Menino Henry: influência da cobertura jornalística nas decisões de autoridades
Como a mídia repercutiu e influenciou nas investigações da morte do menino de 8 anos, além das decisões da juíza responsável
Por Eduardo Saraiva, Felipe Andrade e Gabriel Monteiro
No dia 8 de março de 2021, o menino Henry Borel, de 8 anos, deu entrada no Hospital Barra D’Or. Pouco tempo depois, o menino foi dado como morto. Segundo o vereador carioca Dr. Jairinho (ex-Solidariedade) e a sua mãe, Monique Medeiros, Henry sofreu um acidente antes de entrarem no quarto do menino. Ele estava com dificuldades de respirar, com os olhos revirados e mãos e pés gelados.
O laudo médico do hospital indicou sinais de violência e confirmou a morte de Henry por hemorragia interna e laceração hepática como consequência de uma ação contundente. O caso rapidamente levantou as suspeitas da polícia e da mídia.
Nas semanas seguintes, novas informações foram chegando, como matérias de grandes mídias como o Fantástico. Desde laudos médicos até a expulsão de Jairinho do partido, a mídia ficou em cima em busca de respostas. Até o momento, as indicações são fortes o vereador e sua esposa, mãe do menino, que se tornaram réus no começo de maio.
O jornal Folha de S.Paulo foi um dos veículos que, assim como quase toda a mídia, também deu destaque ao caso. Em um levantamento feito na barra de pesquisa do site com a palavra-chave “menino Henry”, se contaram 67 reportagens desde o dia 18 de março. Foram analisadas três dessas matérias e percebe-se que a narrativa ficou sempre sob a suspeita do vereador e da mãe desde o princípio.
A primeira reportagem, datada de 18 de março, traz uma visão geral do caso. O texto é montado em cima da violência da morte de Henry e da contestação da versão oficial do casal. A todo momento, a dupla de jornalistas retrata Monique e Jairinho como antagonistas, mencionando, inclusive, o passado sórdido do pai do vereador.
Já a segunda matéria, publicada em 15 de abril, mostra a evolução das investigações e os depoimentos coletados. O texto enfatiza, gradualmente, a agressividade de Jairinho e a passividade de Monique, sobretudo com o depoimento de Rosângela, empregada da família. A narrativa é montada já com os possíveis culpados. Quase que um “spoiler” do que será o resultado do caso.
Já na terceira reportagem da Folha, do dia 7 de maio, o jornalista foca na decisão da juíza Elizabeth Louro de evoluir a prisão do casal de preventiva para temporária por tentativas de obstrução das investigações. O que chama a atenção no texto da decisão, e é destacado pela jornalista, é o papel da comoção popular na decisão. Na forma como isso é posto, o jornalismo se reforça como uma ferramenta ao lado da justiça.
Ao alinharmos a narrativa criada desde a primeira matéria, as motivações citadas pela juíza resultam em uma forte influência da mídia nas decisões das autoridades competentes. Por esse motivo, os profissionais devem ter sensibilidade para tratar de temas com forte apelo emocional.
Esse caso não é extraordinário para o jornalismo brasileiro. Com certa periodicidade, a mídia encontra uma história com potencial de chocar o país e destaca todos os desdobramentos. Geralmente, tratam-se de crimes passionais, como o caso da Isabella Nardoni em 2002, e mais recentemente com o menino Miguel em 2020.
O volume de notícias veiculadas extrapola dezenas de notícias e encharcam os portais de notícia, como exemplificado no caso analisado. Por esse motivo, é importante que o profissional atenha-se aos critérios e evite propagar informações sem real interesse público, como na reportagem sobre a mãe de Henry ser internada por questões de saúde, veiculada na Folha.
Outro ponto importante é a necessidade de manter o público informado sobre cada detalhe e acabar caindo em armadilhas. O caso mais emblemático de erros no jornalismo brasileiro é o da Escola Base. O delegado, com sede por publicidade, usou a mídia para alavancar o caso e induzir os comunicadores ao erro. A lição aprendida por essa situação ajuda, até hoje, nesse tipo de cobertura jornalística.