Por que é importante pensar em modelos mentais nos processos de produto

Haida Martins
SiDi Design
Published in
6 min readNov 23, 2023
Créditos: Bing Image Creator

Quando comecei a escrever sobre modelos mentais, mudei o rumo do texto algumas vezes, na tentativa de entender de onde vinham os problemas que enxergava terem relação. No início, pensei que aconteciam por causa de lacunas na pesquisa com o usuário, mas percebi que esbarravam em outras etapas igualmente fundamentais do processo.

A questão é que pensar em modelos mentais é entender padrões e elaborar soluções para muitos desafios. Isso não é só algo teórico e pode nos ajudar a avaliar recursos do projeto, processo de Design, comunicação e estratégias a partir do alinhamento das respostas que encontramos.

Neste artigo, exploraremos a influência dos modelos mentais nos processos e por que é vital considerar não apenas os modelos mentais dos usuários, mas de todos os envolvidos também.

O que são modelos mentais?

São representações internas que as pessoas têm do mundo ao seu redor, incluindo como elas percebem, interpretam e interagem com as informações.

Modelo também é um sinônimo para representação mental. Em Design, pensar sobre os modelos mentais dos usuários ajuda a ter escolhas mais assertivas sobre o que é esperado por eles na experiência com um produto.

A escritora e estrategista Indi Young diz que “criar alguma coisa requer que você entenda profundamente o que uma pessoa quer fazer”. Para isso, ela propõe o uso dos modelos mentais:

To create a mental model, you talk to people about what they’re doing, look for patterns, and organize those patterns from the bottom up into a model.

É por isso que no processo se utilizam ferramentas de organização de padrões como mapas de empatia, jornadas de usuário e diagramas de afinidade, por exemplo. Essas ferramentas estruturam e alinham as informações que temos sobre o usuário.

O que pode acontecer se não pensarmos sobre isso?

Quando desenvolvemos funcionalidades sem ter clareza do que o usuário quer fazer, é provável que faltem partes da solução para que ele consiga concluir a tarefa. No pior cenário, ele não vai procurar outros meios de fazer isso dentro do produto, podendo abandoná-lo.

Com o tempo, não pensar nos modelos dos usuários por trás das funcionalidades pode afetar a evolução de um produto, fazendo com que elas possam parecer desconexas e sem coesão entre si.

Pensar em modelo mental é também entender o vocabulário que esses usuários utilizam, e é provável que a escolha equivocada de alguns termos também prejudique o entendimento da solução.

Esses são apenas alguns exemplos de riscos que envolvem quando não se questiona e estrutura as reais motivações dos usuários. Por isso, é importante tomar mais tempo para refletir sobre o que está sendo feito e diminuir os riscos.

Mas modelo mental não é só do usuário…

No processo de produto, isso é mais complexo porque significa refletir sobre todos os envolvidos, desde como cada um vê como uma problemática vai ser resolvida, além de expectativas, requisitos definidos, o que será priorizado, a estratégia de execução e assim em diante.

Pensar sobre modelos mentais é uma prática contínua ligada à descoberta do produto — é importante revisitá-la à medida que se produzem mais insumos, já que o entendimento sobre usuário e produto fica mais complexo. Isso leva em consideração o engajamento e a colaboração do time e, para unificar o entendimento de todos, cabe fornecer momentos para questionar e estruturar informações em equipe.

Outro desafio nesses processos está na comunicação entre os envolvidos, pois, ao mesmo tempo em que é uma troca que traz crescimento por lidar com visões e áreas diferentes, às vezes é inevitável surgirem bloqueios simplesmente porque cada pessoa pensa de forma diferente.

Às vezes, analisar de forma mais sistemática como está sendo conduzido um processo pode ser a única forma de resolver barreiras que não conseguimos entender. Refletir sobre os canais de comunicação e a linguagem utilizada, mas também sobre responsabilidades, a maneira de entregar valor, como coletamos os feedbacks e como está sendo o processo de desenvolvimento e as abordagens são maneiras de estruturar essa visão.

Podemos ir ainda mais além e refletir sobre setores da indústria e seus viéses. A natureza ágil e experimental de alguns projetos é importante para a inovação, mas às vezes pode trazer a sensação de que tudo está sempre sujeito a mudanças, além de que, às vezes a pressa não considera o tempo necessário para que se possa refletir mais profundamente sobre o que está sendo feito.

