“Toda vez eu chorava”

STICK TO SPORTZ
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27 min readAug 28, 2021

Por Melissa Porto

Atenção: o texto traduzido a seguir contém descrições gráficas de violência doméstica. A matéria em inglês, escrita por Ben Rothenberg e publicada no site Slate, repercutiu em veículos como o GE e pode ser lida em seu idioma original aqui.

Nesta semana, há dois anos atrás, a estrela do tênis Alexander “Sascha” Zverev estava em Nova York com sua namorada, Olga Sharypova, se preparando para o US Open de 2019. Zverev estava namorando Sharypova há quase um ano; os dois também tiveram um relacionamento no começo da adolescência quando ambos eram jogadores de tênis do circuito júnior.

Foi nessa viagem a Nova York, de acordo com o que Sharypova me contou em um relato publicado em novembro na Racquet, que Zverev cobriu sua cara com um travesseiro até ela não conseguir mais respirar, elevando o nível do abuso que ela afirma ter sofrido em boa parte do relacionamento. Ela disse que o comportamento controlador e possessivo de Zverev tinha se tornado fisicamente violento alguns meses antes, mas que em Nova York aquela violência alcançou um novo nível. Sharypova contou que correu do quarto do casal no hotel Lotte New York Palace e fugiu, descalça, para a rua. “Dessa vez, eu realmente temia pela minha vida”, ela me afirmou.

Ela foi apanhada por um amigo, Vasil Surduk, que a levou em seu carro para Nova Jersey. Ali, ela disse, Surduk e sua madrasta a encorajaram a se reconciliar com Zverev, trazendo o jogador de tênis para a casa deles na esperança de um reatamento. Tanto Surduk quanto a madrasta dele, a quem eu me referi pelo pseudônimo de Sra. V ( Nota da tradução: esse uso anterior do pseudônimo aparece no relato de Olga ao mesmo jornalista publicado pela Racquet e cujo link foi disponibilizado no decorrer do parágrafo anterior), confirmaram sua parte na história de Sharypova.

Sharypova continuou namorando e viajando com Zverev, acompanhando-o em setembro para a Laver Cup em Genebra, onde ela afirma que ele a socou no rosto pela primeira vez. Perturbada e se sentindo isolada, Sharypova — que não é diabética — disse que injetou insulina nela mesma e se trancou no banheiro do quarto de hotel deles (uma overdose de insulina pode levar a um coma hipoglicêmico ou pior.). Ela me disse, “Eu injetei aquilo, e eu não estava assustada; eu só queria sair de alguma forma, porque eu não podia mais suportar aquilo.” Sharypova contou que Zverev encontrou um funcionário da Laver Cup que a convenceu a abrir a porta, e lhe deu o que ela acredita serem comprimidos de glicose para neutralizar a insulina (o funcionário da Laver Cup que Sharypova mencionou se recusou a falar comigo para o artigo da Racquet.).

Minha primeira entrevista com Sharypova terminou, cronologicamente, com os incidentes em Genebra. Ela não estava se sentindo preparada ou capaz de contar toda a sua história em uma conversa só, então nos reunimos novamente semanas depois. Nessa segunda entrevista, ela descreve mais abusos físicos e emocionais em Shangai, em outubro de 2019. Essas acusações de Sharypova, hoje com 24 anos, estão sendo publicadas neste artigo pela primeira vez.

Zverev negou todas as acusações feitas por Sharypova no ano passado, chamando-as de “simplesmente inverossímeis” em um post do Instagram de outubro, sem se referir a detalhes específicos. Ele não respondeu ao nosso pedido para comentar sobre as acusações novas que Sharypova faz neste artigo.

Em uma carta de cease and desist (pedido ou ordem para cessar uma atividade, sob pena de ação judicial), um dos advogados de Zverev escreveu que “recomenda aos clientes não comentarem seus casos”. A carta diz ainda que a investigação foi “baseada em suposições e insinuações obviamente incorretas.”

A ATP — a organização que comanda o tênis profissional masculino — não possui uma política para casos de violência doméstica, e não reconheceu as acusações de Sharypova feitas no ano passado diretamente (a ATP também se recusou a comentar as novas acusações descritas neste.). No último dia 21, a mesma anunciou que uma revisão de suas políticas de “salvaguarda” está em progresso, mas não se referiu a nenhum caso específico. Sharypova me contou neste mês que ela não foi contactada pela ATP, nem procurou a organização diretamente. Não há indícios de que a ATP tenha hoje qualquer plano de investigar suas queixas.

Nesse meio tempo, Zverev, também de 24 anos, emergiu como um dos melhores jogadores do esporte. No começo deste mês, ele ganhou uma medalha de ouro olímpica para a Alemanha, surpreendendo o líder do ranking Novak Djokovic no caminho da vitória no título do tênis masculino. No último domingo, venceu o Western & Southern Open em Cincinnati, e chega ao US Open da semana que vem, em Nova York, com onze vitórias consecutivas nos últimos jogos. Zverev, que esteve a dois pontos de vencer a final do torneio do ano passado, está na pequena lista de jogadores considerados capazes de interromper a busca de Djokovic por todos os Grand Slams de 2021 no torneio deste ano.

Em nossa entrevista no ano passado, Sharypova me contou que seu objetivo não é ver Zverev punido. Pelo contrário, ela quer ser honesta em relação ao que ocorreu a sua pessoa, na esperança de que sua história possa ajudar outras.

