Política e pandemia: a relação que não dá certo no Brasil

Chegada da variante ômicron no Brasil escancara, mais uma vez, os caminhos opostos de políticos desinformados e cientistas

Vitor Lupato
singular&plural
3 min readDec 17, 2021

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Por Vitor Lupato

Brasil passa por momento difícil, ficando longe da ordem e progresso que estampam a bandeira. Crédito: Slon Pics.

A nova variante da covid-19, descoberta inicialmente na África do Sul, já está presente em todos os continentes. Assim como aconteceu com as cepas anteriores, o Brasil está na lista dos países com casos confirmados da ômicron. Enquanto cientistas trabalham duro em pesquisas para novas descobertas, países começam a tomar medidas de prevenção contra a variante, que inicialmente se mostra mais transmissível.

No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro mantém o comportamento do início da pandemia, discordando das autoridades de saúde. Na semana passada, a Folha de S.Paulo publicou uma reportagem com diversas falas do chefe do Executivo distorcendo e contrariando uma recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que o governo federal fechasse as fronteiras para viajantes vindos de 10 países africanos. Nas falas selecionadas pelo veículo, o presidente fala em “imunidade de rebanho”, ineficácia das vacinas e hidroxicloroquina. Segundo a ciência, os três pontos mencionados por Bolsonaro são comprovadamente mentirosos.

Durante uma crise sanitária e de saúde global, é necessário que o jornalismo exerça a responsabilidade de informar. Porém, em um país comandado por um disseminador de fake news, a tarefa é muito mais complicada do que parece. Mesmo considerando que a notícia é interpretativa e cada leitor terá uma visão sobre o fato, é preciso tentar diminuir a atenção voltada às inverdades. Nesse caso, o título da matéria mostra o momento em que Bolsonaro distorce a orientação da Anvisa, dando destaque a mais um comentário infeliz do presidente.

Desde março de 2020, com a chegada do coronavírus ao Brasil, as redações jornalísticas tiveram que se adaptar a um novo assunto principal. A pandemia demandou mudanças em todos os setores, mas junto com ela os antigos problemas continuaram aparecendo. Durante o período de calamidade, fake news ditas, escritas ou publicadas nas mídias sociais por membros do governo federal se tornaram frequentes. Da defesa de remédios sem eficácia comprovada à demora na compra da vacina, o desserviço do governo, principalmente na figura de Jair Bolsonaro, ficou claro. Assim, é preciso que o jornalismo se apegue à ciência, à medicina, ao que é comprovado. A responsabilidade dos veículos, além de noticiar, é prestar serviço à população que segue rodeada de incertezas com a chegada da nova variante. A atenção de quem recebe a notícia precisa estar voltada aos fatos, não a 'achismos' de autoridades.

Mesmo com a responsabilidade atrelada à profissão, a situação fica complexa quando falamos do presidente da República. Por mais inconsequente que sejam as declarações, é necessário também que os veículos informem sobre o que diz Jair Bolsonaro. No papel de autoridade, qualquer ação do chefe do Executivo é observada. Por isso, é importante que o nível de atenção voltado para cada um dos lados, entre política e ciência, seja notado e voltado para o que é melhor para a população. Na reportagem em questão, as inverdades ditas pelo presidente aparecem com destaque maior que o esclarecimento de fatos, que são inseridos apenas no final do texto e de forma discreta no título.

A responsabilidade coletiva, o dever de informar e a relação de poder e credibilidade que o jornalismo criou com a população precisam ser utilizados em momentos anormais como os que enfrentamos. Principalmente quando autoridades, em cargos altos, usam os eleitores com perspectiva influenciada pela admiração e pelas declarações baseadas em suposições não verdadeiras para enfrentar um período delicado. Dessa forma, os veículos precisam priorizar os fatos científicos quando noticiam a pandemia, deixando de lado as propositais interferências políticas que observamos no Brasil. Hoje, o jornalismo é a única ferramenta com poder para o direcionamento necessário do combate à pandemia.

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