Sistemas de ejeção de paraquedas usados no projeto Jupiter

Eduardo Jubran Pascual
Space Talks
Published in
8 min readJul 25, 2021

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Sejam bem vindos a mais um Space Talks! Hoje abordaremos uma das principais partes do projeto de recuperação de um foguete, o sistema de ejeção; contando um pouco dos sistemas que já foram e ainda são usado na equipe do Projeto Jupiter.

Uma das principais diferenças entre um foguete e um míssil é a capacidade do primeiro de ser recuperado sem grandes danos. Para isso é necessário um sistema de recuperação, que pode ser desde paraquedas, como nas missões Apollo, até sistemas mais complexos, como o pouso utilizando motores na SpaceX. No Projeto Jupiter já foram utilizados paraquedas de diversos modelos e com diferentes estratégias para melhorar seu desempenho. Porém independente das características do paraquedas, sempre é necessário projetar e construir um sistema capaz de impulsioná-lo (ejetá-lo) para fora do foguete: o sistema de ejeção.

Além disso, também é necessário um sistema de trava para evitar a abertura precoce do foguete antes do momento da ejeção. No caso do Projeto Jupiter os paraquedas são localizados logo abaixo da ponta, ou ogiva, do foguete. A ogiva tem mobilidade com relação ao resto do veículo, podendo deslizar sobre uma estrutura chamada shoulder. Quando deseja-se ejetar o paraquedas, é nesse lugar em que ocorre a abertura do foguete. Porém, para que ele não abra antes da hora, utiliza-se o sistema de trava, que será explicado também no texto.

Ampliação da ogiva. Em azul a fuselagem do foguete, em rosa o shoulder.

Sistemas de Ejeção

Existem diversos tipos de sistemas de ejeção, podendo usar gases, molas ou até explosões para empurrar o paraquedas. No projeto, diversos sistemas já foram utilizados, mas alguns foram abandonados por motivos de segurança ou dificuldade de montagem. Com isso, os dois sistemas que continuamos a utilizar hoje em dia são de certa forma semelhantes, uma vez que a ejeção é feita a partir da pressurização do módulo. Ou seja, no momento da ejeção, o módulo é preenchido com gases que geram uma força suficiente para empurrar a ogiva e o paraquedas.

Naturalmente, é necessário garantir que o paraquedas não seja ejetado e nem que a ogiva desprenda do foguete antes da hora e, para isso, é necessário que o sistema de ejeção seja bem controlado e confiável, além da implementação de uma trava segurar a ogiva até o momento certo.

Sistemas de ejeção abandonados

Dentre os sistemas abandonados tem-se dois em especial. O primeiro, usado apenas no primeiro foguete do grupo, não era um sistema propriamente dito, mas contava com uma porta na lateral do foguete que abriria no apogeu e liberaria o paraquedas; não é surpresa que esse sistema falhou já que o paraquedas não saiu do módulo. O segundo foi um sistema que contava com uma grande mola para empurrar e ejetar o paraquedas para fora do módulo; em uma primeira vista é de se pensar que era um sistema que funcionaria, porém como a mola deve ter uma constante elástica relativamente alta para alcançar a força necessária, a montagem, além de difícil, gera riscos para os participantes, pois a mola pode escorregar e acabar ferindo alguém.

Sistema pirotécnico

Um dos sistemas usados atualmente é o que o grupo chama de sistema pirotécnico, aplicado principalmente em mini foguetes (foguetes com três ou quatro polegadas de diâmetro), já que o paraquedas a ser ejetado é relativamente leve e, portanto, não é necessária uma força de ejeção muito grande.

O sistema conta com três câmaras onde há uma quantidade de pólvora suficiente para ejetar o paraquedas a uma distância de mais de 6 vezes o diâmetro do foguete — que é uma regra prática para o sucesso da ejeção. Assim, as câmaras contém os fósforos digitais (chamados e-matches) para causar a combustão da pólvora, que preenche quase todo o resto do espaço.

Seu funcionamento é bem simples: quando o foguete atinge o apogeu um sistema eletrônico localizado em outro módulo percebe a altitude por meio da pressão e envia um sinal eletrônico, ou seja uma corrente elétrica, para os e-matches; eles por sua vez conduzem esse sinal para as câmaras e iniciam a combustão. A ignição da pólvora libera gases em alta temperatura, que pressurizam o módulo e promovem a ejeção do paraquedas e da ogiva. Vale ressaltar que nesse mesmo momento a trava que segura a ogiva ao resto do foguete é cortada, permitindo que essa deslize pelo shoulder.

Em relação às molas, o sistema pirotécnico é mais seguro, pois a chance de ocorrer a combustão na montagem ou antes do apogeu são mínimas, e conta-se com 3 câmaras redundantes para diminuir a chance de falhas relacionada a não ignição da pólvora, uma vez que são necessárias apenas duas câmaras para ejetar o paraquedas. Além disso uma das principais preocupações desse sistema é a queima do paraquedas por conta dos gases quentes provenientes da ignição; para isso, é utilizado um disco de madeira MDF, para evitar o contato direto entre o tecido e os gases, e que acaba funcionado como um êmbolo durante a ejeção.

