LUKE CAGE: HERÓI DE ALUGUEL!

Claudio Basilio
sobrequadrinhos
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26 min readNov 30, 2022

Cinquenta anos em 2022. E em março de 1972 o mundo foi apresentado a um super-herói da Marvel um tanto quanto fora dos padrões convencionais do gênero. Um super-herói que teve uma carreira editorial cheia de altos e baixos. Um super-herói que apesar de todos os percalços e equívocos na sua caracterização encontrou o seu lugar dentro da mitologia da Casa das Ideias. Um super-herói que surgiu dentro de um contexto histórico muito específico, mas que permanece entre nós até hoje. Para aqueles que ainda não perceberam estamos falando de Luke Cage, que será o tema deste artigo que vocês estão lendo neste exato momento! Por favor, continuem conosco e saibam mais sobre uma longa saga que envolve tendências cinematográficas, caras durões, conversas de malandro, artistas marciais e, é claro, muito super-heroísmo!

Blaxploitation

E no início da década de setenta os EUA estavam em efervescência. O patriotismo em torno da Guerra do Vietnã lentamente diminuía, e por outro lado a quantidade de protestos políticos aumentava de forma drástica nos campi das universidades estadunidenses. Nas ruas das grandes cidades a Contracultura e a Segunda Onda do Feminismo ditavam tendências, e o Movimento dos Direitos Civis vivia o rescaldo dos assassinatos do Reverendo Martin Luther King Jr. e Malcolm X. Grupos negros radicais como o Partido dos Panteras Negras ganhavam proeminência e, enquanto isso uma pequena revolução artística acontecia no Cinema Americano.

Na primeira metade do Século XX a indústria cinematográfica dos EUA produziu alguns filmes voltados para a audiência afro-americana. Hoje conhecidos como “race films” ou “race movies”, essas obras eram estreladas por atores de ascendência africana e geralmente evitavam temas polêmicos como o racismo endêmico do país, preferindo se focar nos aspectos mais positivos da comunidade negra. No princípio da década de cinquenta a produção dessas películas mingou, mas no começo dos anos setenta em meio a uma crise criativa e financeira que assolava Hollywood eles ressurgiram, com uma nova e impactante alcunha: Blaxploitation!

Cartaz de Sweet Sweetback’s Baadasssss Song (1971), filme dirigido e estrelado por Melvin Van Peebles que inaugurou o Cinema Blaxploitation.

Junção das palavras “black” e “exploitation” (“exploração”, em Inglês), Blaxploitation foi um movimento artístico que teve o seu marco inicial em 1971 com o lançamento do filme Sweet Sweetback’s Baadasssss Song, protagonizado e dirigido por Melvin Van Peebles (pai do renomado diretor Mario Van Peebles) e onde o cafetão Sweet Sweetback foi acusado injustamente de um crime. Também em 1971 chegou nas telonas Shaft, película estrelada por Richard Roundtree que narrava os perrengues de um detetive particular negro na decadente Nova York setentista. Essas duas obras foram um estrondoso sucesso de público e crítica, geraram uma onda de filmes similares e definiram as principais características do Cinema Blaxploitation: histórias ambientadas em grandes centros urbanos, em especial nos guetos negros; temática quase sempre policial; protagonistas de moral ambígua e dotados de inegável sex appeal que não levavam desaforo para casa em relação ao racismo; e brilhantes trilhas sonoras recheadas de jazz, soul e funk compostas por bambas como Curtis Mayfield, James Brown, Isaac Hayes e Earth, Wind and Fire.

Cartaz de Shaft (1971), um dos mais emblemáticos filmes do Cinema Blaxploitation.

O Cinema Blaxploitation não agradou a todos: dentro da própria comunidade afro-americana muitos criticaram a violência excessiva que ele mostrava e a caracterização aparentemente estereotipada dos seus personagens principais, porém é inegável que o sucesso desses filmes levou ao estrelato atores como Pam Grier, Jim Kelly, Diana Sands, Fred Williamsom, Tamara Dobson, o já citado Richard Roundtree e muitos outros. Também é inegável que essas películas foram um local onde a população negra dos EUA finalmente encontrou em termos audiovisuais o mínimo de protagonismo artístico.

E enquanto isso… do alto de um prédio em Manhattan um certo escritor e editor chamado Stan Lee a tudo observava. De observação em observação Lee chegou a uma conclusão: havia chegado a hora da Marvel traduzir a “linguagem” blaxploitation para os seus gibis. Havia chegado o momento da Casa das Ideias ter um super-herói negro “de responsa” a frente de uma revista de quadrinhos!

Desenvolvimento

No amanhecer dos anos setenta a Marvel tinha dois personagens negros de certo relevo: Pantera Negra e o Falcão. O Senhor de Wakanda é considerado o primeiro super-herói negro de todos os tempos, mas o fato dele ser homônimo de um grupo radical de esquerda eventualmente poderia trazer problemas para Marvel, então o seu uso imediato como estrela de uma publicação própria foi descartado (embora a partir de 1973 ele tenha protagonizado uma série de brilhantes histórias publicadas na revista Jungle Action). Quanto ao Falcão… bem, ele era o parceiro do Capitão América no gibi Captain America and The Falcon, e na opinião de Stan Lee esse personagem estava bem no seu título original. Ficou claro para Lee que a opção mais interessante era criar um novo herói negro, e com esse propósito ele procurou o roteirista Roy Thomas, o seu futuro sucessor no cargo de editor-chefe da Marvel.

