Efeito Caleidoscópio: a mídia e o fenômeno Pink Money

Lucas Berti
singular&plural
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4 min readNov 22, 2018

Por Julia Abud, Lucas Berti e Victória Johanna

(Reprodução/Max Pixel)

O brinquedo ganhou popularidade entre adultos e crianças nos anos 60. O modo de usar o caleidoscópio se assemelha ao manuseio da luneta. No entanto, sua proposta é completamente divergente do aparato usado para observar as constelações. Contra a luz, ao olhar-se para dentro de um caleidoscópio, uma imagem colorida é exibida. No menor movimento do objeto, essa imagem é alterada. Cheque outra vez e, a cada novo olhar, uma nova imagem irá se formar.

A descrição acima serve para edificar uma metáfora capaz de descrever nosso comportamento frente aos veículos de mídia atualmente. Um mesmo insumo gera manchetes construídas sobre diversos ângulos. Dentro de uma análise superficial, a metáfora pode apresentar uma visão positiva da mídia: já que a cada novo olhar observa-se uma nova perspectiva, o produto desse fenômeno deveria ser uma mídia pluralizada e bem abastecida de informações.

Deveria, no pretérito imperfeito. Cada novo olhar para manchetes e textos que abordam um mesmo fato é capaz de revelar a presença de ingredientes pouco palatáveis a uma sociedade que procura informação: abstenções, interesses e olhares despidos de qualquer senso crítico.

A ascensão do termo Pink Money e a forma como ele vem sendo retratado (ou não) por jornais e portais evidencia essa contaminação da informação. A expressão em inglês surgiu para descrever o aproveitamento, por parte das marcas,do poder de compra do público LGBTQ+ — em especial dos gays — que supera em 30% o público heterossexual.

(Reprodução/Pixabay)

A presença do termo não é regular na mídia. Com uma breve busca, é possível afirmar que apenas um artigo da Revista Híbrida explorou com profundidade o conceito de Pink Money.

Contudo, também é possível notar que grandes manchetes fazem uso de termos que mais servem como publicidade do que como informação. Isso porque apenas um lado da história está sendo contado pela grande mídia, que se afirma como jornalística: o lado das grandes marcas.

Certo que o jornalismo, em sua raiz, deve ser isento de opiniões, neutro, imparcial. Mas se apenas uma face dos fatos está sendo explorada e exibida com máscara de notícia, ele tampouco está cumprindo seu papel, seja como informativo ou social.

Grandes nomes, que antes não se importavam ou até desrespeitavam os movimentos “minoritários”, agora marcam presença em títulos que os declaram como apoiadores da diversidade e da inclusão.

(Reprodução/Wikipedia Commons)

Esse fenômeno acontece por um motivo simples e fácil de se notar: o posicionamento vende — e o dinheiro que se arrecada nessa venda é o chamado Pink Money.

Se na década de 90 e início dos anos 2000, a moda era ser sustentável e defender as causas ambientais, hoje o que faz sucesso no mercado é a luta LGBTQ+.

Portanto, não é mais estranho saber que a PepsiCo. lançou uma versão colorida — como é conhecida a “bandeira gay” — de um dos seus produtos mais famosos: o Doritos.

Também não assusta mais descobrir que a Skol, que inegavelmente carrega um histórico de comunicação sexista e despreocupada com causas sociais, passou, não só a apoiar, mas a ser patrocinadora da Parada do Orgulho LGBT, que ocorre desde 1997 em São Paulo.

Doritos Rainbow (Divulgação/PepsiCo)

Há quem interprete isso como uma coisa boa, já que, de uma forma ou de outra, a visibilidade para uma parcela ainda oprimida da população é garantida.

Porém, há uma parte nesse sistema que, definitivamente, só pode ser visto de forma negativa: o motivo para não ficarmos mais espantados ao ver que a mídia jornalística não procura transmitir informações de interesse público, muito menos emitir críticas. Na nova Era, ela só busca por cliques. E nós nos acostumamos com isso.

Referências

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Lucas Berti
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Repórter no Opera Mundi e independente no Da Fronteira Pra La | Jornalismo internacional com foco em América Latina