A Paris de Hemingway

Simonsen
Editora Simonsen
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3 min readNov 23, 2016

Um trecho do romance “Um Dry Martini para Hemingway”, por Fabio Pereira Ribeiro

— Por favor, o quarto de Ernest Hemingway. Reserva em nome de Antony Loui.

Assim começo meu desafio. E lógico, no Ritz. Depois, um dry martini no Bar Hemingway. Mas essa não é a Paris que quero descobrir. Quero descobrir o Hemingway de verdade, aquele que, quando pobre, escrevia, não tinha dinheiro algum e vivia feliz.

Quero descobrir a Paris onde Hemingway viveu, andou, respirou, inspirou, se drogou com os seus pileques e, como se relacionou com diversos artistas e personagens únicos de uma cidade única. Será que as inúmeras discussões sobre o tamanho fálico entre Hemingway e F. Scott Fitzgerald foram resultados de pileques ou de proteção quase apadrinhada de Ernest em relação a Scott? Ou pela própria loucura de Zelda em relação a Scott?

— Um dry martini, no shaking, por favor! — peço ao barman.

— Pois não. De onde o senhor é?

— Brasil.

— Apreciando a cidade?

— Procurando Hemingway (risos).

— Ele sempre está aqui. — fala o barman enquanto prepara o drink.

— Ah, é?

— Sempre, todas as noites neste balcão. Suas histórias e sentimentos permeiam este ambiente.

— Interessante. Que horas ele costuma aparecer?

— Sempre às oito.

— Sozinho?

— Nunca, o senhor Hemingway nunca está sozinho.

— Com quem ele sempre está?

— Com a “sua” imaginação.

De uma vez por todas, eu precisava de um dry martini bem forte, pouco vermute, bem seco. Será que o barman estava tirando um sarro de mim? Barman é uma figura interessante. Antes de você ficar bêbado, já sabe da sua necessidade e opinião. Bom, precisava focar no meu desafio. Mas por onde começar? Pelas ruas ao redor da Université Sorbonne? Ou explorar os milhares de bares dos quais Hemingway desfrutou na cidade luz?

Depois daquele drink, meu desafio começava. As ruas de Paris me chamavam e sua própria luz me incentivava. Paris tem uma alma diferente de qualquer outra grande cidade. Suas ruas, becos e grandes avenidas mostram uma história do presente com o passado que nunca foi embora. O passado permeia cada porta, cada bar, cada evento que fazem da cidade uma verdadeira luz para os nossos desesperos. E o mais interessante, Paris me faz pensar no passado: em todas as coisas que vivi, em todas as músicas que dancei, em todas as mulheres que amei, em todas as alegrias que realmente senti, Paris sempre será única.

Naquela pobreza dos anos 20, Hemingway vivia feliz em Paris. Tinha que vender o almoço para ter o jantar, mas era feliz. Que felicidade era essa? Mesmo com o seu infeliz primeiro casamento com Hadley, Hemingway construía uma Paris diferente, uma literatura para toda vida. A cidade tem um espectro de iluminação e inspiração. Suas luzes são janelas que mostram além do necessário. Paris tem uma vida diferente de todas as outras cidades que já conheci, e entender esse ar inspirador que tanto fez parte da obra de Hemingway é o meu grande desafio.

Fabio Pereira Ribeiro é administrador, oficial do Exército Brasileiro, especialista em Inteligência Estratégica e em Política Internacional. Viajou o Brasil e o mundo ministrando aulas. É um apaixonado por Paris e por toda a obra de Ernest Hemingway. Este é seu quarto livro; seu primeiro romance.

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