Roy Thomas achou a proposta de Stan Lee interessante, mas não se sentiu apto a desenvolvê-la sozinho, então ele chamou para ajudá-lo o escritor Archie Goodwin, que tinha no currículo a experiência com personagens negros nos quadrinhos de terror da Warren Publishing. O desenhista John Romita Sr. também foi convocado a dar sugestões, e a partir da sua chegada o desenvolvimento do novo herói da Marvel de fato começou.

Stan Lee, Roy Thomas, Archie Goodwin, John Romita Sr., George Tuska e Billy Graham: os quadrinistas envolvidos na criação de Luke Cage.

As habilidades do vindouro herói foram modeladas a partir de Hugo Danner, protagonista de Gladiator, romance escrito por Philip Wylie e lançado em 1930 que supostamente foi uma das principais influências na criação do Superman. A intenção não era tornar o personagem um peso-pesado do nível do Homem de Aço ou Hulk (até porque desde o início foi estabelecido que as ruas e guetos de Nova York seriam o seu habitat), mas deixar claro que ele teria dons sobre-humanos, no caso uma limitada superforça acrescida de invulnerabilidade a armamentos leves. Já o seu nome teve uma origem curiosa: de forma inconsciente Roy Thomas se inspirou em Chane — um personagem que o desenhista Gil Kane pretendia usar em uma de suas histórias — , e batizou o novo herói com o proverbial nome de Cage. Mais tarde Archie Goodwin acrescentou Luke na denominação, e a pedido de Thomas e com o consentimento expresso de Stan Lee também foi agregado a alcunha de Cage a expressão “Herói de Aluguel” (“Hero for Hire”, no original em Inglês), que havia sido incidentalmente usada por Thomas em uma história dos Vingadores.

Capa de Marvel Preview #9 (1976), revista da Casa das Ideias que adaptou para os quadrinhos Hugo Danner, personagem literário que foi uma das inspirações para Luke Cage. Arte de Earl Norem.

John Romita Sr. foi encarregado do visual de Luke Cage, partindo da premissa que ele não deveria ter a aparência típica de um super-herói. Com isso em mente Romita Sr. até deu para o personagem as botas de “bucaneiro” que eram usuais em muitos aventureiros fantasiados, porém conferiu para Cage uma camisa amarela aberta até a altura do abdômen, com o propósito de gerar contraste com a sua cor de pele. Para finalizar Romita Sr. adornou o novo herói com uma tiara, braceletes e uma corrente amarrada na sua cintura, sendo que esse último item era uma clara alusão ao Escravismo Negro que durante muito tempo assolou os EUA.

Definidas as linhas gerais de Luke Cage, o corpo editorial da Marvel convidou para desenhar o título do herói George Tuska, um veterano que dada a sua experiência com revistas policiais nos anos cinquenta seria perfeito para a função. Para garantir a consistência na representação dos personagens afro-americanos do gibi foi chamado para a arte-final Billy Graham, um ator, dramaturgo e bon vivant assumido que naquele período era o único artista negro trabalhando na Marvel.

Capa de Luke Cage: Hero for Hire #1 (1972), a primeira revista da Marvel estrelada por um super-herói negro. Arte de John Romita Sr.

E assim da forma mais entusiasmada possível no primeiro semestre de 1972 Stan Lee anunciou para os fãs na Stan’s Soapbox (uma coluna que ele escrevia para os gibis da Marvel na época) o lançamento da primeira edição de Luke Cage: Hero for Hire, que contaria com o roteiro de Archie Goodwin, arte da dupla George Tuska e Billy Graham e uma capa desenhada por John Romita Sr. claramente inspirada nos cartazes dos filmes blaxploitation. Por uma grande coincidência a nova revista surgia no momento em que os EUA discutiam as consequências da Rebelião de Attica, uma insurreição ocorrida em setembro de 1971 num presídio localizado no interior do estado de Nova York, onde os presos exigiram o fim dos maus tratos e uma reforma completa do sistema prisional americano. Acreditem se quiserem: as questões levantadas pela Rebelião de Attica estavam intimamente ligadas a origem de Luke Cage! Continuem nos acompanhando para entender tal ligação…

Origem

Luke Cage: Hero for Hire #1 começa nos apresentando dois malandros do Harlem que viviam de pequenos delitos: Carl Lucas e Willis Stryker. O primeiro era tão bom com os punhos quanto o segundo era com facas, e a grande amizade que havia entre eles foi estremecida quando surgiu em cena a bela Reva Connors. Por causa do comportamento violento de Stryker a moça preferiu ficar com Lucas e novo casal pretendia juntar os trapinhos, mas as coisas não tiveram um “final feliz”: louco de ciúme Stryker plantou drogas no apartamento do seu ex-amigo e o denunciou para a polícia. Lucas foi condenado pela Justiça e mandado de mala e cuia para Seagate, um presídio de segurança máxima tão barra-pesada que tinha o singelo apelido de “Pequena Alcatraz”, e posteriormente Reva morreu em uma emboscada armada por adversários de Strkyer.

Ao chegar em Seagate o recalcitrante Carl Lucas comeu o pão que o diabo amassou nas mãos dos seus “colegas” de presídio — em especial de uma dupla de meliantes de alta periculosidade chamada Shades e Comanche — e de Albert “Billy Bob” Rackham, um sujeito racista até o último fio de cabelo que por acaso era o chefe de segurança da carceragem. Não demoraria muito para Lucas sair de Seagate dentro de um caixão, mas o seu Destino esbarrou com do Dr. Noah Burstein.

Cena de Luke Cage: Hero for Hire #1 (1972), que mostra o experimento que deu superpoderes para Carl Lucas. Arte de George Tuska e Billy Graham.

