Como ajudar motorista de aplicativo a equilibrar jornada de horas de trabalho com qualidade de vida? — Estudo de caso de UX

Natalia Tiemi Ota
Somos Tera
Published in
8 min readFeb 27, 2020

Este é um estudo de caso para contar a experiência de 7 dias de aprendizado durante o bootcamp intensivo de UX Design da Tera em janeiro de 2020.

Imagem de um entregador de bicicleta pedalando, com o desafio descrito em cima.

O desafio inicial apresentado consistia em pensar em como ajudar o motorista de aplicativo a equilibrar jornada de horas de trabalho com qualidade de vida.

Primeira etapa do projeto e já existia o questionamento se motorista de aplicativo seriam os entregadores (como iFood e Rappi) ou se seriam motoristas que transportam pessoas (como Uber e 99). Por interpretação do grupo, optamos por focar nos entregadores de aplicativo.

Desk Research

Após a primeira decisão tomada, caminhamos para dar início às pesquisas. Iniciamos uma desk research para compreender como era o sistema de entrega dentro dos aplicativos, ou seja, entender como eles funcionavam para os entregadores. Assim, veríamos como são os aplicativos, desde o cadastro dos usuários nas plataformas, até as entregas.

Escolhemos os principais aplicativos de entrega e queríamos abranger tanto entregadores de bicicleta, quanto de moto.

Entendendo o desafio

Depois da desk research, destrinchamos o desafio e levantamos principais perguntas para fazer para o nosso usuário, entregador de aplicativo.

1. O que é qualidade de vida para ele?

2. Quais suas maiores dores?

3. Como é a sua jornada de trabalho?

Nesse momento, tínhamos como objetivo entender como é a jornada de horas de trabalho (quantas horas trabalham, quantos dias por semana) e o que é qualidade de vida para o usuário.

Primeira fase de pesquisa — Entendendo o usuário

Partimos para alguns seguimentos de pesquisa para fazer uma pesquisa exploratória e tentar responder as principais perguntas levantadas.

Entramos em 3 grupos de Facebook exclusivos para entregadores de aplicativos para analisar e entender o comportamento do nosso usuário e lançamos um formulário online, onde obtivemos 60 respostas.

E fizemos 14 entrevistas presenciais com entregadores no método de guerrilha.

Debriefing — primeiras conclusões

Durante as pesquisas, vimos que qualidade de vida era difícil de mensurar, uma vez que cada um tem uma visão do que é qualidade de vida em si e alguns não souberam dizer. Então vimos que poderia ser um problema de compreensão das palavras ou que eles não sabiam o que para eles era ter qualidade de vida.

Em compensação, foi mais fácil para eles dizerem quais as maiores dificuldades no trabalho, e a partir daí identificamos que a segurança era uma dor muito presente, mais especificamente relacionada ao percurso e acidentes.

No início queríamos abordar usuários de moto e bicicleta, porém ao analisar as pesquisas, foi possível perceber que alguns problemas de usuários de bicicleta eram diferentes dos que trabalham de moto.

Portanto, sentamos para reescrever o desafio que tinha sido apresentado.

Como ajudar o entregador de bicicleta de aplicativo a ter uma jornada de trabalho com mais segurança.

Segunda fase de pesquisa

Fizemos uma segunda guerrilha com 11 entregadores de aplicativo, agora focada em usuários de bicicleta e falando apenas sobre segurança, uma vez que é influenciada diretamente pelo risco e medo de acidentes.

81% dos entrevistados já sofreram ou conhecem alguém que já sofreu um acidente de bicicleta no meio de uma entrega.

Durante as entrevistas, os entregadores nos revelaram que uma das principais causas desses acidentes é a pressa, ou seja, eles correm demais e acabam se acidentando. E percebemos que a demanda dos pedidos/entregas não é sequencial. O discurso deles não é o que eles vivenciam, eles querem entregar rápido, mas eles têm a evidência, de que na maioria das vezes, existe uma espera de uma entrega para a outra.

"Eu tô sentado aqui esperando e não toca. Qualquer hora vai tocar. Então, não adianta eu fazer a corrida e voltar pensando que eu vou sentar aqui e já vou ter outro pedido. Não vai, vai demorar." — Bruno, 30 anos

E então criamos um mapa de empatia, onde colocamos os principais comportamentos observados e as necessidades que os entrevistados nos contaram.

Personas

Após a consolidação das entrevistas e análise do mapa de empatia, identificamos dois tipos de persona. Sendo um mais velho, que é mais responsável, e tem fatores externos que influenciam nessa responsabilidade, como família. E um mais novo, que é mais imprudente e não tem tantos fatores externos que influenciam.

Jornada do usuário

Apesar de termos duas personas, a jornada é a mesma. Resolvemos dar ênfase à jornada dos entregadores dentro do aplicativo.

Compreendendo o problema

Após analisar nosso caminho até aqui, a nossa primeira ideia foi pensar em uma solução que auxiliaria o entregador após ele sofrer um acidente, assim a jornada dele não encerraria quando ele se machucasse.

Mas quando voltamos para analisar o mapa de empatia, percebemos que o usuário não tinha tanto interesse em uma ajuda no pós acidente, pelos seguintes motivos:

Já existe o SAMU, mas ele demora para chegar.

