Ariel Barbeiro não é uma história de superação
A trajetória do Barbeiro traz outra mensagem
No último mês um novo meme surgiu e acabou se espalhando na internet.
O penteado blindado, nome dado pelo barbeiro Ariel Franco, trouxe estilo para a favela e chocou os moradores do asfalto. Quem mora do outro lado da ponte não consegue entender muito bem a cultura que vem da periferia.
Com rapidez esse estranhamento se transformou em curiosidade e Ariel Barbeiro alcançou sua tão merecida popularidade.
A VICE fez uma reportagem completa sobre o Ariel que vale a pena ser lida.
Moleque esperto desde novo, caiu nas graças do crime e teve que pagar pelos seus erros. Sua história é repleta de tentativas de ganhar a vida, desde vendendo produtos artesanais e fazendo o que era necessário.
Mas foi na prisão que Ariel teve acesso ao conhecimento de barbearia e desenvolveu suas habilidades. Com um misto de sorte e talento, saiu de lá como poucos presidiários saem, reabilitado e com uma profissão para seguir a vida.
A trajetória do Barbeiro com toda certeza será reformulada como uma das tantas histórias de superação, de que basta você querer e se esforçar que pode vencer a pobreza e as dificuldades.
Mas a história de Ariel não é sobre superação.
É claro que do ponto de vista pessoal, podemos dizer que ele venceu barreiras e alcançou seu espaço, mas observando na totalidade, temos que ter cuidado ao misturar Ariel e superação num mesmo conto.
A jornada de Ariel é muito maior do que ele, e demonstra como a falta de oportunidade e acesso ao conhecimento profissional, treinamento e capacitação fazem jovens inteligentes e incrivelmente talentosos serem recrutados pelo único grande empreendimento de olho nos talentos dos bairros pobres, o tráfico de drogas.
Ariel não deveria precisar passar por tudo isso para encontrar a profissão que mudou sua vida. Ele é um caso isolado de alguém que encontrou uma luz no fundo do poço, mas quantos outros jovens incríveis não vão morrer antes de encontrar uma oportunidade?
Quantos Ariel Franco não morrem diariamente em conflitos com a polícia, em guerras entre facções criminosas ou torturados em penitenciárias?
E é claro que quem erra precisa cumprir sua dívida com a sociedade. Ariel errou e pagou um preço alto por isso.
Mas quantos jovens não acabam no tráfico por um desvio na juventude, seduzidos pelo crime antes de encontrarem oportunidades, sem nunca mais receberem uma segunda chance.
A história do Ariel é sobre como a pobreza e a desigualdade são fábricas de criminosos. De como o acesso e a perspectiva de uma vida fazem toda diferença.
É uma demonstração categórica de que, sem tratar diretamente desses problemas fundamentais da sociedade, estaremos condenando milhões de jovens ao crime.
Como profetizava Racionais MC's em 1998, na música “Capitulo 4, Versículo 3”, a cada minuto um potencial Ariel se torna um efeito colateral de todas essas falhas da sociedade.
Quatro minutos se passaram e ninguém viu
O monstro que nasceu em algum lugar do BrasilTalvez o mano que trampa de baixo do carro sujo de óleo
Que enquadra o carro forte na febre com sangue nos olhosO mano que entrega envelope o dia inteiro no sol
Ou o que vende chocolate de farol em farol
Talvez o cara que defende o pobre no tribunal
Ou que procura vida nova na condicional
Alguém num quarto de madeira lendo à luz de vela
Ouvindo um rádio velho no fundo de uma cela
Ou da família real de negro como eu sou
Um príncipe guerreiro que defende o gol
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