O Dr. Burstein estava em Seagate com o propósito de encontrar entre os prisioneiros alguém que se voluntariasse a um experimento eletroquímico de regeneração celular que em tese revolucionaria a Medicina. Sem muitas opções Carl Lucas topou participar do processo, porém no exato momento em que ele tomava um banho de produtos químicos o desagradável Albert Rackham deu o ar da sua graça e tentou sabotar a experiência científica. Por muito pouco Lucas não morreu, e após o término do experimento ele constatou que estava muito mais forte do que o normal e que sua pele estava invulnerável, e fazendo uso das suas recém-descobertas habilidades sobre-humanas ele decidiu fugir de Seagate.

Carl Lucas promete vingança diante de tumulo de Reva Connors e veste pela primeira vez seu uniforme, em cena extraída de Luke Cage: Hero for Hire #1 (1972). Arte de George Tuska e Billy Graham.

Durante a sua fuga Carl Lucas foi dado como morto pela equipe de segurança de Seagate, e incógnito rumou para Nova York com o objetivo de se vingar de Willis Stryker. Quando chegou na cidade Lucas constatou que seria interessante usar seus superpoderes para levantar um dinheirinho, e então ele tomou um conjunto de ações: comprou uma roupa espalhafatosa; assumiu o nome de Luke Cage; alugou junto a David “D. W.” Griffith (um rapaz gente boa que informalmente se tornou o “secretário” de Cage e que por “coincidência” era homônimo do cineasta que dirigiu O Nascimento de uma Nação, um dos filmes mais racistas de todos os tempos) um escritório em cima de um cinema decadente na Times Square; e passou a vender seus serviços super-heroicos e investigativos a quem pagasse melhor.

Caloteiro

Ao analisarmos a origem de Luke Cage é fácil constatarmos que a situação do sistema prisional mostrada nela é uma clara referências a já citada Rebelião de Attica, e alguns pesquisadores da Nona Arte acreditam que o experimento que deu superpoderes ao herói era uma alusão ao Caso Tuskegee, uma pesquisa científica sobre a sífilis realizada entre 1932 e 1972 onde cidadãos afro-americanos foram usados de forma pouco ética como cobaias. Algum tempo depois um retcon explicou que a intenção do Dr. Noah Burstein com a sua experiência era recriar o Soro do Supersoldado (fórmula que transformou o franzino Steve Rogers no Capitão América), e já que falamos do bom doutor, bem… ele abriu uma clínica no Harlem voltada para a população carente, e em pouco tempo ambos se reencontraram. Por acaso o Dr. Burstein era auxiliado pela belíssima médica Claire Temple, e não demorou muito para ela e Cage engatarem um romance.

Capa de Luke Cage: Hero for Hire #5 (1973), onde os leitores descobrem que não se dever mexer com Maria Sombria! Arte de Billy Graham.

Archie Goodwin escreveu as quatro primeiros números de Luke Cage: Hero for Hire, e posteriormente foi substituído por autores como Steve Englehart, Len Wein, Gerry Conway e Tony Isabella. Em uma leitura atenta das aventuras iniciais do herói perceberemos claramente que esses roteiristas tinham a intenção de criar para Luke Cage uma galeria de malfeitores pitorescos parecida com a do Batman e Homem-Aranha, e assim bandidos matusquelas como Cascavel (alcunha adotada por Willis Stryker), Maria Sombria, Gideon Mace, Sr. Peixe, Boca de Algodão e outros cruzaram o caminho do Herói de Aluguel. Mas… o grande desafio de Luke Cage no começo da sua carreira super-heroica envolvia um vilão de maior peso.

Capa de Luke Cage: Hero for Hire #9 (1973), onde o Herói de Aluguel foi cobrar uma dívida do Doutor Destino. Arte de Billy Graham e Morrie Kuramoto.

Nas edições #8 e #9 de Luke Cage: Hero for Hire Steve Englehart concebeu uma aventura onde o irascível Herói de Aluguel foi contratado por ninguém mais ninguém menos que o Doutor Destino, que pretendia usar os talentos de Cage para rastrear alguns dos seus robôs que estavam escondidos em Nova York. Cumprida a missão, o nosso herói foi cobrar a conta de duzentos dólares pelo serviço e… tomou um calote do Soberano da Latvéria! Inconformado, o Protetor do Harlem pegou emprestado um jato do Quarteto Fantástico e foi até a Latvéria cobrar o caloteiro safado… e surpreendentemente derrotou o Doutor Destino em um combate corpo a corpo, que ficou tão impressionado com audácia de Cage que não só pagou a dívida como ofereceu um emprego fixo para ele! Naturalmente, o Herói de Aluguel não quis virar empregado do tirano latveriano…

Linguajar

O propósito de Steve Englehart ao criar o embate de Luke Cage com o Doutor Destino foi opor um homem, digamos assim, “rude” contra um dos mais sofisticados vilões da Marvel, e o resultado foi no mínimo risível. E aí precisamos entrar em alguns outros detalhes pouco sutis sobre a gênese do Herói de Aluguel.

Luke Cage: Hero for Hire foi um dos lançamentos prioritários da Casa das Ideias em 1972, e o seus claros objetivos eram aumentar a representatividade negra no universo ficcional da Marvel e atrair o público afro-americano para as suas demais revistas, porém… apesar de não ser um fracasso de vendas o título do Herói de Aluguel não foi exatamente um um hit nas paradas de sucessos. Talvez — só “talvez” — a caracterização de Luke Cage fosse a culpada por isso.