Eles preferem, muitas vezes, ir andando para casa.

E também porque voltamos para a nossa desk research, e aprofundamos ainda mais. E foi onde encontramos o Seguro de Acidentes Pessoais do iFood. Um benefício lançado no final de 2019, com a última atualização feita em dezembro de 2019. Ele não tem custo para o entregador, e por ser recente, ainda não existem dados públicos de como ele funciona, como custos e gastos para o iFood. E ainda não são todos os entregadores que tem conhecimento desse benefício.

Compreendemos então que o iFood é uma empresa que se preocupa com os entregadores que trabalham no aplicativo.

E como a empresa apresentou uma solução para o pós acidente, pensamos que seria a oportunidade de pensar em uma solução que ajudasse na prevenção de acidentes.

Resolvendo o problema

Atualmente, como funciona o fluxo do aplicativo para o entregador? Percebemos que ele se assemelha com a jornada do usuário que montamos em uma etapa anterior.

Nossa solução proposta foi pegar ferramentas já existentes dentro do aplicativo e dar novas utilidades para elas. Assim, melhorando um sistema já conhecido pelo usuário, assim os entregadores já estariam acostumados com o fluxo e não haveria dificuldades para adaptação.

Identificamos que o iFood tem uma ferramenta que calcula o tempo estimado para uma entrega, ou seja, o tempo que o entregador irá demorar do local de partida, até o de chegada. E utilizamos ela como um meio para gerar mais segurança.

Pegamos o fluxo atual do app quando o entregador aceita uma entrega e atuamos em como melhorar esse sistema com um sistema de bonificação.

54% dos entrevistados da segunda pesquisa ressaltaram que uma das maiores dificuldades do trabalho era a baixa remuneração.

Vimos uma oportunidade de agir em cima de dois problemas (segurança e remuneração). E chegamos à conclusão que a nossa solução deveria ser estimular o entregador a maximizar seus ganhos e que para isso, ele teria de pedalar com mais cautela.

Solução desenvolvida

Nossa proposta foi criar uma forma de incentivo de segurança no percurso do entregador. Trazer um feedback um pouco mais detalhado no final de cada corrida, falando para o entregador que se ele entregar dentro do tempo estimado pelo aplicativo, ele tem chance de ganhar mais.

Esses novos feedbacks seriam categorizados de duas formas, corridas seguras e corridas perigosas.

Corridas seguras, após 5 dias consecutivos realizando apenas corridas dentro do tempo estimado, ele teria 1 dia com tarifa dinâmica (ferramenta também já existente dentro do iFood e que o entregador já tem conhecimento), que é um multiplicador do valor da entrega, como forma de bonificação.

Corridas perigosas, em caso de corridas que foram entregues em tempo muito menor que estimado, seria um indício que o entregador correu rápido demais e, consequentemente, que ele correu o risco de sofrer um acidente. Dessa forma, o feedback seria um aviso para ele reduzir a velocidade e que com essa performance, ele deixou de ganhar mais, ou seja, deixou de ganhar a tarifa dinâmica.

E por que isso seria vantajoso para o iFood?

A nossa solução é forma de incentivo de segurança no percurso do entregador, que consequentemente ajuda na prevenção de acidentes, e isso diminui o sinistro do seguro para a empresa.

Questionamentos, melhorias e conclusões

Esse projeto foi realizado em 7 dias, um dos maiores aprendizados que tivemos foi ter empatia sempre. Entendemos que as histórias que lemos em notícias sobre entregadores, nem sempre mostram a realidade vivida por eles.

Como não tivemos tempo de testar e validar essa ideia com os entregadores, um dos próximos passos seria validar essa solução e verificar o quão eficaz seria essa medida no ponto de vista deles. Algumas dúvidas levantadas no final do estudo foram em relação ao real custo para o iFood com o seguro de vida e o sinistro, como essa nova funcionalidade seria entregue para o usuário, e, se essa solução não se aplicaria também a usuários de moto.

Uma das maiores dificuldades foi não se apegar a solução. No decorrer do estudo, tivemos várias ideias de como solucionar os problemas que os entregadores nos relatavam. Entretanto, algumas não eram viáveis, ou não resolviam a real dor deles e então tivemos sempre que voltar às pesquisas para entender ainda mais nosso usuário.

Podemos concluir que esse estudo não está acabado, que na verdade, precisaria de mais aprofundamento e erros a serem corrigidos. Foi uma experiência imersiva, que nos proporcionou momentos de reflexão, oportunidade de desenvolver um projeto (mesmo que incompleto) e MUITA troca de experiência, seja entre os experts, os participantes do bootcamp ou com os próprios usuários! O processo de UX é pesquisa e aprendizado constante, acredito que seja a melhor forma de entregarmos projetos cada vez melhores, e atender ainda mais as necessidades dos usuários.

Agradecimentos especiais ao meu grupo: Carolina Pimenta, Carolina Ferraresi, Leandro Oliveira e Nicole Bach.

Obrigada por terem lido até aqui!

Foi uma experiência incrível e já estou preparada para a próxima.

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