Como modernizar as relações trabalhistas

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15 min readJan 7, 2016

Em tempos de crise econômica, preservar empregos torna-se um dilema para muitos empresários, que durante o IX Simpósio de Relações do Trabalho, promovido pela FIERGS, em Gramado, debateram algumas ideias com profissionais da área e juristas

O Brasil fechou mais de 95,6 mil vagas formais de trabalho em setembro de 2015. Essa informação correu os noticiários de 22 de outubro, o mesmo dia em que o dado foi divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Constava da análise periódica que a instituição realiza desde 1992 sobre o desempenho do País em relação ao emprego da população. O número foi o pior resultado da série histórica no mês e trazia ainda um detalhamento impressionante: os empregos foram diminuídos de maneira generalizada, impactados principalmente pelas demissões no setor de serviços (que fechou 33,5 mil vagas), construção civil (28,2 mil), comércio (17,3 mil) e indústria da transformação (10,9 mil).

Para ter essas informações disponíveis, o IBGE utiliza dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgados pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social. Quando a análise se dá por um período mais longo do que o mês, entre janeiro e setembro, por exemplo, o número de empregos formais perdidos chega a 657,8 mil. E, no acumulado em 12 meses, as demissões passaram de 1,2 milhão. Em percentuais, a taxa de desemprego no País, no período, ficou em 7,6%. Na comparação somente com o mesmo mês do ano passado, o índice era de 4,9%. Ou seja, no intervalo de um ano, aumentou muito a quantidade de pessoas desempregadas no Brasil.

A despeito do tema emprego e trabalho, os números são apenas mais uma face de confirmação de que o País passa por um momento tenso de sua economia. Eles retratam a situação atual de dificuldades gerais em todas as áreas, sejam públicas ou privadas, no que diz respeito ao freio para conter despesas. “Os períodos de crise devem servir para reflexões muito profundas sobre as bases em que estão assentadas as relações de trabalho no Brasil. A FIERGS, a Confederação Nacional da Indústria, os sindicatos industriais e os empreendedores do País estão seriamente interessados em discutir um novo modelo de desenvolvimento que permita voltar a crescer. Retomando o crescimento, podemos aumentar rapidamente a empregabilidade dos setores produtivos”, alertou o presidente da Federação das Indústrias do Rio Grande do Sul (FIERGS), Heitor José Müller, durante o IX Simpósio de Relações do Trabalho, dias 22 e 23 de outubro, em Gramado (RS).

Ele vai além. “Nossa expectativa é que os debates encaminhem soluções possíveis e rápidas para que as relações trabalhistas, em vez de impeditivas, sejam estimulantes de uma nova realidade. Um novo modelo que priorize a empregabilidade, pelo qual possamos instituir um verdadeiro processo de desenvolvimento sustentado para todos os brasileiros”, explicou ele. No âmbito das relações de trabalho, a legislação brasileira, de fato, proge o trabalhador, e não há argumento contrário a isso. Segundo ele, todos querem que os empregos gerem renda e com essa renda todos possam viver bem, fazer a roda econômica andar.

Presidente da FIERGS disse, durante evento em Gramado, que a proteção desmesurada do trabalhador provoca redução na empregabilidade / Crédito: Dudu Leal

No entanto, é necessário que haja uma revisão de como se dão as proteções ao assalariado. “Longe de querer que o trabalhador seja desrespeitado. Mas a rigidez das leis é de tal força que acontece de termos a seguinte distorção: é mais rápido e fácil demitir (e eliminar a vaga de trabalho), do que negociar com o trabalhador uma redução do salário e das horas, ainda que temporariamente”, reforça o coordenador do Conselho de Relações do Trabalho e Previdência Social (Contrab) da FIERGS, Paulo Garcia.

Segundo ele, está mais do que na hora de o Brasil refletir com serenidade sobre a modernização da legislação trabalhista, sem deixar que o debate vire palanque eleitoral, muito menos embate ideológico. “A proposta de uma discussão sobre preservação de empregos a cada crise econômica é do interesse geral da sociedade. Não se pode adjetivar empresários e trabalhadores como se fossem o lado mau e o lado bom de uma história”, pondera o coordenador.