Luke Cage quebra o pau e fala no seu peculiar dialeto, em cena retirada de Luke Cage: Hero for Hire #6 (1973). Arte de Billy Graham e Paul Reinman.

Christopher Priest (que foi o primeiro escritor e editor negro tanto da Marvel quanto da DC Comics e que escreveu aventuras do Luke Cage nos anos oitenta) afirma que em seus primórdios o Herói de Aluguel traduzia a visão equivocada que pessoas brancas de classe média (no caso todos os argumentistas originais do personagem) tinham sobre homens negros e periféricos. O roteirista, editor e produtor televisivo Dwayne McDuffie foi um pouco mais longe em sua análise: cheio de expectativas ainda jovem ele comprou as primeiras edições de Luke Cage: Hero for Hire assim que elas chegaram nas bancas de jornal, só que ele se decepcionou profundamente com o que leu… já que o herói do Harlem se expressava em um linguajar carregadíssimo de gírias e quase ininteligível, e até aquele momento o pequeno McDuffie nunca havia conhecido uma pessoa negra que falasse daquele jeito!

Capa de Luke Cage: Hero for Hire #15 (1973), onde Albert Rackham, Shades e Comanche partem para a desforra contra Luke Cage. Arte de Billy Graham de Danny Crespi.

Dwayne McDuffie entende que os escritores das primeiras aventuras de Herói de Aluguel não agiram de má-fé ao criarem o léxico “peculiar” de Luke Cage, mas ele tem uma hipótese sobre a sua origem: provavelmente esses roteiristas se inspiraram nos romances policiais de Chester Himes, um autor negro que para fins humorísticos gostava de colocar em seus escritos ambientados no Harlem personagens com diálogos intencionalmente estereotipados. Seja como for o pessoal do escritório da Marvel deve ter percebido que alguma coisa não estava “pegando bem”, tanto que a partir de Luke Cage: Hero for Hire #16 o roteirista Len Wein (que tinha na indústria de quadrinhos a fama de ser um escritor bom com “sotaques”) amenizou o “palavreado malandro” de Luke Cage. Porém, no final de tudo ocorreu aquilo que Roy Thomas falou em um depoimento registrado no livro Five Fabulous Decades of the World’s Great Comics: “Dá certa vergonha (…) Dá para fazer negros comprarem gibis sobre brancos, mas era difícil fazer brancos comprarem gibis nos quais o personagem principal é negro”.

Capa de Luke Cage: Power Man #17 (1974), onde Luke Cage adota o apelido de Poderoso. Arte de Gil Kane.

E então… entre “linguajares populares” e esterótipos pouco dignificantes Dwayne McDuffie teve a sua “vingança” em relação ao Herói de Aluguel ao criar em 1994 para a revista Icon o simpático Buck Wild, uma debochada paródia do Luke Cage, mas… isso é outra história para outro momento!

Poderoso

E aos poucos Luke Cage foi interagindo com os outros heróis da Marvel. Como já falamos aqui em Luke Cage: Hero for Hire #9 o adorável Cage pediu emprestado uma aeronave para o Quarteto Fantástico, e em 1973 ele foi contratado por J. Jonah Jameson para capturar o Homem-Aranha em The Amazing Spider-Man #123, que trouxe a primeira história do herói aracnídeo após o assassinato de Gwen Stacy nas mãos do Duende Verde. No segundo semestre de 1974 ao lado dos Defensores (superequipe que tinha como membros principais o Doutor Estranho, Hulk e o Príncipe Submarino) o herói do Harlem encarou a Gangue da Demolição nos números #17 a #19 de The Defenders. Ah, e antes que nos esqueçamos: no final de 1975 nos gibis Fantastic Four #168 a #170 o Poderoso foi contratado pelo Sr. Fantástico para substituir o Coisa, que havia perdido os seus superpoderes. O sobrinho favorito da Tia Petúnia não gostou nem um pouco dessa substituição e uma cizânia se estabeleceu entre os dois aventureiros, e aí… esperem um minuto! Agora há pouco nós chamamos Luke Cage de Poderoso? Vamos explicar as coisas, então…

Capa de Fantastic Four #168 (1976), onde Luke Cage se torna integrante do Quarteto Fantástico. Arte de Rich Buckler e Joe Sinnott.

A partir do número #17 a revista Luke Cage: Hero for Hire foi rebatizada como Luke Cage: Power Man, e há duas hipóteses para essa mudança: a primeira é que não era de bom tom o único super-herói negro da Marvel com um gibi próprio ser classificado como um mercenário (“Herói de Aluguel”, se lembram?) e o adequado seria que ele possuísse uma alcunha mais heroica como Poderoso (“Power Man”, no original em inglês); a segunda trabalha com a possibilidade da Marvel querer reforçar os direitos autorais e trademark da expressão “Poderoso/Power Man”, apesar da Casa das Ideias já ter um vilão homônimo dos Vingadores. Aliás, Cage quebrou o pau com ele por causa do uso do nome em 1974 no gibi Luke Cage: Power Man #21, e de forma muito óbvia o Protetor do Harlem ganhou a luta e o apelido “Poderoso”.

Capa de Luke Cage: Power Man #21 (1974), onde Luke Cage ganha na porrada o direito de usar o apelido de Poderoso. Arte de Ron Wilson e Frank Giacoia.