No dia 28 de outubro de 2020, Sharypova postou uma foto sua no Instagram. A legenda, escrita em seu russo nativo, dizia: “Eu fui agredida e não ficarei mais em silêncio.”. Ela escreveu que foi vítima de violência doméstica, mas não identificou nenhum perpetuador. Ela deu o nome de Zverev numa entrevista ao website Championat mais tarde naquele mesmo dia.

A ATP soltou um comunicado 16 dias depois (oito dias depois que a Racquet publicou minha matéria) que não mencionou Sharypova, Zverev ou qualquer coisa relacionada a sua acusação. “A ATP condena totalmente qualquer forma de violência ou abuso,” começou a declaração. “Esperamos que todos do Tour façam o mesmo e se abstenham de qualquer conduta que seja violenta, abusiva ou coloque outros em risco.”. A ATP acrescentou que consideraria responder a uma alegação se e quando um procedimento legal seguisse seu curso. “Em circunstâncias onde alegações de violência ou abuso sejam feitas contra qualquer membro do Tour, autoridades legais investiguem e o processo devido seja aplicado, nós então avaliamos o resultado e decidimos o curso apropriado da ação”, concluiu o comunicado da ATP. “Do contrário, somos incapazes de comentar mais sobre alegações específicas.”

Um padrão de “autoridades legais” impediu qualquer ação da ATP neste caso, visto que Sharypova disse repetidamente não estar interessada em prosseguir com uma ação criminal ou civil contra Zverev. E então, pelos últimos 10 meses, Zverev continuou a jogar e vencer partidas em torneios, forçando comentaristas, patrocinadores e fãs a lidar com seu sucesso atual dentro de quadra e seu suposto comportamento fora dela.

Em maio, depois que Zverev venceu seu quarto título de Masters da ATP em Madrid, a locutora britânica Catherine Whitaker falou de sua inquietação com a “inércia da situação”.

“O tênis dele foi brilhante nesta semana, mas a nível pessoal, será que eu fico alegre assistindo? Não, eu não fico.”, disse Whitaker no The Tennis Podcast. “É um lugar bem desconfortável de se estar. Estamos meio que esperando por algum tipo de — não resolução, mas progresso, ou ação, ou algo.”.

No fronte dos patrocinadores, o panorama é turvo. O contrato de roupas de Zverev com a Adidas supostamente durou até o fim de 2020, e apesar de ele não ter aparecido nas fotos promocionais da marca neste ano, ele continuou a usar trajes da mesma (a Adidas não respondeu aos pedidos para comentar.).

Marina Caiazzo, gerente de marketing esportivo global da companhia japonesa de vestimenta esportiva Asics, me contou que Zverev esteve disponível e interessado em assinar um contrato no começo do ano, mas que “a discussão parou num estágio inicial” por razões que ela disse não estarem relacionadas às acusações.

Zverev acrescentou um grande novo patrocínio nos últimos meses, contudo, anunciando no Instagram em junho que ele se sentia “incrivelmente honrado e orgulhoso de se juntar à família @rolex.” Rolex, um patrocinador prolífico de jogadores e torneios de tênis, lançou uma campanha estrelando Zverev em 20 de agosto, dando a ele sua própria página em seu website.

Em um comunicado, a porta voz da Rolex, Virginie Chevailler, disse que a companhia o apoiou como parte de seu “compromisso com o esporte”, mas “não tinha nenhum comentário a fazer a essa altura sobre quaisquer potenciais alegações contra ele visto que, pelo que sabemos, nenhuma ação formal foi tomada até o momento.”.

Uma estrela do tênis já teve sua própria página no website da Rolex: Roger Federer.

Federer e a Team8, a companhia de gerenciamento que ele co-fundou com seu agente Tony Godsick, investiram no estrelato de Zverev. Zverev se juntou a Federer em seu lucrativo torneio de exibição na América Latina, e ele tem sido uma atração da Laver Cup, um evento no estilo Europa versus o resto do mundo que a Team8 criou.

Em janeiro, pouco mais de dois meses depois de Sharypova ter tornado suas acusações públicas, Zverev anunciou que ele não era mais agenciado pela Team8. “Ambos sentimos que ter a minha família num papel maior de novo era a decisão certa”, escreveu Zverev no Instagram.

Perguntei a Federer durante uma conferência de vídeo em maio se a saída de Zverev tinha algo a ver com as acusações de Sharypova. “Bem, quer dizer, claro que eu sou muito próximo do Tony (Godsick) e da Team8, mas ao mesmo tempo essas são decisões que Tony e o time tomam”, disse Federer. “Olha, Sascha é um grande rapaz. Eu fico feliz por ele quando ele vai bem… e todas as alegações, isso é um assunto super privado que eu realmente não quero comentar.”. (A Team8 não respondeu aos pedidos para comentar o fim da parceria de gerenciamento, nem o abuso que Sharypova afirma ter ocorrido durante sua Laver Cup de 2019. Eles, no entanto, recentemente anunciaram o retorno de Zverev ao time europeu na próxima Laver Cup, em Boston.).

