Deixe a vida te surpreender
Eu sei o que quero e sei o que não quero.
Desde muito cedo, desde que me lembro, sempre tive um certo traço de solidão. Essa solidão nunca foi exatamente uma escolha minha, mas parecia que esses momentos me escolhiam. Durante toda a infância e até mesmo na adolescência, confesso que não gostava disso. Secretamente, eu preferiria estar com meus amigos da escola, fazendo qualquer coisa. Ainda hoje, com muitos anos de experiência a mais, não posso dizer que gosto, ou nem sempre. Acredito que ninguém realmente gosta. Saber estar só e apreciar momentos naturais de solidão é uma coisa. Em alguns períodos, até prefiro. No entanto, considerar isso como algo permanente não é o ideal. Embora haja ocasional desapontamento e até desesperança que frequentemente invadem meu peito, entendo que não é o ideal. Às vezes, sinto que a vida não pode mais me surpreender, como se tudo e todos fossem dolorosamente previsíveis o tempo inteiro. Vejo isso como algo a ser trabalhado. Pelo menos acredito que seja perfeitamente possível, e preciso me dar uma única chance. Eu só odeio quem odeia tudo e não tenho paciência para quem não tem paciência para nada. O fato é que render-se à jornada do exílio é também mergulhar em um círculo vicioso: quanto mais tempo se passa na ausência dos outros, mais se deseja estar nesse estado. Qualquer um que chegue e permaneça um pouco mais rapidamente se torna incômodo, e o que vem a seguir é uma sucessão de ações e reações baseadas em autossabotagem. Procrastinação e certo pessimismo tornam-se constantes. Qualquer problema… é sempre culpa dos outros. Não se pode ser feliz. Aceitar e achar que está tudo bem pode até ser, mas esse afastamento constante não contribui em nada. E eu não li nada disso por aí, não. Eu vivi. Antes de me tornar alguém tão amargurado quanto aquelas pessoas com quem não consigo sequer imaginar iniciar um diálogo, tomei a decisão consciente de parar. Decidi buscar regularmente interações de qualidade, companhias que realmente acrescentem, que sejam fontes inesgotáveis de inspiração. É possível. Só de pensar nisso, surge uma ponta de otimismo, como um raio de luz. E é isso: o que precisamos é procurar maneiras de dar a volta por cima sempre que necessário. Eu sei o que quero e, com ainda mais convicção, sei o que não quero. E eu não quero apenas existir. Qualquer pedra no meio da rua já faz isso. Eu vou me permitir ser surpreendido.