‘O disco é fotografia da cabeça do artista’— Lukão e as gravações do Scalene

Processos e ideias pra compor um disco autêntico

Lucas Bellator
Silva Home Reads
5 min readDec 6, 2017

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foto por @stefanoloscalzo

Cante alto seus sonhos.

Em qualquer contato com a Scalene, essa é uma das mensagens mais claras que eles querem te passar. A banda formada por quatro caras de Brasília é uma das expoentes do movimento independente que correu silenciosamente pelo país há anos. Agora esse movimento vem gradativamente saindo da caverna e tomando seu merecido espaço em Rock in Rios da vida, lotando casas, e fazendo sua devida marca na música brasileira.

Cante alto seus sonhos.

Em agosto de 2017 a Scalene lançou magnetite, o quarto disco em uma carreira que já se estende ao longo de 8 anos e se discorre por quatro álbuns, alguns eps e um DVD gravado em Brasília. Esses últimos anos têm, finalmente, trazido a evidência merecida ao trabalho artístico deles, com oportunidades para que a banda se apresentasse em palcos enormes, para plateias gigantescas.

Conversei com o Lukão, baixista da banda de música Scalene, com o intuito de abrir um panorama do processo de composição que fundamentou todos os discos.

“Fazer um disco, pra mim, significa tornar real um pedaço da cabeça do artista/músico/banda. É como se fosse uma fotografia da nossa mente e do nosso coração naquele momento”, Lukão disse de primeira. “Às vezes, isso é relevante pra muitas pessoas por muito tempo; outras vezes, é algo passageiro.”

Pré-produção e a hora de aparar arestas

“Nossa etapa pra criação e produção de um disco começa praticamente assim que o disco anterior foi gravado.” O disco anterior da Scalene, pra quem não conhece, é o Éter, lançado em 2015.

“Pescamos ideias ou intenções que não foram usadas no último trabalho e vamos lapidando ao longo do tempo. Daí começam a surgir algumas composições, algumas influências novas que despertam ideias diferentes. Então vamos amadurecendo e fomentando ideias, até termos tempo e disposição de começar a compor formalmente. Geralmente falta muito do primeiro e sobra do último.”

“Assim que iniciamos o processo de compor juntos uma música da banda, é o momento de cada um colocar o que veio desenvolvendo ao longo desse período. Mesmo que a composição surja de um ou outro integrante, nessa hora cada um cria seu vocabulário e a forma que vai ‘contar’ essa dita música.

Assim que se encerra a composição, entramos em pré-produção, onde aparamos todas as arestas e deixamos a música de fato pronta pra ser gravada. É um processo cansativo, mas importante para internalizarmos as músicas e alinharmos nossos cérebros entre nós. É o que fazemos para gravar o disco da melhor maneira possível.

Pro magnetite, fizemos 3 rodadas de prés antes do disco, algo inédito pra nós. Gravamos em estúdio, no Red Bull Station em SP. Bem diferente do esquema de home studio que estávamos habituados. Mudar a forma de gravar também proporciona um aprendizado, porque lidamos com situações diferentes a cada novo trabalho.

Acho que as maiores evoluções tem sido as contribuições de todo mundo no processo e a maior liberdade que cada membro tem pra explorar e experimentar dentro da musica. Na Scalene, temos gostos musicais diversos e, a cada novo trabalho, conseguimos colocar mais da nossa cara em cada música. Evoluímos muito no processo de gravar.”

O ‘onde’ faz diferença?

“Essa foi nossa primeira experiência em gravar um álbum todo em um estúdio. Acho que a principal diferença que isso acarretou no processo todo foi de termos nos programado pra fazer uma pré-produção maior e mais bem feita.

Gravando em casa você tem o luxo do tempo. Pode testar coisas a vontade e dar mais tempo para a criação DURANTE o processo de gravação. Em estúdio o tempo, ou os dias, são contados. Então essa parte da experimentação precisa ser feita antes de iniciar a gravação.

Certas coisas demandam mais tempo para explorar e isso não impediu que fossem feitos improvisos na hora, no estúdio, enquanto gravávamos. Mas com certeza deixamos menos coisas a serem decididas de última hora.

Fora isso, o Red Bull Station é super espaçoso, confortável e conta com um equipamento muito bom. Nos home studios que gravamos anteriormente, também contávamos com equipamentos bons, mas lá na Red Bull tínhamos coisas diferentes do que estávamos habituados. Uma console cabulosa, pré amplificadores e microfones diferentes. Foi legal usar tudo isso pra expandir o que já tínhamos feito.”

Transformar o disco em performance

“Depois do CD gravado, passamos por um período de reaprender as músicas. Voltamos pro estúdio e ensaiamos tudo de novo. Alguns arranjos surgem durante a gravação, outros são tocados um pouco diferente.

Às vezes, o Gustavo gravou um riff que é mais foda de tocar e cantar. E aí o Tomas precisa aprender pra gente executar ao vivo. É como se aprendêssemos as músicas do zero.

Dito isso, ainda temos que descobrir onde essas músicas novas se encaixam no set, se os sons integram bem com músicas antigas, se alguma deve ficar mais para o começo ou para o fim do show. Parece algo muito fácil, mas exige um pouco de atenção.

A banda em tour pelo Rio Grande do sul com o disco Éter

“Com o tempo, vamos dominando a performance e fazendo leves alterações nos andamentos, nas interações com o publico, na dinâmica do show para a tour. Depois que já tocamos elas há um ano, as músicas ficam com uma cara diferente do que foi gravado ou do que tocávamos no inicio da turnê.

E isso é muito massa.”

E a tour segue…

“Não se apegue a querer fazer uma puta produção com um mega produtor renomado”, o Lucas recomenda a quem for gravar discos. “Não se apegue a estúdio absurdo, participações especiais ‘de luxo’ e etc.

Se tiverem a oportunidade de fazer tudo isso logo de cara, mandem ver. Mas não foquem nisso, se essa oportunidade não existir.

Gravem as melhores músicas do jeito que quiserem e apostem no próprio talento. Assim se aprende muito mais. O disco vai ficar mais autêntico.

E por fim, você vai ver que toda essa estrutura não contribui tanto para um resultado final que vá fazer a diferença no mercado pro seu trabalho.”

A Scalene segue em tour pelo magnetite. Do Rock in Rio aos shows recentes, em Toronto. A banda hoje não necessita depender só do independente com distribuição assinada com o selo slap da Som Livre. A Slap Música está para completar 10 anos e conta com muitos nomes legais, como Maria Gadú, Silva, Céu e mais, em um contínuo fortalecimento da cultura musical.

Ouça as músicas, compareça nos shows e fortaleça mais esse fresco movimento do rock brasileiro. Vem coisa cada vez melhor aí.

Cante alto seus sonhos.

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