Colaboração é outra coisa: entenda a diferença entre colaboração e cooperação

Bruno C Furtado
Somos Tera
Published in
5 min readMay 15, 2020

Colaboração e cooperação são conceitos diferentes. Entenda a diferença entre eles e saiba como aplicar cada um em sua equipe ou organização

Há um tempo atrás, havia uma série de frases nos moldes do exemplo abaixo que esclareciam os desavisados sobre o que não é o amor, como uma não-definição com uma pitada de humor:

“O AMOR NÃO TE DEIXA SALTITANTE. O NOME DISSO É POGOBOL. O AMOR É OUTRA COISA.” — autor desconhecido [para mim, ao menos]

Eu gosto dessa abordagem de definição às avessas porque ela reconhece a nossa ignorância nestes temas.

Muitas das vezes em que ouço falar sobre Colaboração, sinto que precisaríamos lançar outra série de frases neste formato para esclarecer o conceito, porque nem sempre o que rotulam como colaboração é, de fato, colaboração. Fica aquele ruído na comunicação, aquele duelo de “expectativa versus realidade”. E isso me incomoda.

Lançaria algo do tipo:

“A colaboração não transforma seu ‘time’ em ‘squad’.
O nome disso é anglicismo.
Colaboração é outra coisa.”

“Algo de errado não está certo”

Investigando um pouco mais sobre isso, descobri que não estou sozinho com este incômodo: Lynn Power expressou — com precisão cirúrgica — a minha inquietação neste trecho do seu artigo “Collaboration vs. Cooperation. There Is a Difference.” (que tomei a liberdade de traduzir):

“(…) embora muitas pessoas falem muito sobre colaboração, a maioria está apenas cooperando.” —( Sim, doutora. É aí que dói.)

E avança trazendo essas definições de Jeremy Roschelle e Stephanie D. Teasley:

Colaboração é uma atividade coordenada e síncrona que é o resultado de uma tentativa continuada em construir e manter uma concepção compartilhada de um problema.

Cooperação é atingida pela divisão do trabalho entre os participantes como uma atividade em que cada pessoa é responsável por resolver uma porção do problema.

Acho que é essencial fazer essa distinção entre os conceitos e compartilho deste entendimento que eles apresentam. Ao meu ver, na modalidade da Cooperação não há uma premissa de ter objetivos comuns, mas existe clareza do que se espera entre as partes. Pode ser que a Cooperação aconteça por uma obrigação de processos organizacionais; por definições de papéis com accountabilities bem definidas; ou, até mesmo, por benefícios mútuos.

Já na Colaboração se dá de forma orgânica e espontânea. Nesta modalidade, não há um foco em se definir responsabilidades e sim no atingimento de um objetivo. Aliás, a participação de todos acaba sendo bastante fluida, devido à natureza incerta do problema e da solução.

Obs.: Vamos deixar claro aqui que uma abordagem não é melhor do que a outra. Só precisamos saber se são as ferramentas adequadas para o problema que queremos atacar.

Cada um no seu quadrado

O mundo do trabalho passou por um processo intenso de especialização, seguindo um paradigma cartesiano e departamental. Nesse paradigma, os problemas são analisados (quebrados em pedaços menores) e, geralmente, resolvidos individualmente:

“Eu faço a minha parte e você faz a sua, beleza?”

Desempenho, Competição, Padronização, Previsibilidade, Linearidade são palavras que me vem à cabeça. Os organogramas atuais ainda refletem este paradigma, assim como suas estruturas de incentivos. E, sim, isso foi fundamental para avançarmos como Humanidade.

Atletista em corrida de revezamento com bastão roxo à mão.
Photo by Zach Lucero on Unsplash

Neste sentido, nos habituamos a trabalhar de forma cooperativa. Cada setor tinha muito claro qual era a sua parte do trabalho e a coordenação dos trabalhos era resolvida de forma centralizada, com comando e controle. A passagem de bastão para as outras especialidades (ou departamentos) era bem definida.

Apesar do sucesso em contextos conhecidos e bem estabelecidos, exploramos bastante este paradigma e acabamos esbarrando em outras fronteiras que desafiam novamente o nosso modelo mental. Entramos no mundo VUCA (volátil, incerto, complexo e ambíguo) e é aí que precisamos da capacidade sistêmica da Colaboração.

Colaboração como capacidade sistêmica

Bonsai parcialmente iluminado por luz natural.
Photo by Alex Holyoake on Unsplash

Em meu último artigo, eu tangenciei essa perspectiva da colaboração ser uma capacidade sistêmica, mas se não soubermos quais elementos propiciam a colaboração como podemos cultivá-la?

Não podemos obrigar um time a colaborar, mas podemos promover um ambiente em que a colaboração possa prosperar:

Propósito vivido coletivamente coerente com os motivadores individuais: mais do que alinhamento, precisamos de autenticidade no que nos impulsiona individualmente;

Comprometimento dos membros com o resultado final: um alicerce que une “todos no mesmo barco” e reforça o item seguinte;

Confiança: para possibilitar uma construção conjunta;

Interdisciplinaridade: para habilitar o diálogo entre os diferentes conhecimentos e habilidades necessários para a solução;

Conexão entre repertórios diversos: pois cada experiência individual é única e traz parte do problema (e parte da solução);

Autonomia: para encontrar uma combinação ótima entre liberdades, responsabilidades e limites;

Segurança: para que a colaboração não seja inibida pelo freio do medo desnecessário.

Esses elementos nutrem a colaboração. Quais deles você está aportando ao seu ambiente de trabalho?

Deixo aqui uma citação, que roubei deste artigo “A Shared Purpose Drives Collaboration”, e que ilustra bem a importância do propósito:

“Se você quer construir um navio, não chame as pessoas para juntar madeira ou atribua-lhes tarefas e trabalho, mas sim ensine-os a desejar a infinita imensidão do oceano.” — Antoine de Saint-Exupéry

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