Apesar da mudança cosmética de nome gradativamente a revista do Luke Cage passou a enfrentar dificuldades sérias nas bancas de jornal. Alguma providência mais radical precisava ser tomada para reverter a queda nas vendas, e ela envolveria o estabelecimento da parceria do Poderoso com outro super-herói que também passava por apertos no seu gibi…

Parceiro

Na mesma época em que o Blaxploitation tomou de assalto as salas americanas de cinema outra onda cinematográfica capturou a atenção do publico estadunidense. Batizada com o nome de Chopsocky, esse conjunto de filmes era majoritariamente produzido em Hong Kong e foi caracterizado pela ação desenfreada baseada em Kung Fu, tendo na mítica figura de Bruce Lee o seu maior representante. A Marvel — que de boba não tinha nada — tentou tirar proveito da “Moda Kung Fu” e lançou títulos protagonizados por artistas marciais como Shang-Chi, Filhos do Tigre, Tigre Branco e por ele… o imortal Punho de Ferro!

Capa de Power Man and Iron Fist #50 (1978), revista que oficializou a parceria de Luke Cage com o Punho de Ferro. Arte de Dave Cockrum e Irv Watanabe.

Criado por Roy Thomas e Gil Kane em 1974 e estreante na revista Marvel Premiere #15, o Punho de Ferro era Daniel Rand, um jovem americano que durante anos passou por uma intensa preparação marcial em K’un-Lun, uma cidade extradimensional onde o combate desarmado era o estilo de vida da população. Como resultado do seu treinamento Rand era capaz de concentrar o seu “chi” (que segundo a tradição chinesa é a energia vital que todos seres vivo possuem) nos punhos, tornando-os tão rígidos quanto ferro.

O Punho de Ferro teve uma boa quantidade de histórias interessantes publicadas em Marvel Premiere e Iron Fist (o seu titulo próprio de periodicidade bimestral), mas aos poucos o público foi perdendo o interesse em suas aventuras, tornando o cancelamento da sua revista um fato incontornável. Todavia, de forma esperta a Marvel arrumou uma nova casa para ele…

Cena de Luke Cage: Power Man #48 (1977), que mostra o primeiro e nada amistoso encontro de Luke Cage e Punho de Ferro. Arte de John Byrne e Dan Green.

Em 1977 nos números #48 e #49 de Luke Cage: Power Man o escritor Chris Claremont e o desenhista John Byrne (que produziam as aventuras de Daniel Rand em Iron Fist) colocaram o Punho de Ferro frente a frente com Luke Cage, em uma história onde o gangster Bushmaster tentou reproduzir o experimento eletroquímico que deu poderes para o Herói de Aluguel. De peripécia em peripécia o Protetor do Harlem se tornou parceiro do Punho de Ferro, se livrou das antigas acusações que o haviam levado para a cadeia e assumiu legalmente o nome Luke Cage. Ah, é claro: aproveitando a deixa a partir da edição #50 a Marvel mudou o nome da revista Luke Cage: Power Man para Power Man and Iron Fist, tornando o Punho de Ferro o coprotagonista do gibi.

Cena de Power Man and Iron Fist #66 (1980), onde as Filhas do Dragão (Misty Knight e Colleen Wing) estão prestes a resgatar uma antiga relíquia. Arte de Kerry Gammill e Ricardo Villamonte.

Além do Punho de Ferro o simpático Luke Cage herdou da revista Iron Fist as Filhas do Dragão, uma dupla de investigadoras particulares constituída pela samurai nipo-americana Colleen Wing e Mercedes “Misty” Knight, ex-policial nova-iorquina que após a explosão de uma bomba teve seu braço direito substituído por uma prótese biônica. Curiosidades interessantes: assim como Luke Cage a durona Srta. Knight foi criada em 1975 no gibi Marvel Premiere #21 por Tony Isabella e Arvell Jones sob forte influência do Cinema Blaxploitation, na prática se tornou a primeira super-heroina negra da Marvel (ela estreou alguns meses antes da Tempestade, integrante dos X-Men) e foi protagonista junto com o Punho de Ferro do segundo beijo inter-racial da história da Casa das Ideias.

Figurinha

Entre um serviço contratado ali e uma atividade heroica pro bono acolá Poderoso e Punho de Ferro adentraram nos anos oitenta. Os quadrinistas Mary Jo Duffy, Trevor Von Eeden, Kerry Gammill e Kurt Busiek investiram forte no “bromance” entre os dois heróis, e o contraste entre o lado “mauricinho” de Daniel Rand e o jeitão de “homem do povo” de Luke Cage muitas vezes dava aos escritores de Power Man and Iron Fist oportunidade para explorar situações bem-humoradas em suas aventuras. Porém… um belo dia a eterna volatilidade do mercado americano de comic books atingiu em cheio o gibi dos dois heróis.

Capa de Power Man and Iron Fist #125 (1986), que marca o fim da primeira série estrelada em conjunto por Luke Cage e Punho de Ferro. Arte de Mark D. Bright e John Beatty.

No ano de 1986 Power Man and Iron Fist foi cancelada após o lançamento do número #125, com uma trama escrita por Christopher Priest e desenhada por Mark D. Bright onde o Punho de Ferro foi assassinado pelo Capitão Herói, uma criança que conseguia se transformar em um adulto dotado de habilidades super-humanas. No “frigir dos ovos” Luke Cage foi considerado o principal suspeito pela morte do seu melhor amigo e novamente se tornou um foragido da Justiça.

Entre 1987 e 1990 Luke Cage se tornou uma figurinha difícil no universo ficcional Marvel, praticamente desaparecendo dos gibis da editora. Todavia em 1991 na série Namor: The Sub-Mariner (estrelada pela Príncipe Submarino) o quadrinista John Byrne “ressuscitou” o Punho de Ferro, revelando que na verdade a sua morte foi um engodo executado pelo Super-Skrull (adversário do Quarteto Fantástico e a verdadeira identidade do Capitão Herói) e Mestre Khan, um antigo inimigo de Daniel Rand dos anos setenta. Luke Cage era novamente um homem inocente, mas isso não significava que ele retomaria a parceria heroica com seu velho amigo.

