Como UX Design me fez visualizar o rolê da pesquisa sociolinguística de um jeito diferente.

Gabriel Sanpêra, ou Pêra
Somos Tera
Published in
5 min readMar 10, 2020
Torre de Babel

Meu curso de User Experience na Tera está chegando ao final. Fica sempre aquele gostinho de quero mais.

Eu trabalho há um tempo no terceiro setor e atualmente curso Letras. O universo de jornadas de usuário, testes de usabilidade e post its espalhados por tudo que é canto não era um terreno em que já havia pisado antes. Lia o termo UX em lugares e observava com o estranhamento de quem pensa “ei, é de comer?”

Na imagem temos a torre de Babel. Símbolo que atordoa muita gente. Fala sobre confusão, encontro de idiomas. Sobre um mundo onde novos falares se atravessam o tempo inteiro e foi aí que tropecei em um curso de UX, trabalhando em uma escola de economia digital.

Pavê ou pacumê?

O profissional de UX, tem em sua rotina atividades que estão focadas em resolução de problemas. Ele é literalmente um “ resolvedor de problemas”. Ele é responsável por auxiliar uma pessoa a realizar algo do ponto A ao ponto B, num produto digital por exemplo.

Esse profissional vai mapear experiências de uso, reação, isso gerará uma jornada que demonstrará também o relacionamento desse indivíduo com o produto digital os afins. Nossa experiência enquanto usuário, nossa jornada pode começar desde um simples clique em um site de compras. Até algo que envolva efeitos físicos, psicológicos, como ser barrado em uma porta giratória dentro de organização bancária X,Y ou Z.

Já no lado de cá, indivíduos que trabalham com linguagem ajudam pessoas a decodificar línguas, idiomas, simbologias e gírias. A entender esse encontro louco que ocorre quando um paulista vai a Manaus, e conhece novas formas de falar algo.

Afinal. Assumir uma língua é assumir uma cultura. E por isso o governo português com escolas de reformatório por determinado tempo obrigou o ensino de seu idioma de berço a população indígena e escravizada.

Um exemplo básico está acima. Vários falares estão em extinção. E durante o passar dos tempos uma forma de falar acaba sendo destacada e introduzida na educação e comunicação enquanto outras estão cada vez mais desaparecendo. Temos acima o tronco linguístico da comunidade indígena. Riquíssimo mas com número de falantes em extinção.

E neste rebú, entra o profissional de sociolinguística. Ele vai realizar entrevistas e pesquisas para entender a jornada deste signo novo ( deste elemento ) na língua e isso vai se dar de várias formas. Que seja indo até o local onde este idioma está sendo veiculado, ouvir, gravar formas de falar algo, perguntas a pessoas sobre seus ancestrais e a relação deles com determinada palavra. Vão entender os regionalismos, e tudo que há por este mundo.

E tcharannnn….. temos neste processo toda visualização de jornada do usuário com a língua que considera materna.

No curso de UX, aprendemos que todos estamos em processos de criação e co-criação o tempo todo e isso faz de nós Designers, interagindo e iterando em sociedade.

As pesquisas sociolinguísticas dialogam muito com o que chamamos de UX Research, que são métodos de pesquisa voltadas a entender a relação do usuário com o produto desenvolvido para melhorar sua jornada de ponto A ao ponto B.

Por exemplo. Auxiliar pessoas a encontrarem informações de nota fiscal em um site simples de compra. Auxiliar pessoas que utilizarão pela primeira vez o metrô como mostrado em um case dentro do curso de UX da Tera .

O profissional de Letras, pode ganhar muito com todo este processo a partir do momento em que enxerga contatos com linguagem como jornada de usuário. Assim como podemos ler também nos artigos de Marcus Lyra . Uma inspiração para esta postagem aliás.

Em uma pesquisa sociolinguística temos o informante. Um falante do idioma visto como objeto na pesquisa, e que nos fornecerá informações relavantes sobre. E documentos de registro de pesquisa, ocorrências de determinadas palavras por região ou até mesmo ao longo do tempo.

Eu dei toda esta volta para entender que na verdade enquanto profissional de Letras interajo o tempo todo com processos onde auxilio pessoas a se conectarem com a linguagem, com o encontro de suas histórias- estórias e sobre os sentido que querem dar a coisas que veem e experienciam ao longo de sua jornada de vida.

Aqui temos um pequeno exemplo de mapa de jornada realizado em coletivo. O propósito é entender os pontos de contato do usuário com o contexto-produto analisado.

Mapa de jornada em análise de caso voltado a saúde.

Profissionais de Sociolinguística podem utilizar mapas de jornada para entender melhor a relação entre:

  1. Língua e indivíduo
  2. Sociedade e idioma

E isso vai ainda mais fundo. Podemos por exemplo aplicar métodos de UX Design aliados a educação para melhorar a relação de estudantes de escola pública no primeiro contato com outro idioma por exemplo. Inclusive, tivemos uma ótima aula com Diana Fournier no módulo de pesquisa com usuário.

Mapeando seus pontos de contato. Suas primeiras reações em sala de aula ao visualizar um idioma que é estranho no primeiro contato. E assim identificamos o que chamamos de dores, que são obstáculos no ponto de contato deste usuário com o objeto analisado. Suas necessidades, medos…

Inventário Nacional da Diversidade Linguística (INDL)- O formulário fornece um roteiro básico dos temas de pesquisa.

E como isso rola em Letras?

Para finalizar, que amo falar mas podemos separar isso noutro bloco. Em uma pesquisa sociolinguística temos as seguintes etapas :

Identificação das localidades onde a língua é falada;
Caracterização do território da língua.

Caracterização da comunidade linguística.

Recursos documentais; Pessoas de referência; Instituições.

Transmissão da língua de referência; Escrita e leitura; Situações de uso; Atitudes linguísticas na comunidade; Síntese.

E tudo isso demonstra o quanto o processo para estudar uma linguagem fala também sobre experiência do usuário e sobre UX. Este artigo foi uma mistura de diversão com coisas que queria a muito tempo dizer pois foram ferramentas que me empoderaram enquanto indivíduo. Ferramentas em UX e em Letras que ajudaram gerações a se reconhecerem como povo. Em um contexto em que pessoas reconhecem apenas a norma culta como algo correto, como uma carteirada a ser seguida.

Pra quem quer se aprofundar ❤ Link

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Gabriel Sanpêra, ou Pêra
Somos Tera

escrevo e isso para mim é como engatinhar pela segunda vez