Estadão e o editorial de como manipular

Luciano Lourenço Neto
singular&plural
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3 min readNov 9, 2017

A grande mídia ignora os verdadeiros problemas do trabalhador brasileiro e coloca a culpa no proletariado

Por Luciano Lourenço Neto, Giovanni Antonelli e Gustavo Oyadomari

Que a grande mídia funciona como um pilar dos governos que agem de acordo com seus interesses comerciais não é desconhecido. A imprensa brasileira é, de fato, em sua grande maioria, conservadora, ultrapassada e afastada de sua raiz nos princípios básicos do jornalismo. Assim sendo, sua visão egoísta manipula, cega e deturpa os leitores, sem que a maioria deles ao menos perceba.

O país vive uma grande crise econômica e política. Oligarcas posam em frente às câmeras como salvadores da pátria — “é melhor Jair se acostumando” — com o discurso de que querem o melhor para o país. Pois esse país parece ser um pedaço retangular 100% couro e seus inúmeros dígitos em contas bancárias.

Na mesma mão, a grande mídia ignora os verdadeiros problemas do trabalhador brasileiro e, assim como o lema do governo federal de “não pense em crise, trabalhe”, coloca a culpa no proletariado. É exatamente isso o que fez o Estadão — mais uma vez ele — em seu editorial do dia 5 de novembro deste ano.

Intitulado “Universo Paralelo”, o veículo critica as demandas dos servidores públicos por reajustes salariais e reivindicações de seus direitos, alertando que a máquina estatal depende do pagamento de impostos e que eles “não brotam da terra”. Ainda exemplifica sua crítica com o caso da ministra dos Direitos Humanos, que, segundo o texto, “aufere todo santo mês R$ 30.471,10, Luislinda Valois quer receber também o salário integral de ministra, de R$ 33,7 mil, e não os R$ 3,3 mil que ganha em razão do teto salarial.”

Há, ainda, fala direta do ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, alegando que os reajustes não cabem no orçamento. Mais abaixo, no mesmo parágrafo, há fala indireta de Rudinei Marques, presidente do Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas de Estado, e que, segundo ele, os sindicalistas “partirão pra cima”.

Considerando os padrões de manipulação da mídia, como colocado por Perseu Abramo, no livro Padrões de manipulação na grande imprensa, há um nítido exemplo de ocultação quando O Estado de S.Paulo omite do texto que os grandes bancos, como Bradesco, Bancesa e Caixa Econômica Federal, juntamente com outras 17 empresas, dentre elas as Prefeituras de Guarulhos e de São Paulo, e também institutos de educação como o Mackenzie, representam 3% das companhias que possuem 63% da dívida previdenciária, segundo reportagem da Carta Capital.

Além disso, segundo reportagem do G1, o governo do presidente Michel Temer perdoou dívida de R$ 10 bilhões de grandes ruralistas. O valor foi confirmado pela própria Receita Federal. Percebe-se, portanto, que há também o padrão de fragmentação da realidade, pois selecionam-se os aspectos a serem informados ao leitor em detrimento da contextualização dos fatos.

O editorial é, de fato, informativo, mas inverte-se a opinião pela informação para, assim, defender com unhas e dentes o lado pró-governo, por meio do distanciamento de princípios básicos do jornalismo, como a pluralidade.

Como os padrões de manipulação se sustentam um nos outros, a combinação de todos esses induzem o leitor a enxergar a versão do fato como o editorial quer, olhando para apenas um lado de um grande e perigoso cruzamento.

É antiético, perigoso e inescrupuloso que O Estado de S.Paulo coloque em prática um jornalismo de tão baixo nível. Desaponta, mas não surpreende. A busca por informações que completem um fato fragmentado é importante para a compreensão em plano geral. É, contudo, muito mais fácil formar opiniões a partir de fontes ditas confiáveis e que levantem menos questionamentos. E a grande imprensa sabe bem disso.

Fontes

https://www.cartacapital.com.br/economia/reforma-da-previdencia-ignora-426-bilhoes-devidos-por-empresas-ao-inss

https://g1.globo.com/economia/noticia/governo-abre-mao-de-mais-de-r-10-bilhoes-com-alivio-de-dividas-de-ruralistas.ghtml

http://opiniao.estadao.com.br/noticias/geral,universo-paralelo,70002072179

Bibliografia

ABRAMO, Perseu. Padrões de manipulação na grande imprensa. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2003.

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