Vogue em um jornalismo além da moda

A necessidade de pautas sociais e inclusivas na mídia fashion

Júlia Siqueira
singular&plural
3 min readOct 9, 2021

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Por Guilherme Porrino e Júlia Siqueira

Capas da revista Vogue — Créditos: Greta T para Unsplash

A revista Vogue é um dos principais nomes no cenário da moda global. No Brasil ela é uma das revistas mais consumidas; no ano de 2018, por exemplo, ela vendeu 78.374 exemplares, sendo 48.244 a partir da circulação paga e 7.401 considerando as assinaturas digitais. Entretanto, o veículo não se restringe somente à moda tradicional e aos assuntos da passarela, mas aborda o tema em diversos contextos como político, social e econômico.

No dia 21 de setembro de 2021, data em que é celebrado o Dia Nacional de Luta das Pessoas com Deficiência, o veículo publicou uma reportagem especial sobre a temática. No texto, a questão da inclusão e diversidade na moda são assuntos centrais, os corpos fora dos padrões estabelecidos pela indústria não têm o direito de se vestir. A reportagem conta com diversas fontes que possuem diferentes formas de deficiência, tentando ao máximo contemplar a pluralidade discursiva.

Aaron Rose Philip e Gigi Hadid em desfile da Moschino no NYFW 2022 — Crédito: Marco Ovando/Divulgação

A jornalista, Lia Rizzo, autora da matéria, não poupa críticas ao mercado da moda e nem se esconde com termos simples. Logo na linha fina da reportagem já é possível compreender o que encontraremos nos parágrafos seguintes: “Vogue faz uma reportagem especial apontando algumas das maiores urgências para que a moda deixe de ignorar aqueles que não se encaixam em moldes”, diz ela na abertura do texto. Escolher “ignorar”, junto de outras palavras, deixa clara, a posição do veículo.

Para embasar o argumento da reportagem a jornalista apresenta uma variedade de fontes nas entrevistas, tanto com pessoas com diferentes deficiências, como com marcas do mercado. Essa escolha tem por objetivo dar um sentido ao texto a partir das vozes ouvidas.

Podemos perceber uma dualidade nas vozes, quem produz e quem consome. Para quem é consumidor a sensação é desanimadora: “Tem dias que tenho certeza que esse mundo pode ser meu também, até que os olhares curiosos e surpresos me lembrem que ainda sou um corpo estranho na maioria dos ambientes”, diz Michele Simões, estilista em formação e criadora da plataforma “Meu Corpo é real”.

Já para quem produz, o questionamento de pessoas PCDs é mais do que válido, como diz Paulo Matos, diretor da Tommy Hilfiger Brasil, sobre a nova coleção da marca para pessoas com deficiência: “tem sido um aprendizado contínuo, claro, pois a deficiência não é uma só”. Quando estamos falando de empresas não podemos deixar de falar do mercado de trabalho na moda. Samantha Bullock, fundadora do hub de moda SB Shop, modelo e atleta, aponta na reportagem que “Não queremos somente consumir. É preciso incluir a pessoa com deficiência no marketing, no espaço de desenvolvimento da coleção, no pensar das universalidades nas modelagens”. Segundo ela essa é a forma de realmente tornar a moda acessível.

Essas diversas vozes do mesmo tópico deficiência embasam e ampliam o espaço para a opinião concreta do veículo. É a partir de frases como “aliás, não há receita mágica para atender a essa demanda” e “não precisa de bruxaria, tem tecnologia e parcerias” que o jornalismo se mostra além de fiel à verdade, também um propulsor de questionamentos e reflexões. Para finalizar, os dados, presentes ao longo de todo o texto, amplificam o contexto para o público e justificam o quão atual é a pauta.

A Vogue, em sua reportagem especial, foi capaz de colocar de lado os que julgam a temática moda como fútil, com uma aula sobre o mundo fashion e suas questões sociais invisibilizadas. Apresentando dados, fontes especialistas e deixando claro seu posicionamento perante a essa indústria, o veículo ressalta, com esse exemplo de matéria, a importância do jornalismo plural e da crítica que transforma e constrói.

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