Eu então perguntei a Federer se a ATP deveria investigar as acusações ou criar uma política de violência doméstica. Federer disse que uma vez que jogadores de tênis são contratados independentes que não recebem salários de ligas ou clubes, uma política como essa pode ser complicada de se implementar. “Claro que deve ter um certo código, como eles têm em quadra”, disse, mas “agora você avança na vida privada também? Eu sinto que para isso nós temos outros tipos de regras — governos e isso tudo.”.

Mesmo na ausência de uma nova política de violência doméstica de parte da ATP, os incidentes descritos por Sharypova já estariam dentro do alcance da organização de acordo com as regras atuais. “Jogadores não devem em momento algum abusar de nenhum juiz, oponente, espectador ou outra pessoa dentro dos recintos do espaço do torneio”, afirma o livro de regras da ATP. Um porta voz da ATP confirmou que isso inclui qualquer abuso que ocorra em hotéis do torneio, que são descritos no livro de regras como parte do espaço do torneio.

A possível agressão de Zverev à Sharypova na Laver Cup de 2019 aconteceu num hotel oficial do torneio em Genebra. E foi em outro hotel oficial de um torneio, durante o Masters de Shanghai de 2019, que, de acordo com Sharypova, Zverev a atacou fisicamente uma última vez.

Para nossa segunda entrevista em novembro de 2020, Sharypova e eu nos reunimos novamente na casa onde ela estava hospedada no norte de Nova Jersey. Sem um tradutor ali para a ajudar, ela falou num inglês hesitante, pausando esporadicamente para colocar uma palavra ou uma frase em um aplicativo de tradução no celular.

Ela começou contando sobre seu estado mental em Genebra em 2019 depois que Zverev propositadamente a atacou e ela injetou insulina em si própria. “Eu passei três — ou dois dias, eu não me lembro — e depois eu acordei e disse, OK, eu deveria fazer alguma coisa”, ela disse. “Eu não podia me deitar daquele jeito e só pensar sobre como muitas coisas ruins aconteceram comigo. Eu deveria descobrir e pensar no que fazer depois.”.

Sharypova disse que esteve num banquete pré-Laver Cup e depois nas partidas da mesma, incluindo a vitória de Zverev sobre Milos Raonic que resultou numa virada para o time europeu.

“Eu estava feliz por ele, eu estava tão orgulhosa dele”, disse Sharypova sobre a vitória de Zverev. “Eu o amava — claro que eu estava orgulhosa.”. Mas ela disse que ela também pediu a ele que reconhecesse a dor que ele tinha causado, já que ela estava tentando melhorar seu bem-estar emocional. “Não é normal que eu seja uma pessoa que não queira viver, e é por causa do nosso relacionamento.”.

Sharypova disse que, para sua decepção, Zverev não mostrou nenhum remorso. Viajar para os torneios com ele de hotel em hotel, longe dos amigos e familiares, também dificultou um apoio estável.

Após a Laver Cup, Sharypova acompanhou Zverev até a China, onde ele jogou no China Open em Pequim e no Masters de Shanghai. Em Pequim, ela disse, o casal teve outra discussão, mas ela contou que achou Zverev mais sereno do que ele fora em seus desentendimentos anteriores.

“Ele realmente tinha se acalmado e estava controlando mais a si mesmo”, ela disse. “Para mim foi tipo, OK, agora nós podemos viver juntos. Agora eu me sinto mais protegida. Mais segura.”

O estresse das últimas semanas, no entanto, fez com que a pele de Sharypova se abrisse, piorando sua angústia e levando a insultos em redes sociais. Sharypova me mostrou uma conta no Instagram com uma única publicação: um close-up de sua acne facial.

Em Shanghai, Sharypova esperava receber a companhia da Sra. V, a madrasta de seu amigo Vasil Surduk. A Sra. V tinha dado para Sharypova um lugar para ficar quando ela fugiu de Zverev em Nova York, e depois a persuadiu a voltar com ele.

“Sascha tinha dito que quando nos casássemos, o primeiro convite seria para ela”, disse.

No dia 9 de outubro de 2019, a Sra. V chegou em Shanghai de sua casa em Phuket, Tailândia, trazendo para o casal uma grande cesta de frutas de presente. Sharypova disse que desembrulhou as frutas no quarto do casal no Kunlun Jing An, o hotel oficial do torneio. Ela então foi com a Sra. V para o torneio, onde elas viram Zverev vencer sua partida de 32-avos de final contra Jeremy Chardy. Depois da partida, disse Sharypova, Zverev tinha sessões de recuperação e de treino em seu cronograma, então ela foi com a Sra V. até um salão de beleza próximo, onde a dupla planejava fazer as unhas e realizar tratamentos faciais, os quais Sharypova esperava que ajudassem sua pele.

Sharypova disse que enquanto estava no salão ela recebeu uma chuva de mensagens de Zverev.

“Ele me mandou fotos com a cesta e disse: “Por que isto está aqui?”, disse Sharypova. “Ele começou a brigar comigo sobre as frutas, as quais eu botei na sua cama de massagem por estar com pressa.”.

Sharypova disse que, apenas três semanas depois do incidente em Genebra, ela não teria energia para outra briga com Zverev.

“Ele começou a dizer, ‘Por que eu vim para o quarto e você não está aqui? Eu preciso limpar isto. Você não está aqui, por que você está no salão de beleza, por que eu estou esperando por você? Você não me ama?’ E eu estava tipo, ‘Do que você está falando? Eu estou sempre esperando por você no quarto. Eu não fico brigando com você quando você está em outro lugar. Posso ter um pouco de espaço por algumas horas para cuidar do meu rosto?’”

