STEM para as Minas
STEM para as Minas
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7 min readFeb 23, 2021

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Por Evelyn

Participação feminina em Olimpíadas Científicas

Olimpíadas de conhecimento são competições que acontecem em nível nacional e internacional, as quais objetivam medir e premiar o conhecimento de estudantes que cursam tanto o ensino fundamental quanto o ensino médio. Essas competições incentivam jovens a ingressarem em carreiras científicas, como também identificam talentos em diversas áreas do conhecimento: como história — por meio da Olimpíada Nacional em História do Brasil (ONHB); português — Olimpíada de Língua Portuguesa; matemática — Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas e Olimpíada Brasileira de Matemática, bem como a astronomia — Olimpíada Brasileira de Astronomia, e diversas outras áreas.

Não obstante a importância das olimpíadas científicas para a inserção dos jovens no mundo científico, a participação feminina nelas é ínfima, dado a existência de uma série de estereótipos, nas instituições de ensino e na sociedade, que atribuem às mulheres uma dificuldade inata nas áreas das ciências exatas, a qual justificaria a predominância masculina nessas competições e nos âmbitos de STEM,

Além disso, raros são os estímulos à participação feminina nessa área, segundo a UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), isso acontece porque logo na educação primária (época em que começam a surgir os primeiros interesses em STEM) há um acesso diferenciado às ciências em benefício dos meninos: “ Em muitos contextos, os estereótipos de papéis dos gêneros são reforçados nessa faixa etária. Descobriu-se que os docentes avaliam as habilidades matemáticas das meninas a uma taxa menor do que as dos meninos, mesmo quando ambos apresentam níveis de desempenho semelhante”.

O resultado dessa cultura arcaica que segrega mulheres do mundo científico e perpetua uma desigualdade de gênero, reflete-se não apenas nos dados sobre a participação e resultados femininos nas olimpíadas de conhecimento, como também na presença feminina nas áreas de STEM, áreas que, segundo a UNESCO, possuem 35% de mulheres, enquanto 65% são homens. No primeiro caso, quanto a participação nas olimpíadas, a Mostra Brasileira de Foguetes, realizada pela OBA, disponibilizou relatório no qual pode-se observar que, de 2009 a 2018, a participação feminina correspondeu a 48,1% no nível 1 e 46,4% no nível 4. Já na situação da Olimpíada Brasileira de Física, vislumbrou-se que das 91.152 meninas inscritas, somente 9.500 passaram para a segunda fase e unicamente 167 receberam premiações. Outro caso, o da Obmep 2018, em que apenas 30% dos medalhistas do ensino fundamental eram garotas, o número caiu para 20% quando se tratando de medalhistas na modalidade do ensino médio.

Figura 1- Premiados na Obmep em 2017.

Fonte: OBMEP, 2018

No nível 1, que corresponde ao ensino básico (6° e 7° ano) percebe-se que a porcentagem de mulheres medalhistas de ouro foi 25,7% enquanto 74,3% foram homens. Em relação às medalhas de prata e bronze destinadas a meninas, esse número foi de 33,2% e 35,8%, respectivamente. Já no nível 2, que corresponde ao 8° e 9° ano, 24,9% das medalhas de ouro pertenciam a meninas, em contraste com 75,1% pertencentes a meninos. No nível 3, destinado às séries do ensino médio, o número de meninas medalhistas foi ainda menor, sendo 10,4% medalhistas de ouro, 11,7% de prata e 18,7% de bronze.

É notória a desigualdade no que tange à obtenção de medalhas, uma vez que a porcentagem de meninos premiados foi, em todos os níveis, maior do que a porcentagem de meninas premiadas, apesar de elas representarem 48% dos 940 mil estudantes classificados para a segunda fase.

Figura 2- Porcentagem de meninas premiadas na Obmep de 2006 a 2017

Fonte: OBMEP / IMPA

Assim como mostra o gráfico, o percentual de meninas premiadas permaneceu estável nos últimos anos. A porcentagem de meninas classificadas em 2007 foi 48,2% enquanto que em 2017 foi 48%; 15% dos medalhistas de ouro em 2007 eram meninas, número que subiu para 22% em 2017. A partir disso, percebe-se que não houve aumento substancial de medalhistas meninas, ou seja, durante 10 anos nada foi feito por parte das organizações que provocasse mudanças nessa realidade de desigualdade de gênero.

O reflexo dessa desigualdade de gênero no mundo científico, que começa no ensino fundamental, no primeiro contato com as olimpíadas de conhecimento, pode ser visto em todas as demais áreas da sociedade. A começar pelo número de mulheres atuando como pesquisadoras, que, segundo dados do relatório “Decifrar o código: educação de meninas e mulheres em ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM)” corresponde a menos de 30% dos pesquisadores.

Foi com o intuito de diminuir essa latente desigualdade e combater as disparidades que afastam as mulheres das carreiras científicas que a professora da área da computação da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Nara Bigolin, criou o projeto “Meninas Olímpicas”. “Vocês querem ter mulheres presidentes de empresas? Donas de startups? Querem ter mulheres eleitas? Pesquisadoras em grandes centros? Então incentivem as meninas em olimpíadas, porque as meninas começam sendo 50% no sexto ano, no terceiro ano elas são 5%. O sistema vai eliminando as mulheres. Esse é o mesmo efeito pirâmide que acontece com a mulher na sociedade, elas são 50% na graduação e 14% no doutorado. A representação feminina nas olimpíadas científicas é a mesma representação das mulheres em espaço de poder”, disse a professora.

