Devorados pelo dinheiro

Anderson Teixeira Barros
singular&plural
Published in
4 min readMay 29, 2018

Existe um esquema, alimentado pelas indústrias, para controlar como você se alimenta?!

​Por Anderson Teixeira

Nos últimos meses venho estudando um pouco mais a fundo a poderosa indústria da carne brasileira. Desde o dia em que comecei a pesquisar sobre esse assunto, já pensei em me aprofundar e desenvolver meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) baseado nesse tema. Entretanto, nele eu não posso (nem quero) exibir as minhas opiniões e conclusões acerca do tema, por isso esta crítica tanto me interessa.

Primeiro, é importante se conhecer alguns números desse setor. Por ano, só em nossa querida pátria amada, 6 BILHÕES de animais são sacrificados para serem direcionados aos freezers de supermercados e açougues brasileiros e para serem enviados para os nossos irmãos de raça em todo o mundo. Isso é o equivalente a 28x a população do Brasil. Em dólares, essa indústria arrecada cerca de 137,6 bilhões por ano, isso é o dobro do que o segundo setor alimentício (o dos chás, cafés e cereais) arrecada.

Com esses dois dados temos uma visão de que este é um setor gigantesco (é preciso um grande mecanismo para sacrificar uma quantidade tão exorbitante de animais) e extremamente lucrativa (o valor arrecadado representa 23,5% do PIB nacional). Mas o que me impressiona ainda mais é o impacto que ele traz ao meio ambiente. Segundo dados da plataforma Water Footprint, para se produzir um quilo de carne é necessário mais de 15 mil litros de água. O Cerrado atinge níveis alarmantes de desmatamento à medida que o agronegócio avança pela região central do país. A Amazônia perdeu mais de 4 mil quilômetros de sua área, em 2017, devido ao avança de monoculturas e do agronegócio na região, os dados são do Governo Federal (!!!) e mais de 60% da soja cultivada, grande responsável pelo desmatamento amazônico e do Cerrado, é destinada ao exterior, para suplementar a alimentação de gados, porcos e aves.

Infográfico da devastação da Indústria da Carne (Arte: Anderson Teixeira)

Toda essa enxurrada de números já o suficiente para impactar qualquer um, mas eu estou escrevendo este texto para falar sobre outro incômodo que tudo isso despertou em mim: a negligência a esses dados, e o pior, o que desconfio ser o motivo dessa negligência. O impacto apresentado pelas indústria das carnes é uma forte credencial para que nos atentemos ao fato de que ela é a maior vilã quando o assunto é preservação do meio-ambiente, mas ela não é tratada desse modo na formação estudantil e, muito menos, pela mídia tradicional.

Não defendo uma imprensa militante, que ao bradar pelo imparcialismo acaba tornando-se mais tendenciosa que as demais. Entretanto, a não-abordagem ou a abordagem rasa das consequências socioambientais que a indústria da proteína animal trazem, fazem com que o sinal de alerta seja ligado para entender os motivos, que parece obvio.

Em um mundo no qual, cada vez mais, as relações e a identidade pessoal são estabelecidas pelo poder aquisitivo, a máxima: “quem pode, pode. Quem não pode, se sacode”, vale mais do que nunca, e a imprensa é sacudida interminavelmente pela falta de recursos próprios. Assim ela vem sendo feita de fantoche pelos grandes empresários, como uma questão de sobrevivência.

Touro Bandido, aquele que ficou famoso ao contracenar com o ator Murilo Benício na novela “América”, exibida em 2005 (Foto: Divulgação/TV Globo)

Em resumo, é um verdadeiro jogo de manipulação: as grandes empresas mídiaticas são manipuladas pelas grandes empresas econômicas, enquanto o povo recebe uma informação blindada, que não demontra a nocividade da indústria da carne para o meio ambiente, por exemplo.

É comum assistirmos a programas como o Globo Ecologia, que mostra inúmeros projetos inovadores em meio ambiente, mas sempre com o foco em reduzir o gasto de água e energia em processos de cultivo ou mecânicos. Nunca se fala em uma readequação da dieta humana, com conscietização dos impactos trazidos por uma indústra agressiva e devastadora, como a liderada por JBS e BRF.

São por esses e outros motivos que as produções independentes, menores, se destacam aos olhos dos apreciadores do bom jornalismo (vide a matéria “Vida de Gado”, da Repórter Brasil). Apesar de se limitar a um crescimento mais lento e e menos popular, a liberdade que os veículos nanicos tem para escrever é fundamental quando se fecha a conta do jornalismo social e do jornalismo de publicidade velada.

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