Quando ela voltou para o quarto de hotel, Sharypova disse, Zverev saiu imediatamente.

“Ele disse, ‘Eu estava esperando por você. Agora você deve me esperar’”, ela recordou. “Eu entendi que quando ele voltasse seria outra briga, outra história, e eu não queria isso. Eu pedi por ajuda, pedi a compreensão dele, mas eu não consegui nada.”

“Eu estava no quarto sozinha. Eu estava pensando sobre tudo aquilo. Eu queria apenas pegar minhas coisas e ir, mas eu não sabia para onde, eu não sabia o que eu deveria fazer. No momento, por conta do meu sistema nervoso, eu não pensei muito. Eu apenas fiz de novo.”.

Sharypova disse que, pela segunda vez no mês, injetou insulina nela mesma enquanto Zverev não estava no quarto para a impedir.

“Eu só não queria brigar”, ela disse, rememorando seus sentimentos na ocasião. “Eu só não tinha energia para aquilo. Eu estava apenas me deitando na cama, e isso é tudo.”.

Quando Zverev voltou para o quarto, de acordo com Sharypova, ela mal respondia.

“Ele compreendeu que algo tinha acontecido”, disse ela. “Eu estava muito calma. Quando ele conferiu meu nível de açúcar, estava em 30 (miligramas por decilitro)” — um nível de risco de vida.

Sharypova disse que Zverev a fez comer um pacote de açúcar, ao qual ela estava muito fraca para resistir. Assim que ela começou a se recuperar, ela contou, Zverev a repreendeu de novo.

“Ele me perguntou, ‘Por que você fez isso comigo? Você entende o que você acabou de fazer comigo agora?’ Ele começou a gritar e dizer: ‘se você morresse no meu quarto, seria um grande problema para mim. É realmente uma grande responsabilidade para mim. Você disse que não quer viver por minha causa — por que você disse isso?”

Sharypova disse que se ofereceu para terminar com Zverev e pegar um vôo de volta para Moscou. Zverev recusou, disse Sharypova, mas ele disse que ele tornou difícil para ele se concentrar para a partida seguinte.

“Eu vivo com isso”, Sharypova afirma ter respondido a ele.”’Eu entendo que é difícil para você, mas você consegue perceber como isso é pior para mim?’ Eu estava escrevendo para as pessoas dizendo que eu não queria viver. Eu chorava, eu vivia chorando. Todo dia eu chorava.”.

Sharypova disse que ela ainda se sentia perdida quando acordou na manhã seguinte, no dia 10 de outubro. “Eu não tinha sentimentos, emoções, palavras”, ela me contou. “Ele começou a me culpar de novo, e a dizer que era realmente a vítima da situação.”.

Zverev sugeriu que Sharypova não assistisse sua partida contra Andrey Rublev mais tarde naquele dia, e ela concordou.

“Eu já estava no limite”, disse. “E ele falou, ‘Se é assim, você devia arrumar suas coisas e ir se f*der.’. Eu disse, ‘OK! Eu vou voltar para Moscou. Você vai voltar e eu vou estar em outro lugar.’”

Sharypova disse que ela foi tomar um banho, durante o qual Zverev continuou a repreendê-la do lado de fora da porta do banheiro.

“Quando eu saí do banho, eu estava indo pegar uma toalha e ele veio e disse, ‘Arrume suas coisas agora e saia’”, lembrou Sharypova. “Eu estava tipo, ‘OK, você pode esperar alguns minutos por favor? Eu estou nua aqui.’”

Dali em diante, disse Sharypova, Zverev a atacou mais violentamente do que ele já havia atacado anteriormente. Ela contou que ele a pegou pela garganta e a empurrou contra a parede de azulejos do banheiro.

“Ele começou a me socar, e dessa vez eu entendi que eu não era massa para ser sovada.”.

Sharypova disse que começou a balançar os braços violentamente para se desvencilhar de Zverev da melhor maneira que podia.

“Eu estava apenas tentando me proteger”, disse. “Eu já estava nua. Eu era uma mulher, eu não tenho muito poder. E depois do meu banho, eu não tinha muito tempo para pegar minhas roupas. Eu não me senti segura por um segundo.”.

Sharypova disse que Zverev também a insultava entre os golpes físicos.

“Ele começou a me dizer essas coisas: ‘Eu espero que você morra, você deveria ter morrido ontem, mas não no meu quarto. Se você quer morrer, você pode tomar insulina e morrer na rua porque eu não quero problemas. Eu não quero mais ter que lidar com você’”, ela lembrou. “‘Eu estava chorando. Eu disse, ‘OK, se você quer que eu morra, me dê insulina, eu vou para a rua, e é isso. Eu não posso mais ouvir isso, eu não posso mais aguentar isso. O que você quer de mim? Você quer me socar? Você já fez isso.”

Sharypova disse que Zverev acabou ligando para alguém do celular e deixou o quarto. Depois que ela se trancou no banheiro, ela ouviu outra voz entrando pela porta: o pai de Zverev, Alexander Zverev Sr.