O presidente da FIERGS comentou diante de uma plateia de juristas, juízes, autoridades, pesquisadores, advogados, empresários e representantes de trabalhadores que os períodos de crise devem servir para reflexões profundas sobre as bases em que estão assentadas as relações de trabalho no Brasil. “Não podemos separar a geração e manutenção de empregos do necessário fortalecimento e expansão das empresas privadas. Lamentavelmente, passamos por uma séria crise, que comprime radicalmente a dinâmica das atividades produtivas. Como a economia é uma só, as empresas são obrigadas a adotar medidas drásticas para sobreviver”, discursou Müller.

Ao longo dos dois dias de conferências e exposição de ideias, muito se falou sobre os impactos das transformações tecnológicas, econômicas e políticas vividas no Brasil dos últimos anos. E não foram poucas as manifestações sobre a impressionante posição do País entre as nações mundiais com maior número de reclamatórias trabalhistas. Entre 2011 e 2013, ingressaram mais de 3 milhões de ações novas da área trabalhista. Na Justiça do Trabalho do Rio Grande do Sul, em 2014, deram entrada 172 mil ações no primeiro grau. Assim, no acumulado dos últimos cinco anos, o crescimento do número de demandas no Estado chega a quase 40%. Para os empresários, aponta Müller, a proteção desmesurada dos empregados ocasiona a redução da empregabilidade. “Cuida-se tanto de quem está empregado que há um paradoxo, pois não se tem a mesma dedicação para cuidar dos desempregados ou de facilitar, mobilizar, incentivar a criação de mais vagas”, conclui o presidente da FIERGS.

Doutora em Direito Yone Frediani destacou que o fato de uma empresa contratar alguém de forma autônoma não prejudica o empregado / Crédito: Dudu Leal

Para o ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) Douglas Alencar Rodrigues, as críticas dos empresários são legítimas e contribuem para o debate democrático, tal como deve ser. “Que se esgotem as tentativas de haver equilíbrio na relação capital e trabalho”, defendeu ele, apontando as negociações coletivas como “a chave” para resolver as dificuldades. “O Direito do Trabalho estabelece um conjunto de garantias sociais e é fundamental para a ordem social e econômica. Pode ser melhorado e a arena para o debate é o Poder Legislativo. As críticas a ele surgem sempre em períodos de crise econômica”, argumentou.

Contudo, o ministro entende que a representatividade das partes que negociam ainda precisa ser aprimorada. “Além das empresas e dos trabalhadores propriamente envolvidos, é preciso que haja atores mais fortes institucionalmente do que um sindicato de trabalhadores versus um sindicato de empresas. Deveriam as entidades de classes também se aprofundar e participar das negociações, pois são mais consolidadas no aspecto representativo setorial. São entidades que podem levar ao amadurecimento das relações, superando a ideia de que não são antagônicas, mas parceiras de projeto de construção de uma sociedade mais justa, equilibrada e harmônica”, explica.

Tratando-se de negociações, ainda que por meio da intervenção judicial, a posição da ministra Maria Helena Mallmann, também do Tribunal Superior do Trabalho, esclarece muito àqueles que estão em busca de consenso sobre a modernização das leis trabalhistas. Ela relata sobre um bom exemplo em que a negociação prevaleceu. “No âmbito da Tribunal Regional do Trabalho da 4° Região, que é justamente no Rio Grande do Sul, quando fui presidente do Tribunal, tivemos experiências extremamente positivas ao fazermos o que chamamos de mediação preventiva. Foi em Rio Grande sobre a produção das plataformas marítimas no polo naval local”, lembra.

Depois de concluídas as negociações do que seria um cenário desastroso com a simples demissão dos mais de 7 mil empregados ao final do trabalho, ficaram garantidas algumas seguranças importantes. “Criamos uma força-tarefa, incluindo aí, a pedido do Estado do Rio Grande do Sul e do Ministério Público do Trabalho, os sindicatos dos trabalhadores, a Caixa Econômica Federal e também a Petrobras. Viabilizamos para os trabalhadores que estavam sendo despedidos o recebimento de um segurodesemprego e suas parcelas rescisórias antecipadamente. Na visão preventiva foi garantida uma condição interessante ao trabalhador”, conta a ministra.

Pelo exemplo, a negociação comprovou-se uma solução para evitar a enxurrada de processos que iriam ocorrer após as demissões. “Penso, particularmente, que as negociações deveriam ser amplas, atingindo também outros atores, como disse o ministro Rodrigues. Nesse momento, prefiro trabalhar com a ideia de nova visão das negociações e não somente deixar que as partes (os sindicatos patronais e de trabalhadores) se entendam sozinhos. O comentário de que os trabalhadores são o lado fraco da negociação poderá sempre existir”, avalia Maria Helena.

