O jornalismo precisa se reinventar para não polarizar

Em fevereiro, Adrilles Jorge, da Jovem Pan, protagonizou uma polêmica neonazista. Como isso pode ser perigoso?

Andrei Semensato
singular&plural
3 min readMay 30, 2022

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Por Andrei Semensato e Eduarda Smilari

A repercussão midiática de uma notícia. Crédito: rawpixel.com/Freepik

Sabe-se que estamos passando por um período delicado mundialmente, sobretudo no que diz respeito à relação entre política e comportamento social. Com ideologias extremistas ganhando destaque nos noticiários, a questão que surge passa a ser: até quando uma opinião ou comportamento irracional podem ser considerados liberdade de expressão?

Em 8 de fevereiro deste ano, o jornalista e escritor Adrilles Jorge, da Jovem Pan, encerrou um comentário sobre a quantidade de vítimas do nazismo estendendo o braço, em um sinal que foi encarado como apologia àquele regime. O discurso ainda foi analisado por estudiosos da mídia e grupos sociais, já que o comentarista, além de trazer uma comparação com as mortes do comunismo, fez esse gesto em meio à polêmica que levou o youtuber Monark a ser demitido do grupo ‘Flow’.

Participação de Adrilles Jorge em programa da Jovem Pan. Crédito: @Metrópoles/via Twitter

Em nota oficial divulgada nas mídias sociais, Adrilles explicou que havia sido mal compreendido, e que na verdade estava fazendo uma saudação, para encerrar sua participação. A emissora “recontratou” o jornalista 40 dias depois, deixando implícita a ideia de que estava apenas querendo abafar o caso, visto que ele continuou recebendo salários e comparecendo ao estúdio.

Adrilles também acredita que foi vítima da cultura do cancelamento, alegando que as pessoas procuram problemas onde não existem.

Porém, fazendo ou não uso de apologia ao “sieg heil”, o comentarista acabou dando margem para interpretações, sobretudo dentro de um contexto que era justamente a ascensão do neonazismo no Brasil. Quando pensamos em responsabilidade jornalística, é necessário lembrar que muitos assuntos são sensíveis, e que abordagens sensacionalistas são planejadas principalmente para aumentar a audiência de um veículo.

Ao tratar uma informação, o jornalista deve se atentar à procedência dos dados e fontes e transmitir sua opinião dentro do que realmente aconteceu. No jornalismo não há espaço para a invenção de narrativas, ainda mais quando o objetivo é defender seu ponto de vista. Da mesma forma que os critérios básicos de noticiabilidade exigem compromisso com a verdade, os argumentos devem ser embasados e à parte do viés político de cada repórter.

A expressão “jornalismo sério” pode aceitar diferentes interpretações, visto que alguns veículos de mídia tidos como tradicionais permitem programas ou abordagens que violam a ética e os direitos humanos. Portanto, ser consagrado no mercado não é sinônimo de fazer a melhor abordagem de um acontecimento.

Uma vez que a reportagem ou conduta do jornalista é pensada para gerar likes, repercussão ou engajamento de ódio, esse conteúdo deixa de ser informação para virar produto.

Infelizmente, com o formato previsto pelas mídias sociais, com a timeline infinita e o alto nível de informações em tempo real, o jornalismo está passando por uma fase de adaptação. Nesta fase, estamos observando vários veículos abordando notícias de forma eticamente duvidáveis, além de um certo nível de sensacionalismo em meio a assuntos sensíveis.

Dessa forma, diversas vozes, entre elas os profissionais irresponsáveis como Adrilles, ganham força pelo impulsionamento das redes, e levando os leitores à polarização diante de um período historicamente inaceitável: o nazismo.

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