“Você tem até de noite para arrumar suas coisas’”, disse Zverev Sr., de acordo com a lembrança de Sharypova. “Ele disse, ‘ Se você não sair, eu vou te processar, pois eu tenho fotos de como você socou o meu filho.’”

“Eu estava nua, sentando no chão do chuveiro — todo meu corpo estava queimando”, disse. “Quando ele saiu, eu estava tão mal emocionalmente que eu apenas comecei a rir. Eu estava chorando e rindo. O pai dele estava assim, ‘Você é um lixo. Não precisamos de você.

Quando Zverev entrou em quadra para sua partida de oitavas de final apenas 12 horas depois, havia marcas de arranhões no lado esquerdo de seu pescoço. Essas marcas, as quais Sharypova afirma serem consequência da briga, são claramente visíveis nas fotos, assim como nas gravações da partida e da entrevista pós-jogo. Imagens de sua partida contra Jeremy Chardy confirmam que os arranhões não estavam aparecendo no dia anterior.

Na imagem acima, Zverev na entrevista pós-jogo do dia 9 de outubro. Na parte de baixo, um registro da entrevista do dia 10, já com as marcas.

Imagens daquela partida de 9 de outubro contra Chardy também mostram Sharypova sentando no box dos jogadores próximo à quadra. Ela não aparece nesse box em nenhuma das partidas seguintes de Zverev em Shanghai, começando pela partida contra Rublev na noite do dia 10 de outubro.

Sharypova disse que dois dias depois de Zverev a ter atacado no banheiro, ela usou o WhatsApp para enviar imagens de seu rosto e braço ainda machucados para uma amiga próxima, para quem ela tinha confidenciado isso antes.

Apesar de Sharypova ter trocado de celular desde então e não ter arquivado suas mensagens, sua amiga ainda tem provas da conversa das duas.

Eu falei com a amiga de Sharypova, que pediu para não ter seu nome citado neste artigo, na última semana. Ela me contou que Sharypova falou com ela com frequência durante seu relacionamento com Zverev, mantendo-a informada sobre o que Sharypova descreveu como um padrão de abuso crescente.

“Normalmente nós somos abertas sobre qualquer coisa, mas depois de Nova York, ela estava (se guardando) para si mesma mais do que o de costume, e eu sabia que algo estava acontecendo”, a amiga me contou. “Eu sabia que depois de Nova York seria ainda pior. E eu disse a ela, ‘Por que você, depois de tudo que aconteceu em Nova York, daria outra chance a ele? Se ele fez isso uma vez, ele vai fazer o mesmo.’. Então, uma semana depois de nossa última conversa, ela me mandou essas imagens.”.

Print do celular da amiga de Sharypova.

“O que é isso?”, escreveu a amiga em resposta às imagens com as lesões de Sharypova.

“Isso é o Sascha”, Sharypova respondeu.

“Que p*rra é essa?” disse a amiga. “Ele de novo?”

“O mesmo aconteceu em Genebra”, respondeu Sharypova. “Em Genebra ele começou a socar a minha cara.”

Ao não referenciar as acusações de Sharypova contra Zverev em seu comunicado de novembro, a ATP estava correspondendo com seu comportamento em outras acusações recentes de violência doméstica.

Neli Dorokashvili, ex-esposa do jogador Nikoloz Basilashvili, prestou queixa contra seu ex-marido na Geórgia, país natal de ambos, em maio de 2020 (por conta da pandemia, o processo foi repetidamente adiado.). Um representante da equipe legal de Dorokashvili me contou que eles têm a confirmação de uma testemunha de que Basilashvili foi violento com sua esposa. Basilashvili negou as alegações, e seu advogado me disse que gravações de áudio e vídeo “confirmariam a inocência do sr. Basilashvili.”. O advogado também disse que eles “planejam recorrer na corte contra o novo caso de acusação de dano à reputação.”.

Por Dorokashvili ter prestado queixa, a ATP, que não comentou as acusações contra Basilashvili, presumidamente vai decidir se vai agir (uma vez que há uma decisão tomada numa corte na Geórgia), ou se vai aguardar os resultados de suas recém-anunciadas mudanças nas políticas de salvaguarda. Enquanto isso, Basilashvili venceu dois títulos da ATP neste ano, no Catar e na Alemanha (ele também perdeu para Zverev nas Olimpíadas de Tóquio.). Em Wimbledon, no mês de junho, o georgiano jogou contra o herói local Andy Murray na primeira rodada. Murray foi questionado a respeito das acusações em sua coletiva de imprensa de pré-jogo.

“Eu falei sobre isso há alguns meses atrás quando fui perguntado sobre ele e também sobre o Zverev”, disse Murray. “Sim, para mim deveriam haver protocolos e um procedimento quando acusações como essa são feitas. (…) Isso é algo que a ATP, os governantes, a ITF, os Slams deveriam estar procurando implementar, na minha opinião.”.

Esse estilo “esperar para ver” da ATP contrasta com as decisões tomadas pelas principais ligas esportivas norte-americanas. Jane Randel, co-fundadora da NO MORE Foundation que deu consultoria tanto para a NFL quanto para a Nascar, contou-me que o caso Ray Rice foi um ponto de virada em procedimentos de casos de violência doméstica. Em 2014, o site TMZ publicou registros de câmeras de segurança do RB do Baltimore Ravens atacando sua então noiva num elevador e levando seu corpo inconsciente para o corredor. O comissário da NFL, Roger Goodell, inicialmente suspendeu Rice por apenas duas partidas; depois que o Ravens cortou Rice da equipe, Goodell o suspendeu indefinidamente (essa segunda suspensão foi depois alterada por uma juíza .).