Sistema Pirotécnico

Sistema de CO2

O segundo sistema de ejeção, chamado de sistema de CO2, é usado em foguetes maiores (com cinco ou seis polegadas de diâmetro) uma vez que os paraquedas e ogiva são mais pesados. Esse sistema é ativado de maneira pirotécnica, com duas câmaras muito semelhantes às mostradas no sistema anterior. Ele é construído com duas estruturas redundantes, cada um com uma câmara de combustão, um e-match, um cilindro de gás carbônico pressurizado, um tubo de alumínio e um furador (uma peça cônica pontuda). Na montagem, temos a câmara na parte inferior, o tubo logo acima dela com o furador dentro e um cilindro de CO2 preso na sua extremidade superior.

Vista em corte do sistema de CO2

O sistema tem o mesmo princípio do pirotécnico — aumentar a pressão dentro do módulo para ejetar — mas a forma com que isso é feita é ligeiramente diferente. Primeiramente, a pólvora nas câmaras de combustão são ignizadas da mesma forma de antes com os e-matches, porém, dessa vez, a saída dos gases impulsiona o furador, que desliza ao longo do tubo, na direção do cilindro de CO2 perfurando-o e liberando o gás no módulo, que sai através de furos na lateral do tubo. Pode-se pensar esse momento como um extintor de incêndio quando abre-se a válvula, liberando o gás carbônico com alta pressão.

O furador possui um disco de borracha, de forma a vedar o seu contato com o tubo e garantir que os gases da combustão empurrem ele para cima; outro ponto importante é que o risco do furador prender na extremidade do tubo de CO2 é mínima, uma vez que o próprio gás carbônico pressurizado exerce uma força para empurrar o furador de volta. Por fim, além dos furos próximos ao cilindro de CO2, é necessário fazer um pequeno furo na base do tubo próximo à câmara de combustão, para que os gases da pólvora possam sair, mas sem comprometer o impulso do furador.

A confiança desse sistema é parecida com a do sistema pirotécnico, já que as chances da ejeção precoce são muito pequenas e há dois tubos de CO2 para redundância. Isso é bom, pois caso uma das câmaras não ignize ou o furador não seja impulsionado corretamente, existe ainda o outro sistema gêmeo capaz de ejetar o paraquedas.

Esse sistema é de certa forma flexível, pois variando a quantidade de CO2 é possível ejetar massas maiores ou menores. A quantidade usada no nos foguetes do Projeto Jupiter é definida na compra de cilindros de CO2 comerciais, disponíveis em quantidades de 15, 30 e 45g (podendo ser usadas 30, 60 ou 90g nos foguetes). Para isso, os cilindros são testados empiricamente, procurando uma configuração de CO2 e pólvora que permita que o peso associado ao paraquedas e ogiva sejam ejetados a uma distância de seis vezes o diâmetro do foguete.

Sistema de CO2 em operação

Sistema de Trava

O último sistema relacionado a ejeção é o sistema de trava, que como dito anteriormente, é responsável por prender a ogiva no lugar até o momento da ejeção. Nos nossos foguetes, ele é composto por dois parafusos em U, um na base da ejeção e outro na ogiva, duas câmaras de pólvora, dois e-matches e as cordas, que são chamados de fios de alma de paracord (fios que compõe as cordas que conectam o paraquedas ao foguete); esses fios são escolhidos pois, além de resistentes e finos, podem ser queimados, e são obtidos facilmente ao desfiar um paracord.

Monta-se o sistema prendendo os fios nos parafusos em U localizados nos dois cantos do módulo, mas passando por dentro das câmaras de pólvora, de forma que, quando necessário, os e-matches iniciam a combustão, cortam os fios e liberam a ogiva. Note que são usados duas câmaras por redundância para garantir o corte dos fios.

Sistema de Trava

O principal problema desse sistema está relacionado a sua montagem, pois a tração dos fios só pode ser feita após a montagem completa do módulo, o que torna muito difícil passar os fios pelas câmaras de combustão e prendê-los nos parafusos em U. Para minimizar essa dificuldade, criou-se uma espécie de polia que é presa no outro lado da base de ejeção, onde os fios podem ser enrolados e tracionados pelo lado de fora do módulo; porém por conta da pandemia do Covid-19 esse projeto ainda não pode ser testado.

Polia

Foram apresentados em detalhes três sistemas que compõe a parte da recuperação de um foguete, mas vale comentar que uma ejeção não é limitada a um paraquedas, podendo ser usada em outros projetos. Um exemplo disso, são os payloads (carga que o foguete é responsável por levar para grandes altitudes) deployable (ou ejetáveis), em que é necessário ejetar a carga com um paraquedas próprio e, portanto um sistema de ejeção próprio.

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