Jeremy Lin: Volta para a NBA e racismo contra asiáticos.

Rodrigo Savian
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6 min readMar 18, 2021

Por Rodrigo Savian
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Tradução de entrevista feita por Marc Stein com o armador Jeremy Lin ao The New York Times. A versão original você encontra aqui.

Jeremy Lin deixou de lado a China mesmo ganhando mais dinheiro para que pudesse voltar a jogar em frente aos olheiros da NBA na G-League. (Créditos: Juan Ocampo/NBAE, via Getty Images)

Era o quarto 3296 em Coronado Springs Resort, dentro dos portões de Walt Disney World na Florida. Jeremy Lin relata ter memorizado todos os aspectos de sua decaída.

“Eu sei onde estão as marcas,” Lin comenta. “Eu sei onde as teias de aranha estavam.”

Lin passou 43 dias e 42 noites naquele quarto como membro do Santa Cruz Warriors, jogando na bolha da G-League enquanto tentava voltar a jogar na melhor liga do mundo pela primeira vez desde a temporada 2018–2019. Após uma temporada de grandes número e tratamento de rockstar pelo Beijing Ducks na CBA (Chinese Basketball Association), Lin deixou de lado milhões de dólares na China para receber $35,000 na liga de desenvolvimento da NBA e oportunizar que vários olheiros estudem seu jogo.

Lin, 32 anos, terminou a temporada abreviada da G-League com 19.8 pontos por jogo em 50.5% de aproveitamento de arremessos e 42.6% da linha de 3-pontos, mas perdeu 6 dos 15 jogos com uma lesão nas costas. Enquanto ele espera pra saber se fez o suficiente para assinar com algum time de NBA, Lin volta ao holofotes como uma voz de liderança na comunidade ásio-americana.

Após outro jogador da G-League chamá-lo de “coronavírus” em quadra, Lin, que é Taiwanese-Americano, vem se posicionando contra o racismo intolerância que diversos ásio-americanos vêm enfrentando desde que o ex-presidente norte-americano Donald Trump passou a chamar o coronavírus de “Vírus Chinês” ano passado.

Lin falou sobre a tentativa de voltar a jogar na NBA e seu ativismo e uma longa conversa por telefone na segunda-feira (16/03/2021).

(Os principais momentos dessa entrevista foram levemente editados e condensados para maior clareza.)

Sobre a vontade de jogar na G-League mesmo sendo um veterano com nove temporadas de NBA:

Quanto mais falávamos com os times, mais eles diziam ao meu agente: “Hey, nós queremos ver se o Jeremy está saudável, e queremos ver se ele ainda pode contribuir. Sem ofensa a algumas ligas estrangeiras, mas gostaríamos de vê-lo jogar aqui, em sistema de NBA e com regras de NBA.”

Eu sei que sou um jogador de NBA. Eu sei que sou um bom shooter. Eu sei que sou um bom defensor. Eu sei que em geral eu sou melhor enquanto jogador. Eu sei dessas coisas, mas eu só precisava de uma chance para mostrar isso.

Lin jogando contra o time de G-League do Toronto Raptors. (Crédito: Juan Ocampo/NBAE, via Getty Images)

Sobre como ele foi recepcionado pelos colegas de G-League:

Duas vezes me disseram “Eu cresci vendo você jogar.” Nunca tinha acontecido de outro jogador me dizer isso, mas fiquei tipo “Ok, bem, você tem 18 ou 19 anos, então entendo.”

Sobre enfrentar jovens jogadores que estão tentando se estabelecer no cenário da NBA:

Desde que eu saí da liga, estava procurando uma oportunidade para retornar. Agora tive que engolir o que eu havia dito e competir contra todos esses jogadores famintos. É o nível mais alto de competição e todos vão pra cima.

Eu fui um alvo por toda minha vida. Desde que eu era criança, era um alvo porque as pessoas olhavam pra mim e ficavam tipo: “Oh ele não é tão bom. Eu vou arrancar a cabeça dele. Ele vai ser presa fácil.” Ou eles não queriam passar vergonha contra mim. Aí você vai e adiciona toda aquela coisa do Linsanity” e eu me tornei um alvo ainda maior, se você assistiu aos jogos, eu estava exigindo muita atenção dos times adversários. Mas é divertido.

