir, algumas das qualidades que esse profissional precisa ter, segundo Jeffrey Rubin e Dana Chisnell:

Aprender rápido

Se um moderador atende a vários projetos ou testa várias funcionalidades novas de um produto, é necessário que ele tenha a capacidade de aprender e construir uma base de conhecimento rapidamente. Quais são os problemas desse produto? Qual sua posição no mercado? Quais são os competidores? Isso é importante para que o moderador consiga aplicar o teste já com uma bagagem que vai ajudá-lo a entender quais ações os usuários estão tomando e ser capaz de investigar mais sobre o assunto fazendo boas perguntas.

Ter flexibilidade

Para aplicar testes de usabilidade é necessário estar confortável com o inesperado e desconhecido. Imprevistos acontecem e você precisa estar preparado para corrigir o curso do plano original. O equipamento quebrou? O participante desistiu? O planejamento do teste não vai atingir o objetivo em questão?

Pode ser até que o moderador perceba que as atividades e perguntas não estão trazendo nenhum resultado satisfatório quando começar a fazer um teste piloto, por exemplo. Nesse momento, é ideal ter jogo de cintura para parar o andamento dos testes e voltar à etapa inicial. Como poderíamos reformular o planejamento para obtermos bons resultados? Saber fazer o movimento certo faz com que ninguém perca tempo com algo que não vai atingir o que é esperado.

Os autores citam um caso ainda mais extremo do que eu acabei de citar: um deles descobriu que a interface estava muito ruim após iniciar os testes com dois participantes. Com isso, acharam melhor interromper os testes e retornar à etapa de desenhar toda a interação novamente. Isso deixa claro que, mesmo em casos extremos, a flexibilidade é necessária para dar rumos melhores ao que está sendo feito.

Manter a atenção por longos períodos

A questão é: não dá pra prever quando uma boa descoberta vai aparecer. É necessário que o moderador consiga manter a atenção no que o participante está fazendo mesmo depois de ver várias sessões onde as pessoas seguem executando exatamente as mesmas tarefas. Portanto, ter foco é crucial.

“Moderadores de testes experientes compartilham um segredo: testes de usabilidade podem ser tediosos e chatos. Há longos períodos em que aparentemente nada está acontecendo: quando os participantes estão lendo, absorvendo, pensando e, às vezes, só descansando.“ — Rubin e Chisnell

Gerar uma boa conexão com os participantes

É essencial que você saiba deixar os participantes confortáveis na hora do teste. Por quê? Porque quando estamos mais confortáveis, ficamos mais abertos para sermos honestos e contar histórias em detalhes e isso é muito importante para adquirir bons dados nos testes. Se algum participante não estiver se sentindo confortável, é provável que ele não execute as tarefas como naturalmente faria e isso gera resultados ruins.

“Se você pode testar apenas cinco participantes, um participante desconfortável representa uma perda potencial de 20% dos dados do teste. A habilidade do moderador de cuidadosamente identificar cada personalidade dos participantes, fazer amigos e deixar a pessoa à vontade é essencial para obter o máximo do processo de teste.” — Rubin e Chisnell

Elisa Volpato dá dicas sobre Como deixar o participante à vontade no teste de usabilidade.

Saber a hora de falar

Sabe aquele apresentador de um programa brasileiro no final de domingo que fazia perguntas uma atrás da outra e não dava tempo para as pessoas responderem? Não seja essa pessoa. O silêncio é uma ferramenta para fazer com que o participante conte ainda mais suas impressões e quanto mais ele te der informações, maiores as chances de obter dados valiosos para o projeto.

“Depois de você ter explicado o propósito da sessão, explicado o seu papel e os das pessoas presentes no ambiente, pare de falar. Até quando houver silêncios, não seja rápido para preenchê-los. Espere. Conte até 20 devagar e silenciosamente antes de dizer qualquer coisa. Há chances de que algo interessante aconteça até lá e você não vai precisar abrir a boca.” — Dana Chisnell

Elisa Volpato descreve bem como funciona essa técnica aqui: O silêncio intencional como técnica em teste de usabilidade.

Dê o devido tempo para as pessoas comentarem as tarefas e responderem às perguntas.

Além de empático, um bom ouvinte

É também necessário saber ouvir. E, além disso, é preciso ouvir sem pré-julgamentos. É importante que um moderador saiba deixar de lado as opiniões pessoais na hora do teste e esteja atento e aberto ao que o participante tem a dizer. O moderador que se estabelece como uma pessoa empática está mais apto a entender como os participantes pensam.

Dessa forma, é criada uma relação mais fácil com o participante e isso pode ser bastante valioso para fazer perguntas sobre detalhes do teste e obter respostas mais profundas sobre o que foi feito e o produto em estudo.

Ouça e entenda as ações e emoções que os participantes estão transmitindo durante o teste sem julgamentos.

Ser um bom comunicador

Ter uma boa comunicação é vital, porque você precisa passar as informações para os times de desenvolvimento, os observadores, os participantes e quem mais estiver envolvido na criação do produto e necessitar desse conhecimento. A comunicação oral é importante porque ela vem junto com o poder de persuasão, que é essencial para mostrar o quão importante aqueles resultados descobertos serão para o sucesso do projeto.

Além disso, ter uma boa comunicação escrita também é imprescindível, pois ela serve para gerar bons relatórios e fornecer acesso à informação coletada para as pessoas que não estiveram presentes nos testes. Tais relatórios funcionam como um guia de acertos e erros, insights do projeto que podem ser consultados a qualquer momento. Os relatórios acabam sendo atalhos para descobrir o que já foi feito, o que pode ser aproveitado e o que não pode ser repetido no produto.

Aceitar a ambiguidade

Como os próprios autores disseram: “A usabilidade não é uma ciência precisa que consiste em fórmulas e respostas 8 ou 80.” É natural que os resultados possam ser conflitantes, imprecisos, ou ambíguos. É necessário ter paciência e persistir na descoberta de padrões e não culpar os participantes pelas escolhas que eles fizeram durante os testes.

Ser organizado e saber coordenar

E, por fim, para um teste de usabilidade acontecer, há várias etapas: definir qual é o tipo de perfil que vai participar do teste, recrutar as pessoas, definir os objetivos do teste e as tarefas que serão necessárias para avaliar o problema, ter ideia do tempo de cada sessão, avaliar se os equipamentos estão funcionando bem… tudo isso acaba sendo responsabilidade do moderador, o que exige que a pessoa saiba organizar as atividades e também repassar algumas para os outros envolvidos.

Além de tudo isso, para ser um bom moderador também é necessário praticar bastante. Somente no dia-a-dia é que vamos aprendendo a lidar com os imprevistos que acontecem. Quanto mais praticamos, melhores nos tornamos naquilo que escolhemos fazer.

Observe como outros moderadores fazem. Uma boa forma de iniciar nos testes de usabilidade, é ser o observador das sessões. Você acabará aprendendo como fazer por observar como a sessão acontece.

Se tiver a oportunidade, peça para pessoas mais experientes lhe guiarem e ajudarem a enxergar pontos de melhoria que você não esteja identificando em si mesmo na hora da moderação. E, se estiver iniciando sozinho, tente refletir depois das sessões quais foram as suas oportunidades perdidas, em qual momento você poderia ter feito mais perguntas ou ficado em silêncio para coletar mais informações, por exemplo.

Espero que esse artigo tenha lhe ajudado a identificar as características que você já tem e quais você ainda precisa trabalhar para ser um excelente moderador.

Até logo! 😊

--

--