Capa de Cage #1 (1992), revista onde Luke Cage recomeçou a sua vida em Chicago. Arte de Dwayne Turner e Christopher Ivy.

Em 1992 as comic shops estadunidenses receberam a primeira edição de Cage, uma nova série mensal onde um Luke Cage livre, leve, solto e com uma indumentária novinha em folha se estabeleceu em Chicago e passou a combater o crime por lá, sendo ocasionalmente acompanhado pela investigadora particular Dakota North. E, como uma graninha é sempre bem-vinda Cage vendeu a exclusividade da cobertura dos seus feitos heroicos para o Chicago Spectator, um jornal local.

Capa de The Punisher #60 (1992), onde Luke Cage se alia ao Justiceiro, que providencialmente está disfarçado como um homem negro. Arte de Val Mayerik.

As histórias escritas por Marc McLaurin para Cage tinham um certo charme, mas a grande verdade é que ninguém deu bola para elas, tanto que e série foi cancelada após a vigésima edição. Talvez o “grande momento” (entre aspas mesmo!) dessa fase de Luke Cage tenha sido o seu encontro com o impiedoso anti-herói Justiceiro, que ocorreu entre as edições #60 e #62 do gibi The Punisher. Um detalhe interessante desse crossover: nele o Justiceiro estava disfarçado como um… homem negro! Por razões gritantes muita gente não considerou este um dos melhores momentos da história da Marvel…

Capa de Heroes for Hire #1 (1997), onde o Punho de Ferro e Luke Cage lideram uma nova equipe de super-heróis. Arte de Pasqual Ferry e Jaime Mendoza.

Após o cancelamento da sua revista Luke Cage deu uma passadinha como astro especialmente convidado nos gibis Secrets Defenders e Thunderstrike no período que vai de 1994 e 1996, até que em 1997 ele voltou a ter o mínimo de protagonismo em Heroes for Hire. A nova série criada por John Ostrander e Pasqual Ferry surgiu na esteira da saga “Massacre” (que terminou com o Quarteto Fantástico e os Vingadores desaparecendo da face da Terra) e mostrou o Punho de Ferro tentando reorganizar os heróis remanescentes do planeta em uma nova superequipe, entretanto o seu prazo de validade foi curtíssimo e ela foi encerrada em 1999 após a décima nona edição.

Anal

No início do XXI Luke Cage era uma figura de terceiro escalão da Marvel, um personagem cujas aparições esporádicas estavam restritas a Marvel Knights, uma revista que trazia os heróis mais urbanos e “pés no chão” da Casa das Ideias. Mas, de onde menos se esperava um raio de esperança surgiu para o velho Herói de Aluguel.

No ano de 2001 com o lançamento da revista Alias — roteirizada por Brian Michael Bendis e desenhada por Michael Gaydos — a Casa das Ideias botou na praça Max, um selo editorial reservado para materiais de conteúdo mais maduro que o usualmente publicado pela editora. Alias era estrelada por Jessica Jones, uma ex-heroína que sustentava seu gosto por cigarros e scotch trabalhando como detetive particular, e já que falamos de bebida logo na sua primeira edição a moça foi tomar um trago em um bar pertence a Luke Cage, que naquele momento estava semiaposentado das atividades heroicas. E então… entre um golezinho e outro Jones e Cage foram para a cama, e na cena mostrada aos leitores foi sugerido que ambos praticaram… o intercurso carnal por via anal, digamos assim!

Cena polêmica de Alias (2001), onde Luke Cage e Jessica Jones fazem sexo. Arte de Michael Gaydos.

A cena de sexo entre Jessica Jones e Luke Cage causou polêmica, tanto pelo suposto “ato anal” quanto por mostrar um homem negro se relacionando com uma mulher branca, e uma das gráficas que trabalhavam com a Marvel se recusou a imprimir esta edição de Alias. A presença de Luke Cage na revista de Jessica Jones não foi uma escolha incidental de Brian Michael Bendis: fã de carteirinha do personagem desde a infância, Bendis entendia que dada a sua origem o Herói de Aluguel seria perfeito como personagem recorrente nas histórias urbanas e policiais de Alias. E para melhorar ainda mais as coisas de forma inteligente o roteirista aos poucos foi desenvolvendo a relação cheia de idas e vindas de Cage e Jones, mostrando que mesmo duas pessoas adultas e aparentemente bem resolvidas podiam se complicar na hora de “acertar os ponteiros”!

Capa de Cage #1 (2002), minissérie protagonizada por Luke Cage e ambientada no universo gangsta. Arte de Richard Corben.

As aparições de Luke Cage em Alias fizeram os editores da Marvel vislumbrar o potencial oculto no herói, e então através do selo Max em 2002 foi lançada Cage, uma minissérie em cinco capítulos fora da continuidade da Casa das Ideias e produzida por Brian Azzarello e Richard Corben. Na história mergulhada na Cultura Hip-Hop apresentada por Azzarello e Corben um Luke Cage gangsta e cuja caracterização era inspirada em rappers como Notorius B.I.G. e Nas é contratado para vingar a morte de uma adolescente, que havia sido assassinada por uma gangue nova-iorquina. Sobraram críticas negativas a Azzarello e Corben pelo texto repleto de palavrões e pela representação pouco lisonjeira dos guetos nova-iorquinos mostrada em Cage, mas após o seu término ficou claro para os editores da Marvel que o Herói de Aluguel merecia ter destaque no Universo Marvel, e Brian Michael Bendis estava mais do que disposto a tomar essa tarefa para si.

