Pesquisas indicam que sou um alegre e dadaísta urso azul indie
Afirmei para uma conhecida que toda vez que a via lembrava da cor amarelo. Ela ficou surpresa. Primeiro porque talvez não tivéssemos o tipo de intimidade para ter essa conversa, segundo porque ela nunca tinha se imaginado sendo lembrada por essa tonalidade. O grupo de amigos que estava conosco se dividiu: uns também a viam como amarelo, outros sugeriram que ela era um tom queimado de burgundy fluorescente e tinham aqueles, sem muita imaginação, que achavam que ela era apenas uma pessoa.
Durante uma palestra sobre branding, o palestrante pediu que fizéssemos um exercício. Tínhamos que responder a pergunta “se eu fosse um animal, que animal eu seria?” levando em consideração três perspectivas diferentes: a nossa perspectiva pessoal (que animal eu gostaria de ser); a perspectiva do que mostrávamos para os outros (que animal representaria melhor minhas qualidade e atitudes cotidianas); e a perspectiva dos outros (que animal as pessoas acham que eu seria).
Quando fui responder à pergunta segundo a primeira perspectiva, escolhi um animal muito legal tipo um leão, um dragão ou um grifo. Ao entrar na segunda perspectiva, me lembrei que não era imponente o suficiente para ser um leão, nem quente o suficiente para ser um dragão e nem híbrido o suficiente para ser um grifo. Acabei escolhendo um animal que acreditei ter mais em comum comigo, como um panda ou um bicho-preguiça. Na terceira perspectiva, eu empaquei.
O que as pessoas pensam de você não depende apenas do que você é ou do que você mostra, depende de todas as experiências, sentimentos e valores de cada indivíduo que forma uma opinião sobre você. Felizmente, quando você cursa publicidade, comunicação ou qualquer um desses cursos considerados “criativos”, você acaba fazendo vários trabalhos diferentes e inusitados. Melhor ainda, você pode inventar um questionário falso para descobrir como as pessoas te veem de forma abstrata, e falar que é para um trabalho da faculdade. Todo mundo vai acreditar. Bom, pelo menos todo mundo acreditou quando eu fiz isso.
O Questionário
O meu questionário fake, produzido rapidamente em uma noite de lua cheia, continha as seguintes perguntas:
- Se eu fosse um animal, qual animal seria?
- Se eu fosse uma cor, qual cor seria?
- Se eu fosse um estilo musical, qual estilo musical seria?
- Se eu fosse uma emoção, qual emoção seria?
- Qual vocês acham que seria minha casa de Hogwarts? (Opcional, pois descobri, para meu horror, que nem todo mundo leu/assistiu Harry Potter)
- Se vocês pudessem me definir em uma palavra, qual palavra seria?
- Em que tipo de situação você lembra da minha existência?
- Comentários?
Os Resultados
Planejei deixar o questionário aberto indefinidamente. Em apenas 3 dias consegui 59 respostas anônimas, mas depois desse período não houve mais nenhuma participação. Inicialmente acompanhei todas as respostas com entusiasmo. No segundo dia, conforme as linhas da planilha de resultados se multiplicavam, resolvi esperar que as respostas acabassem de chegar para só depois tentar entender o “quadro maior”. Uma semana depois, fiz uma leitura geral dos dados e decidi que escreveria esse texto contando os resultados e as minhas conclusões sobre. Cinco meses depois aqui estou finalmente escrevendo o texto com os dados tabulados.
1. Se eu fosse um animal, qual animal seria?
Vencedor: Urso
Segundo lugar: Coala
Surpresas: Cobra (sou, mas não imaginava que fosse de conhecimento público), Tamanduá e Tubarão-martelo (oi?).
