A importância da crítica de mídia e a participação dos internautas nas pautas raciais

A responsabilidade coletiva é um dever jornalístico e de toda a sociedade

Jacyferrnandes
singular&plural
4 min readDec 17, 2022

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Por Jacy Fernandes

No tecido de construção social da realidade, é possível considerar o combate ao racismo e a postura antirracista responsabilidades coletivas da sociedade, além de um dever do jornalismo engajado na atualidade.

A reportagem escrita por Jeff Benício, do site Terra, com o título “Globonews volta a debater racismo só com jornalistas brancos”, é uma crítica de mídia importante e consciente, escrita de forma responsável, na qual o autor analisa o problema ao observar que no programa exibido pelo canal os comentaristas escalados para debater o racismo estrutural e a rotina de preconceito eram todos jornalistas brancos.

Reprodução: GloboNews

Segundo Sílvio de Almeida, professor-doutor e autor do livro O que é racismo estrutural?, em entrevista à TV Boitempo, ele diz que o racismo estrutural é uma violência de discriminação direta contra uma pessoa negra, que ocorre de várias maneiras, ou seja, quando ela é impedida de entrar em alguns ambientes e até mesmo quando recebe um salário inferior, por exemplo.

Almeida destaca que, para compreender o racismo estrutural, é importante entender que não é uma patologia social ou uma anormalidade para quem o pratica, porque uma das principais características desse comportamento é a “normalidade” não somente de ações conscientes, mas também inconscientes que constituem os modos da estrutura social.

Jeff Benício, autor da reportagem, exemplifica em seu texto esses problemas e os seus impactos na mídia, ao fazer a crítica sobre a falta de representatividade preta no debate do programa “Em Pauta” da Globonews, e enfatizou que para abordar essa pauta é necessário a presença de quem vive o racismo todos os dias, isto é, jornalistas e estudiosos negros. Além disso, ele também faz uma crítica ao programa por mostrar de forma explícita as reproduções do racismo estrutural em outras escolhas editoriais e de programação.

Benício também ressalta a contradição da redação ao mencionar que a fala feita sobre os casos vieram de pessoas brancas e criticou o programa por repetir os mesmos erros cometidos sobre pautas raciais, como quando sete jornalistas brancos, em edição de junho de 2020, trataram do preconceito durante os protestos antirracistas pela morte do norte-americano George Floyd. “Rapaziada, a pauta agora é racismo”, anunciou o apresentador Cosme aos colegas, fazendo com que a temática retornasse ao seu foco, que está se dispersando. Os jornalistas do programa criticaram a discriminação racial no Brasil, na ocasião.

Benício também questiona na reportagem a ausência de representatividade para debater um problema histórico e analisa como o tema foi abordado, apenas por jornalistas brancos que não vivem o dia a dia do sentimento racial das pessoas pretas expostas à discriminação, ou pelo fato de terem a sua expressividade anulada por critérios raciais. Além disso, faz uma crítica direta ao mencionar: “Faltou memória a quem escalou os comentaristas do ’Em Pauta’ quase 2 anos após vexame por falta de representatividade negra”.

Jeff Benício também questiona que jornalistas negros poderiam falar sobre o episódio do entregador negro Yago Correa de Souza, de 21 anos, que foi preso após sair de uma padaria, e destaca, novamente, que o racismo estrutural tem de ser debatido por pessoas negras, pois só elas vivem na pele o racismo todos os dias, evidenciando que, em tese, trata-se de uma questão simples escalar a representatividade nas mídias.

Por fim, a reportagem faz uma crítica à pauta e uma análise do problema atual e histórico do racismo estrutural, numa abordagem da temática de um ponto de vista cotidiano e emergente na sociedade. As colocações de Benício se mostram de suma importância porque não apenas questionam a presença de jornalistas brancos em um debate sobre o racismo estrutural e o preconceito, mas também “denuncia” o tratamento dessa pauta pela edição do programa.

Debater o racismo de maneira responsável é uma responsabilidade coletiva e, principalmente, da prática jornalística. O autor também destaca as críticas do público e a importância da participação dos internautas que estão cada dia mais atentos às pautas raciais, o que fez a GloboNews se retratar e escalar para o programa do dia seguinte jornalistas negros da emissora, mostrando como a interação social é fator mobilizador na mídia, sobretudo as redes sociais.

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