Vingador

Brian Michael Bendis usou com muito gosto o Herói de Aluguel nas séries mensais The Pulse (uma espécie de continuação mais “suave” de Alias), Daredevil (Demolidor) e em Secret War, uma minissérie de espionagem que reuniu alguns dos principais heróis da Marvel, e no fim o escritor fez com que Luke Cage e Jessica Jones ficassem “grávidos”, tendo uma linda filhinha batizada com o nome de Danielle Cage. Antes que nos perguntem: sim, o nome da menina foi uma homenagem de Cage ao Punho de Ferro, o seu melhor amigo.

Capa da segunda impressão de New Avengers #1 (2005), revista que marcou a entrada de Luke Cage nos Vingadores. Arte de David Finch.

Entre o final de 2004 e o começo de 2005 Brian Michael Bendis foi incumbido dos roteiros de New Avengers, um gibi que tinha como objetivo relançar os Vingadores com uma renovada formação que trazia integrantes como o Wolverine, Homem-Aranha, Mulher-Aranha e, é claro, o inefável Luke Cage, que apresentava uma pequena, porém importante mudança em sua aparência: ele estava com o couro cabeludo depilado!

Capa de New Avengers Annual #1 (2006), onde Luke Cage e Jessica Jones oficialmente juntaram os trapinhos. Arte de Olivier Coipel e Mark Morales.

Nas suas aparições em Alias, Cage, The Pulse e Daredevil o Herói de Aluguel vestia roupas despojadas, alternava entre a exibição de um bigode e de um cavanhaque estiloso no rosto e na maioria das vezes apresentava uma touca esperta na cabeça. A explicação de Brian Michael Bendis para a careca de Cage é no mínimo divertida: o roteirista assistiu uma entrevista onde o ator e humorista Damon Wayans explicou que o seu cabelo raspado o deixava “mais legal e poderoso” como comediante. Não foi difícil para Bendis concluir que se a ausência de fios capilares funcionava para Wayans certamente ela funcionaria ainda melhor com um super-herói da Marvel, ora pois!

Capa de Power Man and Iron Fist #2 (2016), onde Luke Cage revive a parceria com o Punho de Ferro. Arte de Sanford Greene.

No transcorrer da nova série dos Vingadores o Protetor do Harlem trocou alianças com Jessica Jones em New Avengers Annual #1 e em várias ocasiões se tornou o líder da equipe, e de liderança em liderança no ano de 2010 ele foi destacado para o comando dos Thunderbolts, um grupo composto por supervilões reformados. Para completar o quadro de proeminência em 2016 a série Power Man and Iron Fist foi revivida pelos quadrinistas David F. Walker e Sanford Greene, que em suas quinze edições prestaram uma irreverente homenagem as aventuras setentistas da dupla de super-heróis, e dentro do mesmo espírito também 2016 os leitores foram agraciados com Cage!, uma minissérie divida em quatro capítulos escrita e desenhada pelo renomado animador Genndy Tartakovsky. A única coisa que estava faltando para Luke Cage era sair das páginas coloridas dos quadrinhos e visitar outras mídias.

Prefeito

No ano da graça de2015 a Netflix botou no ar Jessica Jones, um seriado que adaptava as aventuras da investigadora particular da Marvel para a televisão. Na pele do ator Mike Colter o aprazível Luke Cage apareceu em alguns episódios de Jessica Jones, e em 2016 também pelas mãos da Netflix ele ganhou uma série televisiva para chamar de sua. A adaptação para a telinha das histórias do Protetor do Harlem — seguidas da sua participação na minissérie Os Defensores — tiveram bons resultados artísticos, mas desacordos contratuais entre a Netflix e a Disney (conglomerado de mídia do qual a Marvel faz parte) fizeram com que ela ficasse restrita a duas temporadas, totalizando vinte e seis episódios que hoje podem ser revistos no serviço de streaming Disney+.

Cartaz da primeira temporada da série televisiva do Luke Cage, onde Mike Colter carrega o Harlem em suas costas.

Na esteira de sua série televisiva em 2017 Luke Cage ganhou mais uma revista mensal que durou dez edições, onde David F. Walker e Nelson Blake II fizeram o herói lidar com as consequências do falecimento do Dr. Noah Burstein. E então chegamos no ano de 2021, e como um “esquenta” para a comemoração dos cinquenta anos da estreia do Herói de Aluguel a Casa das Ideias anunciou Luke Cage: City of Fire, uma minissérie de três capítulos onde acompanhado de vários artistas o renomado escritor Ho Che Anderson prometia redefinir o papel do marido de Jessica Jones no Universo Marvel. Mas aí…

Capa variante de Devil’s Reign #6 (2022), onde Luke Cage é aclamado como Prefeito de Nova York. Arte de Dan Panosian.

Sem maiores explicações Luke Cage: City of Fire foi cancelada antes mesmo de chegar nas comic shops, e tudo indicava que em 2022 não haveria nenhuma comemoração especial relacionada ao cinquentenário do Protetor do Harlem, mas o escritor Chip Zdarsky e o desenhista Marco Checchetto concluíram a saga “Reinado do Demônio” (onde o Rei do Crime coordenou um ataque contra todos os super-heróis da Marvel) com um fato improvável e interessante: Luke Cage entrou no Mundo Encantado da Política… e se elegeu prefeito de Nova York! Em um futuro não muito distante veremos como os quadrinistas da Marvel lidarão com a nova carreira do Herói de Aluguel.

