Elon Musk precisa de ajuda

Ninguém viu o que de fato importava

Startup da Real
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Faz algum tempo tenho o costume de acompanhar o podcast do Joe Rogan, acredito que seja um dos melhores modelos de entrevista que existe por aí.

Com quase 3 horas de duração e conversando sobre assuntos dos mais variados, o modelo consegue se aprofundar em temas com personalidades que dificilmente vemos falar de forma mais aberta.

É fácil dar respostas treinadas em entrevistas de 15 minutos, mas é muito difícil sustentar uma máscara numa conversa filmada onde não existe muito controle sobre os temas que serão levantados.

Fiquei bem feliz ao ver que um dos entrevistados da semana passada seria Elon Musk. Não nutro nenhum apreço pessoal pelo empresário, mas acho que ele tem algumas coisas interessantes a serem ditas além do óbvio que vemos por aí.

Acho que nenhum outro lugar tem um modelo tão propício assim para conversas interessantes.

Infelizmente, a cena da maconha

Este é o menor ponto do podcast. O assunto que deveria ter menos repercussão de tudo o que foi dito — e até o que não foi — ao longo da entrevista.

Em 2:10 minutos de podcast, depois de beberem uma boa quantidade de Whisky, Joe Rogan pega um baseado e Musk Acaba experimentando.

Cheguei a fazer piada com a imagem da cena no Twitter por ser uma cena inusitada, mas confesso que me arrependo de ter levado tanta atenção para esse detalhe da entrevista.

Os dois consumiram uma boa quantidade de Álcool ao longo do programa. Uma droga que é sabidamente mais prejudicial que maconha e responsável por mais ocorrências médicas.

E é importante lembrar, fumar maconha é uma atividade legalizada no estado onde estavam filmando o programa.

Mais ainda, Musk nem chega a fumar de verdade. O vídeo mostra que ele apenas puxa e solta a fumaça rapidamente, longe de ser o suficiente para qualquer efeito real.

É curioso enfatizar que a atividade bem mais prejudicial e tão legal quanto que foi repetida ao longo de todo o programa, os vários goles de Whisky, não causaram nenhum comentário.

Uma outra atividade — tão legal quanto — que nem chegou a ser realizada na totalidade, causou todo esse alvoroço. E quando falo alvoroço, não são meia dúzia de pessoas postando fotos e fazendo memes, mas a queda das ações e uma investigação das forças armadas.

O que realmente importou na entrevista

Eu sei bem pouco sobre Elon Musk, nada muito além dos grandes feitos divulgados pela mídia. Mas não demorou muito para eu sentir que a fala estava um pouco travada e em vários momentos parecia que o empresário sul-africano estava prestes a despencar em lágrimas.

É muito fácil de notar que diante de assuntos que não envolvem seu grande sucesso e sua fama de gênio criativo, Musk engasga e parece extremamente contemplativo.

Por achar que a fala do empresário estava muito travada e com dificuldades de se expressar que não condizem com o amplo treinamento em relações públicas que alguém em sua posição é submetido, decidi pesquisar entrevistas antigas e comparar a desenvoltura.

A primeira que encontrei foi ainda desse ano num painel na SXSW. Elon Musk apresenta uma expressão de extremo cansaço, com a bolsa dos olhos inchada e o mesmo tipo de fala pausada perceptível na conversa com Joe Rogan.

Resolvi então procurar outras entrevistas mais antigas, porque as vezes o problema era apenas minha percepção. Existe a chance de Musk ter sempre sido esse cara exausto e com sinais de depressão, eu só não o acompanho o suficiente.

Mas não.

Numa entrevista em 2015 para o Vanity Fair, Musk apresenta um visual bem mais condizente com o que é socialmente esperado de um bilionário excêntrico, bem descansado e com uma fala fluida e muito mais eloquente.

Segui assistindo entrevistas mais antigas e a percepção seguiu a mesma. Em algum ponto entre o ano passado e este ano, as coisas começaram a ficar ruins para o bilionário. Talvez antes já não estivessem boas, mas agora isso transparece com muito mais força.

Não podemos presumir sobre a saúde mental de Elon Musk apenas pela mudança no tom de voz em suas falas e sua aparência física, mas juntando estes fatores aos excessos que vem cometendo no Twitter e nas polêmicas que passou a ser envolvido, o diagnóstico vai ficando mais evidente.

Então fui procurar entrevistas e reportagens sobre o estado mental do fundador da Tesla, e o que eu tinha como suspeita virou uma certeza.

Elon Musk não está nada bem.

Numa entrevista recente para o New York Times, essa percepção fica nítida.

Musk deixa claro durante toda entrevista que está tendo um ano “excruciante” e relata alguns momentos difíceis que têm atrapalhado sua vida.

Entre as citações mais contundentes temos a sensação de que o empresário sente falta da vida real.

“Houve vezes que fiquei três a quatro dias sem sair da fábrica e isso vem às custas de ver meus filhos e meus amigos”

Neste ponto o texto diz que Musk precisou parar e recuperar-se das emoções. E a entrevista segue dando mais indícios de que a rotina exagerada está acabando com a vida do empresário.

