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Mídia abusa do melodrama para alimentar a insaciável fome humana em busca do desastre

Carlos Gomes
singular&plural
3 min readNov 22, 2018

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Por Carlos Gomes e Laís Araújo

Foto: Blog Cascalenses

Logo de começo, queremos deixar claro que o título entre aspas utilizado nesse artigo, retirado do Blog de Jamildo, nada mais é que um artifício para chamar sua atenção. Carregado de opinião, é uma chamada bastante convidativa, levando em consideração a palavra “tragédia”, afinal, estamos acostumados a ouvir sobre uma calamidade ou outra e ficar comentando por aí, pois está na raiz da nossa cultura humana.

Diz o nosso histórico existencial, que, desde o início, lutamos pela sobrevivência para não sermos devorados por animais ou até esmagados pela natureza. Os neandertais foram os que, inicialmente, deram sinais evolução com relação à civilização — ainda que esta tenha sido minúscula. Sobreviveram a catástrofes naturais — tempestades, certamente furacões ou até mesmo se livraram de serem devorados —; estabeleceram lares para si através das cavernas e, nas paredes dessas, passavam informações para as gerações contemporâneas e a futuras às suas mostrando os primórdios da comunicação, até que o tempo passou e encarregou de aperfeiçoar quem somos e onde vivemos com certa civilidade e moral aparente.

A mídia, artifício participante da evolução dos Homens, principalmente de sua comunicação, a partir de seu surgimento registrou fatos marcantes tanto pela escrita quanto por imagens, com a chegada da fotografia no decorrer dos anos. A Revolução Francesa, I e II Guerras Mundiais, registro de escravidões e suas abolições, dentre outros fatos que a história comprova, são alguns dos acontecimentos que não passaram em branco.

Dando um pulo gigantesco no decorrer dessa história, e colocando em paralelo o início e a atualidade, podemos presenciar a mídia buscando trazer aos nossos olhos, todos os dias, o anseio pelo perigo, pelo desastre, pela tragédia… coisas essas que, no princípio, fugíamos como espécie, mas que hoje é “importante” em algum nível, pois nos parece impossível estabelecer relações sociais sem elas.

Falar sobre uma tragédia aqui, outra ali e ainda outra acolá não é difícil. Casos desse gênero, segundo texto do Observatório da Imprensa, têm sua justificativa traçada na arte, ainda nos tempos da Grécia Antiga: “As tragédias gregas, segundo Aristóteles, não eram vistas com pessimismo, mas sempre com um fim educativo — já que, se os personagens eram moralmente cegos, pelo amor ou ódio; enfim, pelas paixões, o coro marcava os fatos repetindo e descrevendo os aspectos emocionais e psicológicos das tramas do cotidiano”.

Aquele antigo desespero por sobrevivência, atualmente está compactado em nosso interior transformado numa espécie de adrenalina em vislumbrar terrores, como o perigo ou a morte. De alguma forma, o ser humano encontra-se cego, apaixonado pelo drama da vida real — que ultrapassa o das novelas.

Notando esse anseio que nossa alma carrega, os meios midiáticos nada mais fazem que dar-nos um banquete apetitoso. Seja num Brasil Urgente, Cidade Alerta ou até mesmo um Jornal Nacional, cada um à seu modo de oferecer os pratos no decorrer do dia: uns goela abaixo, enquanto outros concedem até um guardanapo de tão gentis. Diante disso, verifica-se o quão atraente a tragédia se torna para os humanos e, na mesma medida, lucrativa e (por isso) digna de um registro.

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Carlos Gomes
singular&plural

Um pernambucano-paulistano, estudante de Jornalismo e observador do mundo contemporâneo.