Reconhecendo o rumo errado que o caso Rice tomou a princípio, a NFL introduziu uma nova política de violência doméstica em 2014, incluindo uma suspensão de seis jogos como punição inicial. A MLB desenvolveu sua própria política nova, a qual assegura investigações de parte da liga e dá a seu comissário o poder de botar o acusado numa licença administrativa paga (Trevor Bauer, do Los Angeles Dodgers, está atualmente em uma depois de ser acusado de abuso sexual. Bauer nega as acusações.). A NBA anunciou uma política de violência doméstica revisada em 2017 com premissas parecidas. Diferentemente das outras três ligas, onde as políticas de violência doméstica foram negociadas diretamente com os jogadores, a NHL lidou com violência doméstica num aspecto mais caso a caso. A liga iniciou um treinamento sobre violência doméstica com os jogadores da NHL em 2016, e aplicou suspensões duradouras para acusados depois de conduzir investigações internas.

“Por que essas políticas existem? Nós adoraríamos crer que é por motivos morais”, afirmou Jon Wertheim, da Sports Illustrated, em uma entrevista comigo para o podcast No Challenges Remaining. “Existem, provavelmente, justificativas empresariais mais grosseiras; essas equipes e gerenciamentos não querem o trabalho, os jogadores, sujando a marca.”.

A estrutura dos seus negócios complica a figura do tênis. Como Federer me disse, os jogadores não são funcionários. E, diferentemente da NFL, os torneios de tênis não se encaixam ordenadamente sob as leis de um país só. Mas a ATP é capaz de conduzir investigações internas, e as têm feito publicamente em ocorridos recentes, inclusive quando Sam Querrey deixou a Rússia em um avião privado depois de testar positivo para a COVID-19 em um torneio em São Petersburgo.

Olga Sharypova é uma cidadã russa acusando um cidadão alemão de abusos que ela afirma terem ocorrido em Mônaco, nos Estados Unidos, na Suíça e na China. Mesmo que Sharypova decidisse prestar queixas ou formular um processo, é incerto quais órgãos legais ela procuraria.

A natureza nômade dos torneios, porém, pode ser um argumento para a ATP ter um papel maior em casos de possível violência doméstica, ao invés de um menor. O fator que une essas jurisdições distintas — particularmente em Genebra e Shanghai, onde Sharypova afirma ter sido agredida nos hotéis oficiais dos torneios — são as viagens.

A Sra. V me contou que viajou para Shanghai em 2019 com seu filho caçula, um fã de esportes, “para ver a reconciliação feliz” de Zverev e Sharypova — o casal que ela havia ajudado a reatar em Nova York um mês antes. Ela sentou perto da quadra do lado de Sharypova no box de acompanhantes de Zverev em sua vitória sobre Jeremy Chardy no dia 9 de outubro.

“No dia seguinte, à tarde, deveríamos ter entrado em contato uma com a outra”, disse-me a Sra. V. “Mas perto das 14h, ninguém tinha entrado em contato comigo, nem nada. De repente, Olya” — um diminutivo do nome Olga — “ligou para o meu número e disse que estava em uma situação ruim, ela não sabia o que fazer, ela tinha problemas, ela não tinha dinheiro, não tinha lugar para ficar. Eu disse, ‘Venha.’”

A Sra. V disse que àquela altura ela não tinha certeza do que tinha acontecido entre Zverev e Sharypova. Ela disse que Zverev mandou mensagens de forma contínua a ela, querendo que ela convencesse Sharypova a se reconciliar com ele mais uma vez.

“Ela estava verde-azulada, chorando e tudo”, disse a Sra. V. “Se eu tivesse visto algo, talvez alguns arranhões. Eu não tirei fotos nem levei aquela situação muito longe. Eu nunca pensei que pudesse chegar a tal ponto, e tendo em vista que o rapaz ainda estava falando e querendo ela de volta, e eu não sabia exatamente o que tinha ocorrido, eu não sabia o que fazer. Tudo o que eu podia fazer era manter ela segura, e foi isso que eu fiz.”.

A Sra. V contou que Sharypova disse a ela que injetou insulina em si mesma por uma segunda vez depois da briga deles. V. disse que ficou furiosa.

“Eu fui dura com ela”, disse. “Eu falei para ela que ela não tem o direito de brincar com a própria vida desse jeito, pois ela tem pais que a amam, ela tem apenas vinte e poucos anos.

V. me mostrou uma troca de mensagens com Zverev do dia 10 de outubro de 2019. Nelas, que estão em russo, Zverev reconheceu as duas auto-injeções de insulina que Sharipova havia aplicado.

“Eu falei duramente com ela sobre a insulina”, escreveu a Sra. V.

“Não é a primeira vez”, respondeu Zverev.

Temendo que ela pudesse fazer algum mal a si mesma pela terceira vez, V. se recusou a enviar Sharypova de volta a Moscou como os Zverev queriam.

“Mesmo que ela tivesse companhia, eu não tinha certeza de que ela estaria segura dela mesma’’, disse.

