Onde os negros não têm vez

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3 min readOct 13, 2019

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Fluminense e Bahia se enfrentaram neste sábado, no Maracanã, pela 24a rodada do Brasileirão. Na beira do gramado, estavam os únicos dois técnicos negros da Série A do Campeonato Brasileiro: Marcão e Roger Machado, que comandam cariocas e soteropolitanos, respectivamente.

Os dois vestiam a camisa do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, uma das mais importantes iniciativas contra o racismo no esporte bretão. Dentro de campo, o Flu de Marcão venceu, mas a imagem soa como a grande vitória da noite. Mais do que tudo isso, nos sugere uma importante reflexão.

(Gazeta Press) Roger Machado e Marcão, os dois únicos técnicos negros do Brasileirão

Em um esporte com tantas referências negras, como podem os 20 clubes, entre as muitas demissões e contratações de técnicos ao longo do ano, só confiarem em dois negros? Nossa sociedade mostra que, em linhas gerais, a mediocridade só é aceita quando vem de um homem branco.

Nos últimos dez anos, dois técnicos negros foram campeões nacionais. Outro foi vice, após trabalhar como auxiliar em um título da Copa do Brasil. Tratam-se de Jayme de Almeida, Andrade e Cristóvão Borges, respectivamente. Todos com seus vários defeitos e algumas qualidades como técnicos. Todos desempregados atualmente. São bons treinadores? Não. Apesar dos títulos, não mostraram tantas qualidades (o que mais teve longevidade, aliás, foi o único que não venceu). Mas ser como os outros não basta para o negro em nosso futebol.

Tomemos como exemplo o bizarro caso que o nosso futebol ofereceu essa semana. Em um intervalo de dois anos, Alberto Valentim: treinou o Palmeiras interinamente, foi efetivado e despedido; foi para o Botafogo, venceu um Carioca e saiu para o futebol egípcio; lá, fracassou e acabou demitido em pouco tempo; voltou ao Brasil para um trabalho ruim no Vasco, que penou para não cair e perdeu categoricamente para o maior rival no Carioca; foi contratado pelo Avaí e não conseguiu melhorar a situação do time; mesmo assim, ainda empregado, foi recontratado pelo Botafogo, com direito a pagamento de multa rescisória.

Qual a explicação para tamanho crédito de Valentim perante os gestores do nosso futebol? Não há nada pessoal contra o técnico. Mas ele teria tantas oportunidades se fosse negro? Ele poderia enfileirar tantos trabalhos medíocres sem perder espaço? Ele seria visto como estudioso, mesmo que seus times apresentem um repertório pobre?

É por isso que imagens como as de Roger e Marcão juntos precisam ser celebradas. No país em que faltam oportunidades para tantos e sobram para tão poucos, o simples ato de treinar um time pode ser uma forma de resistir. Como o próprio Roger pontuou:

“O preconceito que sofri não foi de injúria racial. O que sofro é quando vou a um restaurante e só tem eu de negro. Fiz uma faculdade onde só eu era negro. As pessoas podem falar que não há racismo porque estou aqui e eu nego: há racismo porque só eu estou aqui”.

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