Harmonização das relações

Em outro exemplo, a ministra cita uma paralisação dos metroviários ou rodoviários, em atividades prestadas ao Estado. “O Poder Judiciário, de alguma forma, tem respondido muito melhor às ações coletivas do que as individuais. Coletivamente decididos os problemas, vemos menos repercussões de recursos ou prolongamentos desnecessários das reivindicações iniciais. Me parece que aceitação tem sido melhor, com respostas mais eficientes e rápidas para os envolvidos. Ainda assim, penso que podemos evoluir cada vez mais”, conclui.

É interessante observar o reconhecimento que a ministra faz sobre o acirramento das relações trabalhistas em período de dificuldade econômica. “As crises se sucedem e eu tenho um período de mais de três décadas de exercício da magistratura. A situação da economia já foi bem mais complexa até. O que se observa é que o Direito do Trabalho responde, na medida do possível, as questões que são trazidas pela sociedade. O papel da Justiça do Trabalho é o de harmonização das relações. Ela se mostrou muito competente no passado e não será diferente no presente e no futuro”, acredita.

Sem negar que a Justiça acaba sendo o canal para a conciliação, a ministra admite que há um grande movimento de judicialização dos conflitos sociais, inclusive políticos. “Então, essa é uma verdadeira crise, mas aí é uma crise de Estado, uma crise até da própria democracia, que faz um deslocamento das funções dos poderes Legislativo e Executivo para o Judiciário, percebido como garantidor de direitos”, entende ela. “Talvez, esse seja o motivo pelo qual haja uma forte pressão por parte dos empregadores para que se possa evitar a resolução de problemas nas instâncias da Justiça e conseguir resultados pelas vias da negociação”, completa.

O presidente da Associação dos Advogados Trabalhistas de Empresas no Rio Grande do Sul (Satergs), Gustavo Juchem, chama a atenção para um momento oportuno de debate de soluções nas relações trabalhistas. “Estamos passando por uma grave crise no País e precisamos manter os empregos existentes, bem como garantir a geração de novas vagas. Acredito em relações menos conflituosas e mais harmônicas para juntos encontrarmos o caminho para o desenvolvimento”, pondera. Juchem aponta a insegurança jurídica causada pelas decisões finais em tribunais como um fator de desestímulo de intenções empreendedoras. “Muitas vezes são feitos acordos entre os sindicatos patronais e laborais que depois o TST revoga, ou seja, a negociação foi tempo perdido”, explica o advogado.

Ainda assim, o debate sobre a adoção do princípio de que o negociado entre patrões e empregados pode prevalecer sobre o que está previsto na legislação deverá ser aprofundado devido ao contraponto naturalmente defendido pelo lado dos funcionários. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil (STICC), em Porto Alegre, Gelson Santana, por exemplo, reconhece que as negociações coletivas são relevantes, porém pouco efetivas para chegar a um acordo satisfatório. “O importante é que os dois lados saiam um pouco satisfeitos, porque completamente satisfeito não existe. O momento atual é onde os patrões entendem que não devem dar aumento de salário. Só que, nos últimos anos, o Brasil estava em pleno emprego e as empresas, para não dar aumento diziam que o problema dos trabalhadores era a qualificação”, contesta o presidente.

Na visão do dirigente, a Justiça do Trabalho se faz necessária porque não ocorre unidade de força entre os diferentes sindicatos. “Há alguns segmentos fortes, mas muitos não são. Quando os sindicatos não são fortes os trabalhadores serão prejudicados. Contudo, para que possamos ter um País com mais igualdade social, precisamos fortalecer as convenções coletivas e as negociações”, acredita Santana. O pensamento não chega a ser novo. Uma das primeiras vezes que foi cogitada uma maior ênfase para negociações entre trabalhadores e empregadores sem a intervenção judicial foi no governo de Fernando Henrique Cardoso, ainda no início dos anos 2000. No último ano do segundo mandato, chegou-se a anunciar um projeto que alterava a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), permitindo que os acordos coletivos tivessem força de lei. Por causa das críticas dos sindicatos trabalhistas e do Partido dos Trabalhadores em plena ascensão política, a proposta caiu. Um tempo depois, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva retomou a discussão com dois projetos, o da reforma sindical e o da reforma trabalhista. No entanto, ele engavetou a ideia.

