Roda Viva: Bolsonaro e a ideia do Diálogo perdido

Carlos Gomes
singular&plural
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3 min readSep 20, 2018
Thaís Oyama na bancada do programa Roda Viva do dia 30/07/18. (Imagem: TV Cultura)

Por Carlos Gomes Jr. e Laís Araújo

O programa Roda Viva, presente na TV Cultura desde setembro de 1986, em seu formato, tende a facilitar a discussão com maior profundidade (ou atenção) de temas diversos, o que acaba incentivando o diálogo entre os participantes da roda de perguntas e seus entrevistados.

Aqui, então, será colocado em discussão o programa do dia 30/07/2018, atualmente conduzido por Ricardo Lessa, realizado com o candidato à Presidência da República pelo PSL (RJ), Jair Bolsonaro e na bancada de entrevistadores estavam Bernardo Franco (O Globo), Daniela Lima (Folha de S.Paulo), Leonencio Nossa (Estadão), Maria Cristina (Valor Econômico) e Thaís Oyama (revista VEJA). O intuito é verificar qual o nível de conversa que ali existiu.

E m ano eleitoral, nada mais relevante — ainda mais para jornalistas — que conseguir conversar com aquele que tem liderado as pesquisas de intenção de voto. O Roda Viva, com o prestígio conquistado, unido à fama marrenta do candidato, prometia ser o programa de sucesso daquela noite, levando em conta a audiência (e assim o foi).

Para o jornalismo, aquele era o momento de verificar, primeiramente, os planos de governo do candidato para, além de dialogarem, dar mais um conhecimento de causa à sociedade. No entanto, sobre isso, os entrevistadores tocaram apenas nos objetivos econômicos, o que o próprio candidato afirmou não entender há algum tempo.

A partir daí, o assunto da roda de conversa passou a dar maior visibilidade a memórias da Ditadura de 64 e a questões sobre o posicionamento de Bolsonaro diante alguns fatores sociais (que já são bem conhecidos), como se quisessem força-lo a mudar seus ideais e caso não conseguissem que ao menos o tornassem objeto de chacota.

O jornalismo, assim como a possibilidade de diálogo, ali, se fazia ausente. O candidato, mais uma vez, passou a segurar suas certezas com firmeza e aplicar suas respostas.

Após consecutivas perguntas sobre a Ditadura de 1964, Bolsonaro passou a ser direto em suas respostas, mostrando segurança no que dizia e indignação nos seus gestos. Ele eliminava o dialogismo lançado pelos jornalistas por meio da frieza de suas respostas (19m22 até 20m08).

A falta de diálogo fica evidente em alguns instantes, quando os entrevistadores, não conformados, passam a interromper algumas das respostas do candidato.

Não teve essa de ‘conversa vai, conversa vem’, ela apenas ia… em cima de verdades próprias, tanto pela parte do entrevistado como pelas perguntas dos entrevistadores buscando colocá-lo numa armadilha por meio de sua aparente falta de sanidade.

O ápice dessa conversação está refletida nos instantes 1h02m até 1h03, quando o candidato respondeu sobre o modelo de segurança pública que pretende adotar a seu governo, aderindo responsabilidade e respeito aos policiais civis e militares.

No decorrer do programa, Bolsonaro acaba desmentindo algumas falas que os jornalistas diziam ter ele dito até que, também, o jornalista Bernardo fez questão de contradize-lo em uma informação (1h07m17 até 1h07m35) mostrando que era importante sair da conversa com a razão.

Se fosse perguntado ali, qual a definição ideal de comunidade, possívelmente receberíamos “a verdade” como resposta. Mas que verdade? “A minha verdade”. Os jornalistas, ao insistirem expor desde o início que, segundo eles, as ideias primordiais do candidato estão no campo irracional; enquanto Bolsonaro em responder com prepotência (em fala e gestos), não abrindo mão de agradar parte de um público que se considera seu.

No fim, em tempos de eleição e pós-verdades, o Jornalismo tem vivido tempos difíceis. O tão conceituado Roda Viva pareceu não carregar tanta ‘vida’ assim. O que deveria ser um debate mais se assemelhou a um MMA por meio de ideias.

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Carlos Gomes
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Um pernambucano-paulistano, estudante de Jornalismo e observador do mundo contemporâneo.