Pau que bate em Chico deveria bater em Francisco

Gustavo Oyadomari
singular&plural
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3 min readNov 29, 2017

Enquanto Bolsonaro é castigado durante inúmeras linhas — merecidamente — Huck é suavizado. O cheirinho é de… plataforma política.

Por Gustavo Oyadomari

Outrora estava este aspirante a jornalista criticando o papel da imprensa no debate político. Este texto é, mais uma vez, um reflexo da inconformidade deste que vos fala acerca da manipulação da grande mídia — a outros olhos quase inexistente — em relação aos presidenciáveis para o ano que vem.

O foco, desta vez, é na revista IstoÉ, que em duas edições seguidas, de números 2501 e 2502, nas semanas dos dias 17 e 24 de novembro, respectivamente, trouxe em sua capa Jair Bolsonaro e, posteriormente, Luciano Huck.

As teclas dos computadores da redação da revista bateram diferente em cada edição. Se na primeira ela foi agressiva, na segunda ela fez carinho. Enquanto Bolsonaro é castigado durante inúmeras linhas — merecidamente —, Huck é suavizado. Na levada dos torcedores flamenguistas, o cheirinho é de… plataforma política.

“(…) tem cara de bom moço, ao lado da mulher Angélica personifica a família perfeita e promove ações sociais em seus programas de TV de alcance continental. Ou seja, seria o cara certo no lugar certo, num momento de desgaste do carcomido modelo político em que as pessoas não se sentem mais representadas pelos veteranos do jogo.” Revista IstoÉ, edição 2502, “O Incrível Huck”.

“Bolsonaro significa um retrocesso para o Brasil. O pré-candidato leva Messias no nome, mas definitivamente não conduz o País para um bom caminho. Depois de um impeachment e de a Lava Jato arruinar a velha política e seus métodos condenáveis, as próximas eleições podem representar um momento de inflexão para o Brasil. Pelo menos é o que se espera. Sua candidatura, no entanto, é a antítese disso.” Revista IstoÉ, edição 2501, “Perigo, ele pode ser presidente”.

Reprodução: O Antagonista

Longe de mim escrever este texto para apoiar Bolsonaro. A crítica é tratar Luciano Huck, aquele por trás da campanha “Somos Todos Macacos”, como um possível nome à Presidência de um país sob crise política, econômica e social. É nítida a intenção de induzir o leitor ao lado preferido pela revista, como colocado por Perseu Abramo, no livro Padrões de Manipulação da Grande Imprensa, uma vez que o tratamento dado aos dois candidatos é completamente distinto.

Como o padrão de indução não é feito por si só, outro que o sustenta é o da fragmentação. Os quadros sociais do programa Caldeirão do Huck são colocados para soar como uma preocupação do apresentador com os pobres, ignorando a importância de ibope televisivo dos quadros, assim como tenta passar a impressão de que isso o levaria a ser um presidente que olha para os problemas socioeconômicos do país.

Como de praxe por parte da imprensa, o nome de Lula foi utilizado nas duas matérias para fortalecer o posicionamento da revista. Enquanto colocam Huck como rival do ex-presidente, Bolsonaro é colocado como um ex-aliado, mesmo que suas convicções políticas sejam completamente diferentes do petista.

“O maior recibo for (sic) passado e lavrado em cartório pelo ex-presidente Lula. Em entrevista à Rádio 730 AM de Goiás, na quinta-feira 23, o petista afirmou que seu ‘maior desejo na vida’ era “disputar com alguém com o logotipo da Globo na testa’.” Edição 2502

“Na realidade, nem um anti-Lula legítimo Bolsonaro é. Em entrevista concedida em 2003, ele admitiu ter votado no petista no segundo turno de 2002 — em discurso, o chamou até de ‘companheiro’ e referiu-se a ele como ‘nosso querido Lula’.” Edição 2501

A forma como a imprensa lida com os presidenciáveis, além de má fé jornalística, é preocupante em um momento importante do cenário político. Os EUA fizeram com Trump o que os grandes veículos brasileiros têm feito com Bolsonaro. A discussão é rasa, a imparcialidade não existe e o jornalismo se afunda cada vez mais.

As duas capas escolhidas foram da IstoÉ, mas poderiam ser também da Veja ou da Carta Capital. O alinhamento político da imprensa é bastante nítido, mas os fatos são fragmentados, ocultados e invertidos, a fim de manipular os leitores, ao invés de estabelecer linha de raciocínio, discussão e reflexão.

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Gustavo Oyadomari
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Jornalista de 25 anos. Um poeta ruim aposentado, mas que enxerga a poesia que a vida é. Coração de cinco pontas, em vermelho, branco e preto.