O grande espetáculo da notícia

Juliana Melguiso
singular&plural
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4 min readNov 22, 2018

Por Igor Néder Lopes e Juliana Melguiso

Respeitável público, qual a medida certa do apelo emocional para se fazer entender determinado assunto? (Foto: Marcin Krawczyk/Flickr)

Em tempos de mídia tendenciosa e até mesmo parcial, coberturas midiáticas (seja no impresso como em veículos televisivos) costumam ter abordagens que muitas vezes trazem informações erradas e confusas ao público. Mas isso parece ser feito conscientemente por parte de alguns meios, uma vez que a apelação noticiosa atrai mais público à medida que o sensacionalismo desenfreado se dissipa por aí.

Este mesmo sensacionalismo, por sua vez, possui certa importância ao estabelecer novos padrões editoriais que permitem, de certa forma, observar as reações humanas. O jornalismo de sensações, na medida em que distorce a exatidão dos acontecimentos e apela para a emotividade, consegue mostrar em sua ausência de credibilidade os vínculos e o despertar algumas das emoções mais próprias do ser humano.

O principal objetivo do sensacionalismo é priorizar notícias e situações que mostrem uma história que renda lucros — não só no quesito financeiro mas também no sentido de vendas e audiência — sem levar em conta a exatidão factual ou relevância das informações. Sendo assim, inúmeras notícias com alegações falsas são cobertas pela mídia, incluindo programas e jornais que divulgam livremente temas chocantes como a violência, devido a todo o apelo que esse tipo de tema tem sobre a população muitas vezes sem levar em consideração o impacto causado na sociedade, apresentando fatos distorcidos ou completamente modificados.

Relembrando casos antigos, o assassinato da jovem Eloá Cristina, de 15 anos, por seu ex-namorado Lindemberg Fernandes, de 22 anos na época, em outubro de 2008, é um exemplo típico que gerou uma espécie de “receita” para o jornalismo, seja ela particularmente “sangrenta” ou não. A participação da mídia nesse caso foi de total manipulação dos envolvidos e de quem os assistia, fazendo com que a manifestação popular interferisse diretamente no caso e fizesse com que telejornais e programas de pouca credibilidade entrassem como agentes diretos no desfecho do caso. É possível analisar a cobertura feita pela jornalista (será?) do programa A Tarde é Sua, Sonia Abrão, da RedeTV!, a qual mantinha diálogo com o sequestrador em diversos momentos a fim de extrair o máximo de visibilidade para si e não para a problemática em volta do caso.

Cobertura do caso Eloá no programa A Tarde é Sua, da RedeTV! (Outubro/2008)

Esse viés editorial nas mídias de massa mostra claramente o poder de manipulação que o mesmo pode ter sobre seu público e até mesmo àqueles que são alheios a esse tipo de informação, se tornando um “telefone sem fio” de alienação. Desde casos violentos até mesmo ações políticas duvidosas, a mídia tem o poder de dissipar aquilo que a beneficia e gera lucro em prol de seu bem maior.

Um exemplo mais recente do uso da tragédia como forma de se beneficiar é o incêndio ao Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro. O museu passava por condições precárias há anos (assim como nosso Museu do Ipiranga, seria esse o seu futuro destino?), mas nenhuma medida era tomada e havia mínima ou quase nenhuma manifestação da mídia em prol da preservação do local. Porém, com o incêndio que ocorreu no dia no dia 2 de setembro de 2018, inúmeros veículos estamparam em suas páginas principais a tragédia anunciada há anos.

Mesmo que a cobertura do Fantástico, da Rede Globo, tenha sido uma das coberturas mais completas do caso no dia, é possível observar como a linguagem do programa busca manipular o telespectador a continuar acompanhando no canal como forma de gerar credibilidade pelo mesmo e não pela perda inestimável que a cultura do país sofria naquele momento. Pessoas que tentavam salvar seus trabalhos eram abordadas, em meio ao desespero, para conversar e aquilo gerava ainda mais audiência para a atração.

É interessante perceber diante dessas manifestações midiáticas que as redes sociais vem ganhando cada vez mais força e são utilizadas também como meios de divulgação instantânea onde o apelo ao emocional muitas vezes atinge um público quase que em sua totalidade. O leitor se torna parte daquele fato, tocado diretamente no que tange seu lado mais humano e sentimental. Criando narrativas enviesadas disfarçadas de imparcialidade, essas matérias vão de encontro com a prerrogativa básica do jornalismo. E mais uma vez vemos aí aquilo que alguns chamam de “batalha de narrativas”.

Com a ajuda das redes que interligam os pensamentos do coletivo, as linhas teóricas utilizadas fazem refletir, quais são os verdadeiros significados da mensagem passada por esses veículos? A manipulação presente nas falas de ambos os casos visam mudar a percepção por meio de táticas desleais do público, usando meios exploradores e abusivos da situação e até mesmo desonestos. Tanto a linguagem como a manipulação se interligam, fazendo com que as pessoas encontrem significados pessoais para sugar ainda mais a tragédia.

A irresponsabilidade da imprensa talvez seja essa veiculação espetaculosa, onde assuntos importantes ganham frases e definições (a respeito da Lava Jato, por exemplo: “a maior operação anticorrupção do planeta”; “a operação que é elogiada pelos países desenvolvidos”; “número recorde de delações premiadas”; etc) que, de certa forma, não explicitam a preocupação com a consistência das denúncias. Desde o início da Operação Lava Jato, que investiga um grande esquema de corrupção na Petrobrás envolvendo diversos políticos e empreiteiras, uma onda de manifestações tomou conta das redes sociais, as quais têm um poder enorme de influenciar o comportamento individual e social. Contudo, é o que se vê na grande e velha mídia que direciona a opinião e entendimento do grande público. Se não fossem os telejornais mais populares com suas manchetes e destaques a respeito dessa grande operação, qual seria, de fato, o peso dela desconsiderando as adjetivações exacerbadas? Fica aí o questionamento.

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Juliana Melguiso
singular&plural

Futura jornalista, e apaixonada por cinema, que acredita que o mundo pode ser uma grande comédia romântica dos anos 80.