Fãs seguram fotos de Jeremy Lin durante um jogo contra o Sacramento Kings na época da sequência de bons jogos do armador que ficaram conhecidos como “Linsanity”. (Crédito: Frank Franklin II/Associated Press)

Sobre inicialmente não gostar de falar sobre Linsanity e sua sequência com o Knicks que o rendeu a capa da Sports Illustrated por duas semanas seguidas:

Era como eu me sentia por alguns anos depois daquilo. Mas a essa altura eu estou tranquilo sobre isso até chegar ao ponto de ser grato e abraçar. Por um tempo foi um fenômeno, ou uma sombra, ou uma expectativa, ou esse fantasma que eu estava perseguindo — às vezes perseguindo e às vezes tentando fugir. Agora é como um distintivo de honra que eu tenho muito orgulho do que significou para tantas pessoas.

Por outro lado, ainda há muito basquete restando em mim. Eu definitivamente agradeço tudo sobre a Linsanity e o que isso me ensinou, mas eu realmente acredito que sou um jogador muito melhor agora do que eu era naquela época. A G-League validou muitas coisas do que eu acreditava que estava fazendo durante os treinos mas ainda não tinha mostrado em público.

Sobre revelar o incidente de quadra em que foi chamado de “coronavirus” e se manifestar em apoiando a campanha #StopAsianHate:

Com tudo que tem acontecido recentemente, eu senti que precisava dizer algo. O ódio, o racismo e os ataques que a comunidade ásio-americana têm sofrido são obviamente errados, então é meu papel falar sobre isso. Eu também sinto que parte do meu papel é solidarizar e unir, então preciso me educar sobre e continuar aprendendo mais e apoiar outros grupos, outros movimentos e organizações enquanto também conscientizo sobre as dificuldades que enfrenta a comunidade ásio-americana.

E então outra parte é jogar basquete e jogar bem, pois acredito que há uma ideia de que a comunidade ásio-americana será quieta e passiva do tipo “É, vamos dizer a eles o que fazer e eles ficarão quietos.” Então jogar basquete em alto nível vai dizer muito mais do que palavras em si podem dizer.

Sobre trabalhar com a G-League para lidar internamente com o incidente sem revelar o nome do jogador que o direcionou o xingamento — e a conversa de Lin com o atleta:

Está tudo bem. Foi uma conversa realmente boa. Eu sinto que lidei da melhor forma. No fim das contas, é o que vale. Nós falamos sobre todo o incidente.

Eu queria compartilhar que todos estão suscetíveis a esses tipos de coisas e ao racismo, mas pra mim esse não é o foco principal. O objetivo não é “Nossa, olhem pra mim. Vejam essa situação.” O verdadeiro problema agora é que existem pessoas que estão morrendo, pessoas que estão sendo cuspidas, pessoas que estão sendo roubadas, pessoas que estão sendo queimadas, pessoas que estão sendo esfaqueadas. É aí que a atenção precisa estar.

Lin venceu um campeonato com o Toronto Raptors em 2018–2019, embora mal tenha jogado nas finais (Crédito: Ezra Shaw/Getty Images)

Sobre o período em Toronto e o campeonato vencido — mas jogando apenas um minuto nas finais de 2019:

Por um lado, eu saí com o anel. Eu fui o primeiro ásio-americano a vencer um campenato de NBA, então foi algo muito especial. Mesmo apenas estar em Toronto, ver a cidade, como o país gira em torno do time, ir na parada do título com dois milhões de pessoas — foi incrível.

Ao mesmo tempo, honestamente, era o que eu precisava. Eu tive entre 10 e 12 jogos para tentar entrar na rotação. Eu não joguei do jeito que precisava, mas aprendi o que precisava aprender. Eu saí de dois anos de lesões e entendi que precisava operar minha mão de arremessar. Ninguém sabia, eu nunca havia contado a ninguém.

Já tinha meio que começado quando eu cheguei em Toronto, parecia que algo não estava certo. Cheguei ao ponto, nos playoffs, em que eu nem mesmo conseguia arremessar de 3, pois havia um caco de osso solto no meu cotovelo. Durante os playoffs, ninguém sabia, mas quando as finais terminaram eu só conseguia arremessar da linha de lance livre.

Então eu precisei operar e estava lidando com muita coisa, e também mentalmente eu estava traumatizado com minhas lesões anteriores. E foi que isso que Toronto e minha temporada na China ano passado me mostraram: Você está abordando as lesões como reabilitação física que precisa. Você já está melhor do que estava quando se lesionou. Agora você precisa reabilitar o lado mental.

Sobre sua esperança de que uma ligação da NBA vai chegar:

Eu fiz o que precisava fazer. Aceitei o desafio. Fui pra G-league quando algumas pessoas acharam que era loucura fazer isso. Acho que é apenas questão de tempo e acredito que vá acontecer. Vamos ver. Eu sei aonde eu pertenço.

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