Eco-pirata 2.0

Flavia Martin
Sobrebarba
Published in
4 min readNov 17, 2016

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No dia 21 de setembro de 2011, o designer Guiga Pirá fez sua última refeição com carne. Algum tempo antes disso, ele havia assistido ao filme que mudaria sua vida: um documentário sobre Paul Watson, o fundador da Sea Shepherd, ONG que protege a vida marinha ao redor do mundo. Ao deixar a sala de cinema, já foi para o computador ler mais sobre a organização e fazer sua primeira doação.

Em dezembro daquele mesmo ano, pediria demissão do trabalho e rasparia as economias do cofrinho para, no dia de seu aniversário, em janeiro de 2012, passar a data voando em direção ao Japão em nome de algo muito maior que seus 25 anos. Ele literalmente pagou pra trabalhar por 3 meses na campanha local da Sea Shepherd, documentando e divulgando as notícias sobre a brutalidade da captura e matança de golfinhos na cidade japonesa de Taiji.

“Eles cercam os golfinhos com uma parede de som, o que é muito cruel, porque golfinhos se localizam por som. Daí os mais bonitinhos são selecionados para serem levados para parques de diversão, resorts e aquários. O resto eles matam pra ter a carne comercializada (ela é vendida como carne de baleia). É uma máfia”, explica Guiga, que, depois daquele último bife, em 2011, até hoje é 100% vegano.

“A minha transição de vegetariano para vegano levou um mês. Foi o tempo que demorei pra entender que, em termos de ética, não faz a menor diferença deixar de comer um pedaço de carne e tomar um copo de leite. Até porque um copo de leite tem muito mais crueldade com o animal do que a carne. Quando é um produto derivado, a tortura é constante.”

No Japão, a estratégia da ONG era basicamente apontar as câmeras de forma agressiva (mas nunca violenta) pra quem mata os animais e, ao mesmo tempo, arquitetar pressão internacional sobre o governo japonês, já que a caça predatória de golfinhos é uma prática legalizada por lá.

“Nossa presença muda a logística e a eficiência do trabalho deles. E nosso negócio também é ferrar com o governo de forma financeira, pois eles gastam uma grana com delegacia e força policial quando estamos lá”, conta ele, que, depois do afinco e dedicação com que trabalhou na primeira campanha, foi chamado para a segunda, no fim de 2012. Dessa vez já como assistente de líder.

Quase foi preso algumas vezes, por motivos banais e, hoje em dia, não consegue mais visto para voltar ao Japão. “Descobri que sou considerado ativista full-time. Não posso mais tirar visto de turista.”

Em 2014, portanto, foi chamado para liderar uma campanha em outras paragens, dessa vez nas Ilhas Faroé, arquipélago ligado à Dinamarca que fica entre Islândia e Escócia. Lá, a missão era impedir a chacina de baleias-piloto.

No ano passado, passou 6 meses entre EUA e Europa, preparando navios comprados da guarda costeira americana que seriam destinados a outras missões.

Quando está embarcado ou acompanhando uma ação em terra firme, o tempo é apertado e a barba ocupa cada vez mais espaço no rosto. “Nunca me barbeio [em campanha]. Não tenho tempo nem pra dormir!”

Aviso aos navegantes que buscam mais esclarecimentos: Guiga indica, além de “Eco-Pirata: A História de Paul Watson”, os seguintes títulos (alguns no Youtube e outros no Netflix): “A Melhor Palestra que Você Irá Ouvir na Sua Vida”, do ativista Gary Yourofsky, e os documentários “Cowspiracy”, “Earthlings”, “A Carne É Fraca”, “Foodmatters”, “Forks over Knives”, “Blackfish”, “Meat the Truth”, “Food Inc.”, ….

“Tem um nome pra isso [que a gente vive]: é especismo, o preconceito entre espécies. ‘Por que você ama tanto o seu cachorro, mas vê um porquinho, que faz as mesmas brincadeiras e é até mais inteligente, e consegue imaginá-lo virando presunto, mas não consegue imaginar comer a coxa do seu cachorro?’ Não faz sentido”, questiona.

“Por que, então, alguns animais são, digamos, dignos de nossa compaixão e outros não?”, pergunto.

“Costume. O ser humano tem preguiça de mudança de comportamento. Principalmente quando se trata da sua dieta. As pessoas mudam de religião, de visão política, mas mudar a dieta… E é a coisa mais simples. Porque só depende de você. Pra você fazer uma mudança grandiosa no mundo, tem que esperar lei, governo, quando, na verdade, parar de consumir produto de origem animal é uma das maiores mudanças que podem ser feitas.”

Pra te ajudar a refletir, ele também selecionou algumas músicas inspiradoras. Aperte o play!

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