É por meio de projetos como esse que se começa o incentivo ao protagonismo feminino nas áreas científicas e, aos poucos, diminui-se o machismo intrinsecamente ligado à nossa sociedade. Na contramão das políticas de não-inclusão de mulheres no mundo da ciência, outros projetos buscam incentivar a participação das meninas nesse mundo, como o Torneio Meninas na Matemática (olimpíada que conta apenas com a participação de meninas), a criação do prêmio “Dow” (o qual visa estimular a participação feminina no Programa Nacional de Olimpíadas de Química), e o prêmio “Carolina Bori Ciência & Mulher”- homenagem às cientistas e futuras cientistas destaques, busca incentivar a presença cada vez maior de garotas se dedicando à ciência.

Isso se deve, de muitas maneiras, ao prêmio “Meninas Olímpicas”, em razão da publicização da laureação que as meninas que obtinham alto desempenho na IMO (Olimpíada Internacional de Matemática) recebiam, e agora outras as olimpíadas têm prêmios especiais para meninas, para que se possa valorizar e incentivar a presença de garotas nessas áreas.

Portanto, quando existe incentivo e projetos que abrangem esses temas, os impactos na sociedade inteira são imensuráveis, de acordo com a UNESCO, a participação de mulheres em áreas científicas “promove a excelência científica e impulsiona a qualidade dos resultados em STEM, uma vez que abordagens diferentes agregam criatividade, reduzem potenciais vieses, e promovem conhecimento e soluções mais robustas”. Logo, com a mudança na representatividade feminina em olimpíadas científicas, as meninas saem da invisibilidade decorrente do machismo, e mais meninas são instigadas e inspiradas a participar de olimpíadas de conhecimento, e, até mesmo, seguir carreiras científicas, o que vai diretamente ao encontro da luta pela igualdade de gênero globalmente.

Desse modo, conforme afirmou a professora Nara, “se mudarmos a representação feminina nas olimpíadas científicas, nós impactamos a sociedade. Se as meninas são eliminadas lá atrás, na infância, como é que terão mulheres lá na frente, nos espaços de poder? Isso transforma o mundo”. O passo de instigar e inspirar a participação feminina em olimpíadas do conhecimento impacta em todo o ciclo de exclusão das mulheres das demais áreas da sociedade, estimulando, na contramão, meninas a seguirem carreiras científicas, refletindo no número de mulheres que virarão pesquisadoras e ocuparão outros locais de poder, até então, predominantemente ocupados por homens. Logo, é necessário incentivar a presença de meninas nessas áreas, a fim de, não apenas aumentar a representatividade feminina, como também transformar a sociedade como um todo.

MORENO, Ana Carolina. Meninas representam metade dos classificados na OBMEP, mas só respondem por um quarto das medalhas. G1, 02 de agosto de 2018. Disponível em:< https://g1.globo.com/educacao/noticia/2018/08/02/meninas-representam-metade-dos-classificados-na-obmep-mas-so-respondem-por-um-quarto-das-medalhas.ghtml> . Acesso em agosto, 2020.

VARGAS, Guilherme de. Meninas Olímpicas. Disponível em: <https://www.ufsm.br/midias/arco/meninasolimpicas/> .Acesso em agosto, 2020.

MARTINS, Helena. ONU Mulheres defende ampliação da participação feminina na política. Agência Brasil, 11 de agosto de 2018. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2018-06/onu-mulheres-defende-ampliacao-da-participacao-feminina-na-politica>. Acesso em agosto, 2020.

BIGOLIN, Nara Martini; GROFF, Mariana Bigolin; BIGOLIN, Natália; SILVEIRA, Sidnei Renato. Meninas Olímpicas: estimulando o protagonismo feminino nas ciências e tecnologia. Cad. Gên. Tecnol., Curitiba, v.12, n. 39, p. 133–147, jan./jun. 2019.

UNESCO. Decifrar o código:educação de meninas e mulheres em ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM). Paris, 2018.

Participação de meninas cai na Olimpíada Brasileira de Astronomia. AgênciaBrasil,2019. Disponível em: <https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2019-02/participacao-de-meninas-cai-na-olimpiada-brasileira-de-astronomia#:~:text=De%20acordo%20com%20os%20dados,49%2C7%25%2C%20garotos>

Jornal da Ciência destaca participação feminina na OBMEP. Impa,2019. Disponível em: <https://impa.br/noticias/jornal-da-ciencia-destaca-participacao-feminina-na-obmep/>

OBA e Mobfog.

https://agenciabrasil.ebc.com.br/educacao/noticia/2019-02/participacao-de-meninas-cai-na-olimpiada-brasileira-de-astronomia#:~:text=De%20acordo%20com%20os%20dados,49%2C7%25%2C%20garotos.

Ações da OBQ pra incentivar a participação feminina nas olimpíadas

https://obquimica.org/noticias/index/participacao-feminina-e-estimulada-na-obq

Sobre torneios só para meninas

http://portal.mec.gov.br/component/tags/tag/torneio-meninas-na-matematica

Premiação de jovens e futuras cientistas

http://www.varginha.cefetmg.br/2020/09/10/sbpc-vai-premiar-jovens-e-futuras-cientistas-do-brasil/

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Organização não-governamental que tem a missão de empoderar e inspirar minas nas áreas científicas e tecnológicas. Instagram/Facebook/Twitter: @stemparaminas