Ao invés disso, V. arrumou um quarto maior no Kunlun Jing An e ficou lá com Sharypova enquanto seu filho continuava assistindo aos jogos do torneio.

“Eu fiquei com Olya. Eu basicamente nem saí do quarto”, disse.

No último dia de torneio, enquanto Zverev enfrentava Daniil Medvedev na final, a Sra. V. pegou um voo com seu filho e Sharypova de volta para Phuket, onde as duas ficaram nos dois meses seguintes. V. disse que expulsou o marido do quarto de casal deles, assim podia ficar mais perto de Sharypova.

“Eu também me senti responsável porque fui eu que a empurrei de volta para ele em Nova York’’, disse. “Eu tinha voltado para ver um final feliz, e ao invés disso eu não tive escolha senão levar ela comigo no retorno a Phuket. Graças a Deus os russos não precisam de visto para viajar para lá.”.

Apesar de Zverev e Sharypova não terem nunca mais se visto pessoalmente de novo, eles não terminaram imediatamente. Zverev continuou a mandar mensagens tanto para Sharypova quanto para a Sra. V nas semanas seguintes, implorando para que Sharypova voltasse para ele.

“Nesses dois meses ele sempre me escrevia, ele sempre estava tentando consertar a nossa relação”, disse Sharypova.

Sharypova, àquela altura, havia sido deixada para trás quando outra mulher, a modelo alemã Brenda Patea, apareceu no box de acompanhantes de Zverev no Masters de Paris, menos de três semanas depois de ela o ter visto pela última vez. Sharypova contou que Zverev negou enfaticamente, a ela e a Sra.V, estar num relacionamento com Patea.

Sharypova disse que Zverev tentou provar sua devoção durante seu torneio de exibição na América Latina com Federer no final de 2019. Em uma chamada via FaceTime, Zverev se ajoelhou e pediu Sharypova em casamento.

V. me mostrou mensagens no WhatsApp enviadas por Zverev em inglês que parecem confirmar essa história. “EU PEDI ELA EM CASAMENTO. (…) Eu me ajoelhei e disse que vou dar o anel a ela assim que a ver”, escreveu Zverev no dia 21 de novembro de 2019.

“Eu fui pedida em casamento pelo FaceTime”, disse Sharypova, rindo. “Se alguma garota disser que teve o pior pedido de casamento da história…querida, não. Eu tenho uma história para você.”.

Sharypova afirma ter falado com Zverev pela última vez em dezembro de 2019.

Print das mensagens da Sra. V.

Zverev respondeu publicamente às acusações de Sharypova em 29 de outubro de 2020, um dia depois de ela ter dado seu nome em uma entrevista para um site russo. Em uma publicação no Instagram, ele disse que as acusações de Sharypova são “sem embasamento” e “simplesmente inverídicas”. E, em coletivas de imprensa nos dias seguintes, Zverev enfatizou o quão pouco as afirmações da jovem o estavam afetando.

“Eu percebo agora que sempre vão existir pessoas que não vão desejar o melhor para você”, disse o alemão em 7 de novembro de 2020, depois de derrotar Rafael Nadal nas semifinais do Masters de Paris. “Cabe a mim se eu vou deixar isso acontecer ou não. Você sabe, eu sinto que eu até estou fazendo um bom trabalho em não deixar isso acontecer, e estou aproveitando. Enquanto você tiver um sorriso no rosto ao final do dia, eu acho que isso é a coisa mais importante da vida.”.

Zverev demonstrou sentimentos parecidos depois de perder a final.

“Eu sei que existem muitas pessoas agora que querem tirar o sorriso do meu rosto”, disse durante a entrega dos troféus. “Mas, por debaixo desta máscara, estou com um sorriso que brilha. Eu me sinto incrível em quadra. Eu tenho pessoas que eu amo perto de mim. Eu provavelmente serei pai em breve, então está tudo ótimo na minha vida. As pessoas que tentam, elas podem continuar tentando, mas eu ainda estou sorrindo por debaixo dessa máscara, embora vocês não possam ver.”.

Uma semana depois, no ATP Finals em Londres, Zverev mudou sua abordagem. Dessa vez, ele leu notas preparadas no seu celular.

“Eu tenho que manter a minha ideia original de que eles estão apenas sendo mentirosos e continuar a negá-los”, disse. “Isso me deixa triste, o impacto que tais acusações falsas podem ter — no esporte, no mundo lá fora, em mim mesmo também. Eu realmente peço desculpas pelo fato de o foco ter sido tirado do esporte. Nós todos amamos jogar tênis. É o que viemos fazer aqui.”.

Nos meses que se seguiram desde então, Zverev falou pouco em público sobre as acusações contra ele, e mal é questionado sobre as mesmas nas entrevistas. Apesar de as acusações de Sharypova serem frequentemente publicadas nas redes sociais, ela mal é mencionada nas transmissões televisivas dos jogos de Zverev.

A conversa parece estar mudando, porém. Durante a decisão da medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Tóquio, comentaristas da NBC e do Olympic Channel destacaram as acusações de agressão mais do que havia sido feito anteriormente na televisão americana.

Depois que a apresentadora Tessa Bonhomme resumiu as acusações de Sharypova entre os sets, os comentaristas Mary Carillo e Darren Cahill criticaram a falta de ação da ATP durante o primeiro game do segundo set.