Recentemente, a equipe econômica do governo de Dilma Rousseff também voltou ao tema, porém na roupagem da “flexibilização trabalhista” como importante para ajudar o País a enfrentar a atual crise recessiva. Não foi por acaso que em julho desse ano houve o anúncio do Plano de Proteção ao Emprego (PPE). Em resumo, a proposta permite que empresas com dificuldades financeiras temporárias reduzam a jornada de trabalho dos funcionários. O PPE libera os participantes para diminuir em até 30% as horas de trabalho, com redução proporcional do salário pago pelo empregador. A diferença do salário será parcialmente compensada pelo governo, que vai pagar ao funcionário 50% da perda, com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Na época do anúncio, o ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, declarou que se tratava de “proteger o vínculo empregatício” e que não era uma invenção atual. A própria imprensa especializada tratou de resgatar dados sobre a busca de ideias para a questão no Brasil.

De acordo com registros do Sindicato dos Metalúrgicos da região do ABC (no Estado de São Paulo), há cerca de três anos, um grupo formado por representantes do governo, de sindicalistas e de empresários foi à Alemanha para se informar como aquela nação tratava do assunto. Foi fácil encontrar explicações de que lá boa parte da indústria e dos sindicatos dos trabalhadores concorda em reduzir a jornada de trabalho e os salários, em caráter excepcional e com prazo de validade, para permitir que a economia atravesse a crise sem falências ou demissões. O instrumento acabou muito usado para combater os efeitos da turbulência econômica de 2008, mas já tinha sido usado nos anos 60 e 80.

Desde que o governo enviou o PPE, na forma de Medida Provisória (680/2015) ao Congresso Nacional, o movimento mais recente de seu status é que a comissão formada por deputados e senadores aprovou um parecer inicial. Agora em novembro, a MP deverá ser analisada pela Câmara e depois pelo Senado separadamente. O texto preserva os direitos previstos na Constituição Federal, em documentos da Organização Internacional do Trabalho (OIT) ratificados pelo Brasil, bem como normas de higiene, saúde e segurança do trabalhador. O que mudou em relação ao projeto original do governo, por enquanto, é que o prazo de vigência do PPE foi estendido para 31 de dezembro de 2017 (antes era 2016). Também as empresas que aderirem poderão permanecer com ele por 24 meses em vez de 12, como no plano inicial.

Conforme informações do governo, já há seis grandes companhias inscritas no programa, entre elas as filiais brasileiras das multinacionais Mercedes-Benz, Grammer do Brasil (que produz assentos para automóveis) e a fábrica de máquinas, motores e veículos pesados Caterpillar. Outras 27 grandes empresas estão em processo de análise de documentos.

Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), é interessante abrir espaço aos movimentos que possam levar a uma mudança necessária na modernização das leis trabalhistas, mesmo que temporário. Ela contribuiria com a recuperação de empresas e auxiliaria na retomada de crescimento da economia. “Há de se considerar que as dificuldades econômicas são um conjunto de fatores estruturais brasileiros. Depositar nas questões trabalhistas toda a responsabilidade para a recuperação da crise é um erro. Temos de buscar também ações para a infraestrutura e tributação”, indica o presidente da CNI, Robson Braga de Andrade.

No Rio Grande do Sul, a expectativa do setor industrial é de que o segmento automotivo (representado pelas empresas de perfil metalmecânico e produtoras de autopeças) deverá aderir ao Plano de Proteção ao Emprego, incluindo máquinas agrícolas.

INFLUÊNCIAS HISTÓRICAS E UMA NOVA REALIDADE TECNOLÓGICA

Na defesa da ideia de modernização da legislação brasileira que rege o mercado de trabalho, o professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (USP), Hélio Zylberstajn, um dos palestrantes do IX Simpósio de Relações do Trabalho, sintetizou suas pesquisas, lembrando que não é mais possível ignorar as transformações que ocorrem na atualidade. “Aprimorar as instituições do mercado de trabalho é uma prioridade para uma sociedade em desenvolvimento. E isso precisa ocorrer com critério e sensibilidade. Temos que compartilhar com justiça os riscos do novo, por exemplo, com a imensa intervenção do uso da tecnologia nos ambientes produtivos”, observa. Para ele, a inovação tecnológica altera rapidamente, e de forma brusca, a maneira de se fazer as coisas, no sentido de aumento de produtividade.