Sobre o dia do seu aniversário, Elon Musk conta que passou as 24 horas trabalhando:

“A noite toda, Sem amigos. Sem nada.”

Outra história assustadora apresentada pela entrevista é sobre o casamento de seu irmão. O bilionário voou direto da fábrica e chegou bem em cima da hora para o evento. Ao fim do casamento, pegou seu avião particular e voltou ao trabalho.

“Eu achava que o pior já tinha acabado. Eu achava isso. O pior do ponto de vista operacional da tesla já passou, mas do ponto de vista pessoal o pior ainda está por vir”

Uma simples entrevista mais emotiva e relatando seus problemas pessoais foi suficiente para derrubar as ações da Tesla.

Quando suas lágrimas podem custar milhões de dólares, a única ação possível é passar a negar. O mundo ainda não vê com bons olhos homens que se emocionam sobre suas dificuldades.

Vimos isso acontecer com Neymar ao longo da copa do mundo, assim como os acionistas da Tesla fizeram questão de sinalizar.

A resposta para isso, é claro, negar que houve lágrimas ao longo da entrevista e que tudo não passou de um mal entendido.

A informação de que “Elon Musk não chorou” foi mais divulgada do que a própria entrevista. O que sugere um trabalho de relações públicas para conter uma possível crise.

O abuso das drogas

Vi muita gente falando que as dificuldades de Musk envolvem o abuso de drogas, principalmente depois do episódio no Joe Rogan. No entanto, existem motivos para acreditar que, pelo menos maconha, não é o caso.

Quando Rogan questiona o empresário sobre uso de maconha, Musk diz que não gosta porque atrapalha a produtividade. Pode ser só uma fala pronta, mas é uma afirmação muito comum entre pessoas altamente produtivas, que costumam preferir outras substâncias. A opinião geral é que maconha deixa o pensamento lento e torna a produtividade difícil.

Poderíamos sugerir que existem outros abusos, mas ficaria na mera especulação. Além do álcool que Musk, consome tranquilamente durante a conversa com Joe Rogan, a entrevista no New York Times descreve que Musk faz uso de Ambien também conhecido como Zolpiden, um hipnótico utilizado no tratamento de insônia.

Musk abre o jogo:

“É frequente a escolha entre não dormir ou tomar Ambien”

É muito difícil que alguém com a cobrança e a produtividade atribuídas à Elon Musk tenha liberdade o suficiente para ser dependente de algum tipo de droga. As quedas em sua produtividade certamente levantariam um problema ainda maior e isso estaria refletido em quedas nas ações da empresa e uma possível substituição do CEO.

Sucesso corrompe a liberdade

Numa sociedade pautada pelo culto ao sucesso profissional, a romantização do mega empresário bem sucedido que se mata de trabalhar acaba sendo inevitável.

É comum ouvir os mesmos argumentos citados neste texto para explicar que Elon Musk provavelmente está sob um grave quadro de depressão, com um objetivo completamente oposto, enaltecendo o empresário pela sua exímia performance.

Dizer que prioriza trabalho aos amigos e filhos, que não aproveitou a festa de casamento do irmão e foi direto trabalhar e que no próprio aniversário ficou trancado na fábrica trabalhando soa como música para os entusiastas do sucesso.

Mas aos olhos do próprio Elon Musk, como podemos ver, a realidade não parece ser tão bonita assim.

Essa ideia de que o sucesso vem acompanhado de glória e felicidade é verdadeira até a página dois, quando as cobranças começam a chegar.

As últimas interações de Elon Musk mostram que além de não conseguir aproveitar de fato sua liberdade individual, tendo cada uma de suas atitudes punidas pelos acionistas da empresa, os luxos e possíveis vantagens de ser um bilionário não parecem compensar o tamanho da pressão que acaba sofrendo.

O mercado segue cruelmente romantizando a imagem de Musk, e seu comportamento vem sendo caracterizado como um efeito colateral de seu lado extremamente criativo.

A falta de abordagem sobre o estado psicológico do empresário é de impressionar. As narrativas seguem o exemplo de grandes gênios do passado, que tiveram suas depressões e episódios de suicídios romantizados como parte do lado negativo de ser inteligente demais.

Apesar de pessoalmente não considerar Elon Musk tão criativo quanto a mídia tenta projetar, não sobram sinais de que sua saúde mental está prejudicada e que seguem tentando “amenizar” essa impressão através da romantização do estereótipo do gênio incompreendido.

E preciso deixar claro que nada disso isenta o bilionário dos tantos problemas existentes nas fabricas da Tesla e que são de sua responsabilidade. Nem mesmo da agressão ao mergulhador no caso da Tailândia.

Mas quando vemos a mídia agitada sobre alguém que experimentou uma substância legal durante uma conversa, vemos que outros problemas muito mais sérios e importantes são deixados de lado.

Espero muito que não aconteça, mas se algo de pior acontecer com Musk, o que vai restar é sua fala para Rogan:

“A maior parte das pessoas que parecem felizes, não estão felizes de jeito nenhum… de jeito nenhum”

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