“Ah, qual é, sejamos honestos, a ATP tem sido fraca e negligente ao abordar isso”, disse Cahill, treinador da romena Simona Halep, atual número 13 no ranking feminino. “E isso não é apenas sobre Alexander…. Nós temos unidades de integração para violações relacionadas ao uso de drogas, para violações relacionadas a apostas. Com certeza, internamente, podemos fazer o mínimo para investigar essas coisas.”.

Além de Andy Murray, a maioria dos jogadores com quem eu falei, incluindo o №1 do ranking Novak Djokovic (nota da tradução 2: sim, a tradutora aqui também ficou surpresa dado o histórico de comentários sobre tênis feminino que já foram feitos pelo sérvio e quer deixar isso registrado), tem amplamente apoiado o acréscimo de uma política para casos de violência doméstica.

John Millman, um membro australiano do conselho de jogadores da ATP, que representa interesses em decisões da alta cúpula a respeito dos torneios, disse-me no começo desse mês que a necessidade de uma política para casos de violência doméstica tem sido discutida nas reuniões do conselho. “Nós podemos ser mais proativos com isso”, disse Millman. “Não é apenas uma ótica boa, mas é sobre ter fibras de moral boas também.”.

A ATP não deixou nenhum funcionário disponível para entrevistas neste tópico, mas requisitou diversas vezes a data de publicação deste artigo. Na manhã do último sábado, dia 21 de agosto, a organização soltou um comunicado à imprensa anunciando uma revisão “independente” e “compreensiva” de suas políticas de salvaguarda, conforme discutido pelo conselho de jogadores (o comunicado, como o de novembro de 2020, não foi publicado nas redes sociais da ATP; um tweet com um link foi postado depois do comunicado, mas foi rapidamente apagado.).

O comunicado marca um eixo claro da filosofia “esperar para ver” da ATP. “Para que conste, a ATP já deferiu autoridades legais em casos de abuso antes de determinar se ações internas são garantidas pelo Código de Conduta”, diz o comunicado. “O registro deve configurar um número de recomendações para elevar a proteção das medidas de salvaguarda dentro da organização e identificar oportunidades para um envolvimento mais proativo. Após sua conclusão, a ATP irá avaliar suas recomendações e possíveis próximos passos para questões de salvaguarda, incluindo aquelas que englobam violência doméstica.”

“Reconhecemos que temos uma responsabilidade de fazer mais”, afirmou o chefe executivo da ATP, Massimo Calvelli, no comunicado.

Instituir uma política de combate à violência doméstica comparável a aquelas de outros esportes pode ser complicado no tênis. Uma vez que a ATP premia os jogadores por cada partida e não tem um salário base, não seria simples suspender um jogador pago com uma investigação em andamento, como é em outros esportes.

Um porta-voz da ATP me contou que a denúncia independente “deve ser esperada em algum ponto”. Até lá, Zverev vai seguir jogando, no US Open desta semana e depois, sem nenhuma sanção nem exoneração do esporte, quem dirá uma resolução no horizonte, mesmo agora que a ATP parece pronta para se responsabilizar pelo que ocorre nos torneios.

Sharypova voltou a Moscou no começo deste ano. Quando nos falamos neste mês via FaceTime, ela me contou que está se consultando com uma psicóloga para a ajudar a processar seu relacionamento com Zverev e a aprender a confiar de novo. “Eu entendo que eu estou assustada por conta da minha história”, ela disse. “Eu não posso mudar meu passado, mas eu posso mudar meu futuro.”

“Agora eu entendo que terei paz quando eu o perdoar por todas essas coisas”, ela acrescentou. “Depois disso, eu posso viver minha vida.”.

Sharypova também me contou que encontrou dificuldades quando começou a procurar emprego após retornar a Moscou, com muitas companhias se recusando a contratá-la após descobrirem suas denúncias contra Zverev.

“Na Rússia, nas grandes empresas, eles estão te checando”, ela disse. “Quando eles viram minhas entrevistas falando, contando a minha história para o mundo, disseram, ‘Oh, essa garota tem muitos problemas — não.’. Agora, estou numa boa empresa com ótimas pessoas, mas eu não quero dizer onde eu estou trabalhando. Eu gosto do meu trabalho.”.

(Sharypova contou que, por conta de sua busca por um emprego, ela deletou a sua primeira publicação sobre a violência que sofreu e trancou sua conta no Instagram no começo do ano. Mas disse que mantém sua história e tudo que ela disse em nossas entrevistas.).

Em nossa conversa de novembro, Sharypova afirmou ter um recado para Zverev. “Quero perguntar a ele: por que você não diz a verdade? Não é sobre mim, é sobre a sua vida”, disse. “Você deveria ser honesto consigo mesmo.”.

Ao mesmo tempo, ela insistiu que sua decisão de trazer tudo à tona não era sobre ele.

“Eu queria deixar público, ser honesta com todos vocês”, disse. “Muitas meninas nessa situação estão em silêncio. Elas não falam sobre isso porque estão com medo de comentários falando que não é verdade e coisas desse tipo. Eu só quis mostrar que não é difícil falar sobre isso. Já aconteceu na vida real, você já vivenciou aquilo. Você sabe que disse a verdade, você sabe que não é uma má pessoa, e você não merecia isso.”.

Publicado originalmente em 25 de agosto de 2021.

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