“O uso do computador e de máquinas robotizadas chegou para substituir o trabalho humano em atividades rotineiras, repetitivas e programáveis. Em pleno 2015, há de se prestar atenção em funções que os equipamentos podem substituir também as ações humanas com conteúdo cognitivo e um exemplo disso são os automóveis sem motorista”, diz. Ou seja, muito em breve, o Direito do Trabalho terá de se preocupar também com um cenário de novas organizações de produção com menos vínculos. “O Direito do Trabalho emergiu no mundo da grande empresa vertical e do emprego permanente. É preciso evoluir da proteção do vínculo para a proteção do trabalho. Da proteção no emprego para a proteção no mercado de trabalho”, afirmou.

Para o desembargador aposentado do Tribunal Regional do Trabalho, professor da Faculdade de Direito da Universidade da Bahia e presidente honorário da Academia Nacional de Direito do Trabalho, José Augusto Rodrigues Pinto, a influência da tecnologia é sim um fator relevante nas considerações sobre novas relações trabalhistas, pois ela impõe certos desafios ao sindicalismo brasileiro, “abrindo uma crítica a nossa organização sindical”. Essa crítica passa pelo perfil de ainda ser um movimento essencialmente operário nascido de uma necessidade histórica. “Os trabalhadores tinham de se organizar para lidar com a pressão dos patrões na época da Revolução Industrial. Na metade do século passado, havia imigrantes europeus que traziam suas experiências, a maioria delas de opressão fascista. Agora tudo mudou. O movimento sindical não representa um todo, mas representa partes”, aponta o professor, lembrando ainda que o presidente Getúlio Vargas literalmente importou o modelo de relações trabalhistas.

Entretanto, diz o jurista, a questão da representatividade sindical se perdeu ao longo do tempo, principalmente, após a redemocratização. “Esse fenômeno, aliás, é bem universal, mas aqui no Brasil é mais agudo. Houve uma fuga de trabalhadores em relação aos sindicatos por não se sentirem representados, por não concordarem com os caminhos muito politizados, etc. Isso é muito ruim para todos. O desafio da sociedade nesse século XXI está em mudar toda essa lógica”, acredita Pinto. Como forma de ajudar na mudança, a sugestão é de longo prazo. “Os sindicatos deveriam ser mais autônomos na forma como se organizam, sem tanta intervenção de agentes políticos ou interesses pessoais. As negociações entre trabalhadores e empregadores deveriam ser mais diretas no sentido de buscar o que realmente desejam as partes, independentemente de períodos de crise. Que em épocas de ‘tudo bem’ também se negocie benefícios e que a Justiça tenha um papel de resguardar parâmetros gerais em favor da sociedade e não para um dos lados”, resume.

Conforme a desembargadora aposentada do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região Yone Frediani, que complementou as apresentações do Simpósio com visão para o futuro, a velocidade das mudanças no mundo é grande e não pode ser desprezada. Ao falar sobre as relações do trabalho no terceiro milênio, a pesquisadora, que é doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, repetiu os colegas no alerta de que o emprego tal como é conhecido hoje tradicionalmente já tem novas circunstâncias, como a do teletrabalho proporcionado pela tecnologia da conectividade e das soluções de internet. “O Direito do Trabalho não tem como ser o mesmo de quando foi criado. No terceiro milênio, a proteção do trabalhador está bastante ligada à proteção de sua dignidade e segurança muito mais do que ao contrato propriamente dito. A falta de moradia, educação e saúde, sim, são afrontas ao trabalhador”, enfatizou.

O IX Simpósio de Relações do Trabalho foi uma parceria da FIERGS, por intermédio do Conselho de Relações do Trabalho e Previdência Social, com a Associação dos Advogados Trabalhistas de Empresas no Rio Grande do Sul (Satergs). Na edição 2015, contou também com palestras sobre Análise Econômica Aplicada ao Direito do Trabalho; Questões Atuais de Direito Material e Processual do Trabalho; A Recente Alteração na Atualização Monetária dos Débitos Trabalhistas; A Nova Lei dos Recursos Trabalhistas; Os Desafios do Século XXI ao Sindicalismo Brasileiro; Previdência Social e (em) Crise; A Nova Sistemática Recursal Trabalhista: Aspectos Processuais Econômicos; e A Crise Econômica e o Direito do Trabalho: Desafios e Oportunidades.

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