Exemplo

Nós já falamos que em 2022 comemoramos o cinquentenário do Luke Cage? Falamos, sim! Falamos também que a sua trajetória quadrinística foi repleta de grandes sucessos e de fracassos retumbantes, entretanto há algo que talvez não tenha sido dito neste textão: pesando os prós e os contras temos certeza que o Herói de Aluguel divertiu e foi um exemplo positivo para milhares de leitores de todas as etnias mundo afora, incluindo um certo ator ítalo-americano chamado Nicolas Kim Coppola, que inspirado no primeiro herói negro a estrelar uma revista da Marvel adotou o nome artístico de… Nicolas Cage! Provavelmente conviveremos muito com o Sr. Cage nas próximas cinco décadas!

Os heróis da Marvel saúdam Luke Cage na última página do quarto capítulo de Cage! (2016), minissérie escrita e desenhada pelo animador Genndy Tartakovsky (Laboratório de Dexter, Hotel Transilvânia).

Ah, antes de terminar este longo artigo temos que passar um conjunto de informações relevantes para os colecionadores de quadrinhos: Luke Cage estreou no Brasil em 1973 na revista Luke Cage: Herói de Hoje, da pequena Editora Gorrion. Posteriormente a fase inicial do Herói de Aluguel foi relançada pela Editora Abril entre 1982 e 1985 no saudoso gibi Superaventuras Marvel. A mesma Editora Abril apresentou as histórias do período clássico de Power Man and Iron Fist de forma esparsa em várias das suas revistas entre os anos de 1986 e 1992, e não podemos nos esquecer de citar que algumas aventuras dessa época foram reunidas pela Panini em 2017 no encadernado Coleção Histórica: Paladinos Marvel #2. A segunda série mensal de Luke Cage e Heroes for Hire passaram em brancas nuvens por aqui, mas o seu bizarro encontro com o Justiceiro apareceu em 1995 nos gibis Wolverine #38 e X-Men #79, da Editora Abril. Alias aportou na terra descoberta por Cabral em 2003 na revista mensal Marvel Max da Panini, e foi publicada por lá até 2005, além de ter sido relançada nos últimos anos em algumas edições especiais pela mesma editora. As cinco primeiras edições de Marvel Max trouxeram a polêmica série concebida por Brian Azzarello e Richard Corben, e o tempo em que Luke Cage atuou nos Vingadores é continuamente mostrado para os fãs brasileiros desde 2006 em diversas revistas mensais e republicações da Panini, que entre 2017 e 2018 editou na íntegra as histórias de Power Man and Iron Fist criadas por David F. Walker e Sanford Greene em três encadernados intitulados Luke Cage e Punho de Ferro. Finalizando tudo de vez precisamos avisar os desavisados que “Reinado do Demônio” chegou nas bancas de jornal brasileiras na forma de duas edições especiais no final de 2022.

E, para todos aqueles que generosa e pacientemente nos acompanharam nesta longa viagem pela vida de Luke Cage só podemos falar:

E TENHO DITO!

Para saber mais:

Wikipedia: Luke Cage

The Complete Marvel Reading Order: Lista de aparições de Luke Cage nos EUA

Guia dos Quadrinhos: Lista de aparições de Luke Cage no Brasil

Comic Book Resources: os cinquenta anos de Luke Cage

13th Dimension: os cinquenta anos de Luke Cage

Polygon: A Vida de Luke Cage

Sean Howe: Marvel Comics — A História Secreta

Danny Fingeroth: A Espetacular Vida de Stan Lee

Les Daniels: Marvel — Five Fabulous Decades of the World’s Great Comics

Twomorrows: American Comic Book Chronicles — The 1970s

Twomorrows: Back Issue #45

DK Publishing: Marvel Year by Year, a Visual History

Marvel: FOOM Magazine #2

Jornalismo Junior: Blaxploitation, um cinema de revolta

Netflix: A História do Cinema Negro nos EUA

Comic Book Resources: os dez vilões mais legais de Luke Cage

Comic Book Resources: Doutor Destino deve uma grana para Luke Cage

Interminable Rambling: Christopher Priest e sua opinião sobre Luke Cage

The Beat: Dwayne McDuffie fala sobre Luke Cage e Buck Wild

Youtube: Dwayne McDuffie e a sua hipótese sobre o linguajar de Luke Cage

Comic Book Resources: Luke Cage vira membro do Quarteto Fantástico

Netflix: Luzes, Câmera, Kung Fu

Wikipedia: Punho de Ferro

Wikipedia: As Filhas do Dragão

Vulture: Luke Cage e Brian Michael Bendis

Comic Book Resources: dez fatos sobre o relacionamento de Luke Cage e Jessica Jones

Comic Book Resources: o cancelamento de Luke Cage: City of Fire

Grand Comics Database: Luke Cage: Hero for Hire (1972)

Grand Comics Database: Luke Cage: Power Man (1974)

Grand Comics Database: Luke Cage: Power Man and Iron Fist (1978)

Grand Comics Database: Cage (1992)

Grand Comics Database: Heroes for Hire (1997)

Grand Comics Database: Alias (2001)

Grand Comics Database: Cage (2002)

Grand Comics Database: The Pulse (2004)

Grand Comics Database: Cage! (2016)

Grand Comics Database: Power Man and Iron Fist (2016)

Grand Comics Database: Luke Cage (2017)

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Claudio Basilio
sobrequadrinhos

Apenas um rapaz latino-americano que gosta de falar de Quadrinhos e Cultura Pop. E de outros assuntos também!