Morte e Vida de um Buraco Negro

Eduardo Jubran Pascual
Space Talks
Published in
6 min readSep 19, 2021

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Ilustração de um buraco negro. Créditos: Mark Garlick/Science Photo Library

O universo é repleto de corpos que possuem um certo ar misterioso: estrelas de tamanhos incompreensíveis para noções humanas, asteroides que vagam pelo cosmos sem rumo específico, planetas rochosos ou gasosos onde vidros caem do céu, formados por puro diamante ou (talvez o ainda mais estranho) um planeta onde formas de vida surgiram e foram capazes de desenvolver meios de entender o universo. Porém, sem dúvida, um dos mais intrigantes corpos celestes são os buracos negros. Tendo um sido fotografado pela primeira vez pouco tempo atrás e famosos na cultura pop, aparecendo em filmes como Insterestellar, são conhecidos por serem grandes ralos, que sugam tudo, inclusive a luz, para dentro deles.

Foto de um buraco negro em ondas de radio. Créditos: Event Horizon Telescope collaboration et al. via National Science Foundation

Buracos Negros e Relatividade

Mas não é bem assim, já que como qualquer corpo (inclusive os nossos mas em uma escala muito pequena) eles distorcem o espaço-tempo que forma a nossa realidade, ou seja, eles possuem gravidade. Em teoria apenas coisas que possuem uma órbita baixa o suficiente são “sugados” pelo buraco negro, sendo que essa altura limite na qual os corpos começam a ser “engolidos” é chamada horizonte de eventos, pois a partir dela nem a luz, que possui a maior velocidade possível de ser atingida, é capaz de sair de sua órbita, o que segundo a relatividade implica em uma distorção no tempo de tal forma que para quem está na Terra ou em qualquer outro lugar do universo, ele ficaria estático. Note que nem tudo é sugado pelo buraco negro, mesmo na foto é possível ver uma quantidade considerável de energia e partículas (vistas no espectro de radio das ondas eletromagnéticas), que orbitam o buraco negro como se fosse um planeta ou estrela.

O que explica o fato deles serem capazes de fazer isso enquanto estrelas, que podem até ter mais massa do que alguns buracos negros, não? A resposta está na densidade, ou seja, no espaço que toda essa massa está concentrada. De forma bem simplificada, quanto maior a massa e menor o espaço, maior a distorção do espaço tempo, de forma que no limite a deformação é tanta que uma singularidade é formada, uma espécie de descontinuidade nesse tecido. Tendo em vista que um buraco negro não tem um tamanho mínimo, pode-se definir algumas classes desses astros. É teorizado que alguns são tão pequenos quanto um átomo, mas possuindo a massa de algumas centenas de toneladas, sendo chamados de Primordiais; a segunda classe são os mais comuns, chamados de Estelares, tendo o diâmetro de 20 km, mas com uma massa de até 20 vezes a massa do Sol. Já por último, tem-se os buracos negros Supermassivos, com a massa de um milhão de sóis, mas com o tamanho do nosso sistema solar “apenas”; esses são aqueles que se acredita encontrar no centro das galáxias, como o Sagitário A na Via Láctea, uma vez que possuem um campo gravitacional intenso o suficiente para atrair e manter em sua volta objetos muito distantes.

Ilustração da deformação do Espaço-Tempo. Créditos: Carin Cain

Nascimento

Tudo bem, existem buracos negros de todos os tamanhos, mas como exatamente eles se formam? Acredita-se que Buracos primordiais foram formados logo no início da vida do nosso universo, ou seja, logo após o Big Bang. Já os estelares e os supermassivos são o restante do fim da vida de algumas estrelas. De forma bem resumida, as estrelas durante todo o tempo estão em uma batalha interna: por um lado sua gravidade quer atrair suas moléculas para o seu centro, por outro a pressão resultante da fusão atômica no seu interior empurra as moléculas para fora. Conforme a estrela segue o seu rumo natural, a pressão ganha mais espaço, fazendo a estrela “inchar”, e se a massa resultante da fusão não for grande o suficiente, ela explode, gerando uma supernova e liberando os elementos que ela gerou pelo universo. Se, por outro lado, a gravidade ganha a batalha, sua massa é condensada em um volume pequeno, o que gera um buraco negro, cuja massa depende da massa da estrela geradora.

Esses corpos celestes, exatamente por terem uma gravidade muito intensa, em geral maior do que a estrela que antes estava no lugar, são vistos atraindo tudo que estão ao seu redor desde planetas, rochosos ou gasosos, até a luz e átomos de estrelas próximas; dai a fama de ralos destruidores do universo. Mas de forma nenhuma eles vagam pelo espaço caçando planetas e estrelas desavisados. Toda massa e energia absorvida por eles acabam por compor a sua própria massa, aumentando o seu tamanho e sua gravidade, o que por sua vez permite atrair objetos ainda mais distantes para o horizonte de eventos.

Buraco negro absorvendo uma estrela. Créditos: Carl Knox

Morte

Mas mesmos esses astros que desafiam as noções do tempo tem uma vida útil, depois de muito tempo eles deixam de existir. Um dos maiores nomes na investigação dos buracos negros foi Stephen Hawking, de tal forma que o mecanismo que dita a morte lenta deles recebe o nome do físico. A radicação de Hawking é o que faz o buraco negro aos poucos evaporar, Basicamente, segundo a teoria quântica, energia pode ser convertida em massa (a famosa fórmula de Einstein na relatividade restrita E=mc² mostra a relação entre massa e energia), mas sempre formando uma partícula e uma anti-partícula, que normalmente se colidem logo depois e voltam a se transformar novamente em energia. Porém esse processo pode ocorrer nas proximidades do horizonte de eventos, de forma que a energia gasta para formar essas partículas é proveniente do buraco negro; contudo, antes que essas partículas possam se aniquilar, uma passa pelo horizonte de eventos enquanto a outra é expelida para o resto do universo. Dessa forma a energia do buraco negro decaí minimamente, uma vez que esses corpúsculos não irão se aniquilar perto do buraco negro para que a energia seja reabsorvida. Repetindo esse processo durante muito tempo, o buraco negro deixa de existir, uma vez que toda sua energia (e massa) evaporam. Note que se o buraco negro absorver energia e massa, ele consegue reverter o seu relógio, uma vez que mais massa deverá ser evaporada. Obviamente a energia gasta nesse processo é mínima (comparada a energia do buraco negro), uma vez que a massa dessas partículas é minúscula, o que torna o decaimento por evaporação de Hawking um processo que demora mais de um googol de anos (10 elevado a 100 anos). Isso faz com que os últimos corpos celestes no universo, antes de tudo se transformar em energia, sejam os buracos negros supermassivos.

Digrama da radiação de Hawking

A observação empírica da morte de um buraco negro é atualmente impossível, assim como a verificação dos modelos físico-matemáticos utilizados. Porém aos poucos somos capazes de observar e entender cada vez mais o universo que nos cerca, e as vezes quem sabe observar previsões que antes era apenas teóricas, como foi o caso para as ondas gravitacionais de Einstein. A própria foto do buraco negro já é um grande avanço, pois permite a visualização de uma estrutura que havia sido prevista apenas matematicamente.

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Referências Bibliográficas:

[1] https://www.nasa.gov/audience/forstudents/5-8/features/nasa-knows/what-is-a-black-hole-58.html

[2] https://www.hiroshima-u.ac.jp/en/laboratory-updates/events/explaining-picture-of-black-hole

[3] https://astronomy.com/magazine/news/2021/02/the-beginning-to-the-end-of-the-universe-how-black-holes-die

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