A prática leva à perfeição, e lidar com os modelos mentais dos envolvidos trará insights sobre como adaptar o caminho. Cabe ao time discutir, estudar e testar modelos para melhorar as trocas, o planejamento e a execução do processo. O importante é ter em mente que o sucesso do projeto depende da colaboração de todos e, para isso, precisamos de apoio contínuo.

Por fim, recapitulo e acrescento algumas dicas que considero importantes para o caminhar de um projeto, que têm relação e também vão além de pensar em modelos mentais:

  1. Seguir a perspectiva do usuário. É básico, mas sempre importante conscientizar o projeto para que esteja orientado pela experiência que o usuário tem, partindo de questões como: o que o usuário quer fazer e o que está conseguindo fazer no produto?
  2. Revisar e fazer retrospectivas de processo e funcionalidades. Para identificar onde estão os gaps, é preciso parar e considerar momentos para refletir, ver o que está funcionando e propor os próximos passos, considerando ter esses rituais periodicamente.
  3. Questionar suposições equivocadas e viéses. Com cuidado ao questionar, podemos analisar os argumentos por trás dos requisitos. Muitas vezes, não pensar com profundidade no que foi definido pelo cliente é o que traz decisões arriscadas. Para que isso ocorra sem travas, é importante garantir que os requisitos estejam claros e, por isso, revisados.
  4. Ouvir e manter um diálogo aberto. Utilizar uma linguagem comum a todos e discutir sobre os problemas, considerando as vulnerabilidades do processo e da equipe é essencial, além de terapêutico. Além disso, contar com apoio ao estruturar processos e abordagens é a certeza de ter outras opiniões além das nossas.
  5. Criar modelos para solucionar problemas. Unir esse estudo ao ponto anterior para conseguir tirar o máximo de todas as etapas e reuniões, entendendo como organizar as informações, por exemplo, pode ser um grande aliado da comunicação para alinhar insumos.
  6. Mostrar o trabalho que está sendo feito. É importante mostrar ao time e clientes que há um processo com etapas definidas e resultados, sempre identificando a melhor forma de entregar esse valor de acordo com o que esperam receber.
  7. Focar nas necessidades reais. Às vezes, as falhas de comunicação podem confundir o que devemos fazer ou priorizar, por exemplo. Focar em compreender o que usuários e stakeholders precisam é o que deve ser priorizado pelo time, para que sejam definidas estratégias e ferramentas que vão facilitar esse entendimento.
  8. Manter um histórico de mudanças acessível e transparente. Documentar insights, negociações, mudanças e razões por trás delas é um artifício importante para garantir que tudo está sendo feito conforme foi discutido. Ter esses registros é pensar em facilitar o trabalho depois.
  9. Adaptar-se continuamente. É importante ser flexível com as mudanças que ocorrem nesse processo e sabemos que são muitas, por isso, preparar e adaptar como estamos lidando com o trabalho é importante à medida que mais informações chegam.

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Agradeço aos times dos projetos do SiDi com os quais colaborei em 2023 pelas experiências que me fizeram crescer, as trocas e os aprendizados que vivenciamos juntos. É muito gratificante ver nossos avanços. E ao time de Design pelos insights que sempre trazem a respeito desse e outros temas importantes no dia a dia. Em especial à Ingrid e Marcela pela troca de ideias, ajuda com a organização e revisão do texto.

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Referências

MWALO, Munyala. The unspoken influence of mental models in design. Linkedin, 2016. Disponível em: ttps://www.linkedin.com/pulse/unspoken-influence-mental-models-design-munyala-mwalo-. Acesso em: 22 de setembro de 2023.

GRILO, André. Entendendo os modelos mentais e compreendendo melhor os usuários. Medium, 2016. Disponível em: https://medium.com/ux-design-natal/entendendo-os-modelos-mentais-e-compreendendo-melhor-os-usu%C3%A1rios-7778f1fe4f24. Acesso em: 15 de setembro de 2023.

YOUNG, Indi. Mental models: Aligning Design Strategy with Human Behavior. New York: Rosenfeld Media, 2008.

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