Uma noite no clube de jazz mais antigo de Nova York

Jéssica Raphaela
síntese NY
Published in
3 min readJul 15, 2015

Entrar no Village Vangard é como visitar o passado

1976 — villagevanguard.com

A entrada é só uma portinha vermelha discreta que não chamaria atenção não fosse a fila formada religiosamente há oito décadas na sétima avenida. Os mais distraídos acabam enxergando o letreiro da pizzaria ao lado e passam batido pelo clube de jazz que é um dos mais tradicionais do mundo.

O local é quase um templo sagrado
no qual já passaram nomes como John Coltrane,
Sonny Rollins, Bill Evans e Miles Davis

São 80 anos de história completados neste ano, o que faz do Village Vanguard o clube mais idoso de Nova York. A entrada ainda é a mesma de 1935, quando foi criado por Max Gordon para receber recitais de poesias e shows de música folk. Virou a casa do jazz novaiorquino. Para os amantes do gênero, o local é quase um templo sagrado no qual já passaram nomes como John Coltrane, Sonny Rollins, Bill Evans e Miles Davis.

Como um bom clube de jazz, a entrada é discreta, nada de pompa. A portinha desinteressante leva para o subterrâneo — motivo pelo qual o estilo musical ficou conhecido como underground. A pequena fila que se estende pelo lado de fora da sétima avenida no Greenwich Village, segue pela escadinha apertada e escura e termina no salão com luz baixa. Depois de desembolsar $30, você entra no local e sente mesmo o arrepio, a presença das lendas do jazz que iniciaram a carreira e gravaram álbuns históricos ali.

2015 — Jessica Raphaela

O bar no fundo do clube fica em posição oposta ao palco quase inexistente. O piano de calda próximo das mesas e os músicos posicionados quase rente ao chão fazem a música soar acessível, íntima. No meio, mesinhas redondas espalhadas pelo pequeno salão. Dizem que não há lugar ruim, em termos acústicos na casa. A única decoração pomposa está nas paredes, com fotos de centenas dos principais artistas que passaram pelo local expostas entre instrumentos antigos: um museu musical. Com o drink obrigatório em mãos, altera-se o sentido prioritário, da visão para a audição. E aí começa o show.

Toda segunda-feira é dia da orquestra de jazz mais antiga da cidade. Formada em 1965, os 16 músicos do The Vanguard Jazz Orchestra rezam a missa semanalmente no local. Os primeiros acordes preenchem o salão escuro. E na pausa para apresentar o grupo: “esta é uma das mais antigas casas de jazz de Nova York e há 40 anos eles não trocam a banda”, brinca o trombonista Douglas Purviance.

Outubro de 1939 — villagevanguard.com

O som (e a vibração) do metrô passando a poucos metros do clube é mais um componente do clube. Te faz lembrar onde você está: na cidade que, ao lado de New Orleans e Chicago, é considerada o berço do jazz. O show segue por cerca de 1h30, sem intervalo e descanso. Ninguém quer que a musica seja interrompida.

Nova York tem dezenas de clubes de jazz maravilhosos — e ainda vou escrever sobre eles -, mas estar no Village Vangard foi mesmo especial. Nem é preciso muito imaginação pra visualizar aquele lugar nos anos 1940 e 1950, quando as roupas eram muito mais elegantes, os chapéus não eram moda hipster e a fumaça dos cigarros deixavam o local mais obscuro e, confesso, charmoso. É uma delícia sentir a história no presente.

--

--