Quando manchetes pesam mais que a fé

Giulia Famá
singular&plural
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2 min readMar 27, 2018

O aumento de casos de intolerância religiosa e o descaso da mídia

Por Giulia Famá

Nos últimos anos os casos de intolerância religiosa com religiões de matriz afodescendentes tem aumentado drasticamente. Segundo a VICE, em 2014, de 847 terreiro no estado do Rio de Janeiro, 430 sofreram atos de descriminação, sendo 130 provocados por evangélicos. Em, 2017, ainda no Rio de Janeiro, mais de 79 terreiro ou barracões foram alvo de ataques por intolerância religiosa, sendo que 39 deles aconteceram de agosto à outubro. Já em São Paulo, o número de atentados corresponde a 27 no mesmo ano, segundo a Carta Capital.

O jornalismo em sua essência tem como função a interpretação e transmissão imparcial e completa de informações para a sociedade, afim de oferecer os dados necessários para que cada um construa sua própria opinião e guie suas próprias atitudes.

Quando, em meio a todas as contratações no universo do futebol e escândalos de política, as religiões com origem no culto de nação conseguem um espaço na mídia, são abordadas de duas formas: relatando mais um caso de intolerância religiosa em uma pequena manchete no canto superior direito, ou alimentando misticismo e questionamentos em torno do fé.

O cuidado e respeito a um momento de dificuldade de uma Casa de Santo é posto em cheque em troca de uma manchete chamativa que talvez ganhe os olhos e atenção de alguns leitores ao lado da goleada que o time mais querido do estado levou no último domingo. Os ataques, sempre tratados como mais um, não ganham primeiras capas ou banners quando publicadas em sites. De mais um em mais um os números cresceram 105% de 2015 para 2016, segundo a Secretaria dos Direitos Humanos.

Quando retratados em documentários ou mini séries, que buscam “desvendar” as religiões, o descaso com termos, nomes, descrições de procedimentos e explicações se perde em meio as narrações que alimentam o misticismo e estranheza que a religião carrega por ter sido recebida em 1500 com o poder simbólico da Igreja Católica e o sincretismo.

A diferença de tratamento e de relevância, assim como o descaso com termos de importância, alimentam o preconceito que foi criado contra a Umbanda, Candomblé e Culto de Nação, com fruto de um problema social que a sociedade enfrenta até hoje, o racismo.

Mas parece que ter manchetes sobre casos de intolerância e mini séries que causem curiosidade nos telespectadores, aumentando a audiência pesa mais no bolso dos jornais do que desmistificar uma fé brasileira e até mesmo evitar crimes de ódio.

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