Conclusões: Não fiquei surpreso com o urso, já imaginava que fosse visto dessa forma. Com o resultado, até fiquei mais interessado em ursos em geral e considero uma boa forma de me representar: peludo, gordo, ataca piqueniques para roubar comida. O coala foi uma surpresa, até porque ficou em segundo lugar. Não faço ideia do porquê as pessoas me veem sendo um coala. O elefante foi interessante porque fiquei me perguntando se as pessoas me associavam a ele por já ter participado de uma empresa júnior cujo mascote era um elefante.
2. Se eu fosse uma cor, qual cor seria?
Vencedor: Azul e Verde (empate)
Segundo lugar: Laranja e Amarelo (empate)
Surpresas: Verde, laranja, amarelo e marrom (é cor de cocô, gente).
Conclusões: Eu realmente uso muito azul, mas me surpreendi com verde, não é exatamente uma cor que eu goste ou utilize com frequência. Parece que o feitiço voltou contra o feiticeiro e algumas pessoas também me relacionam com a cor amarelo (e eu também não entendo o porquê).
3. Se eu fosse um estilo musical, qual estilo musical seria?
Descrição da pergunta: Pode ser apenas uma música também.
Vencedor: Indie e Pop (empate)
Segundo lugar: Folk
Surpresas: Brega (quem sabe daqui uns 30 anos), trap e jazz.
Conclusões: Em relação a gosto, as respostas se assemelharam muito aos meus. Não gosto muito de folk, mas acho agradável. Porém, acredito que, ao responderem essa pergunta, os respondentes não levaram apenas o meu gosto musical em consideração. Acho que muito de como eu me visto, e meu estilo em geral, inspirou essas respostas. Afinal, música e moda estão muito ligadas no imaginário das pessoas.
4. Se eu fosse uma emoção, qual emoção seria?
Descrição da pergunta: Lembrem de “Divertida Mente”.
Vencedora: Alegria
Segundo lugar: Medo
Surpresas: “Terror e pânico” (pesado), foco (queria) e cautela (queria também).
Conclusões: Essa pergunta foi bem fracassada. Na descrição, citei “Divertida Mente” como uma referência, o que levou muitos respondentes a acharem que eu estava pedindo para me classificarem como uma das cinco emoções do filme, quando eu queria ser classificado como qualquer emoção. Aprendi com isso que preciso ser mais específico em questionários. No mais, acredito que algumas pessoas foram muito honestas e sinceras em suas respostas, o que me fez refletir sobre algumas coisas na minha vida.
5. Qual vocês acham que seria minha casa de Hogwarts?
Descrição da pergunta: Lembrando que são: Grifinória, Sonserina, Corvinal e Lufa-Lufa. Como muita gente pode não ter conhecimento sobre Harry Potter, essa pergunta não é obrigatória.
Vencedor: Lufa-Lufa
Segundo lugar: Grifinória (eca).
Surpresas: A quantidade de pessoas que não está familiarizada com Harry Potter.
Conclusões: Já imaginava qual opção seria a mais recorrente, mas fiquei surpreso com o segundo lugar. Esperava mais Sonserina.
6. Se vocês pudessem me definir em uma palavra, qual palavra seria?
Como as palavras foram muito variadas, fiz o famoso word cloud. Fiquei satisfeito que o termo mais aparente foi dadaísmo, pois me esforço para me associar a essa palavra.
As perguntas 7 e 8 tiveram respostas das mais variadas e foram menos simbólicas e mais pessoais. Alguns respondentes levaram bem a sério e até me passaram feedbacks sobre como eu sou e o que poderia melhorar na minha vida. Essas respostas ajudaram muito em autoconhecimento, apesar de não concordar com todos.
A Conclusão Final
Gostei muito. Sempre me interessei nesse tipo de representação e associação mais simbólica e foi muito satisfatório conseguir respostas mais concretas sobre como as pessoas me veem sem ter de fato que perguntar isso para elas cara a cara. Como profissional, pude refletir sobre o que queríamos ser versus o que somos versus como as pessoas nos percebem. Se eu pudesse ser um animal, gostaria de ser um dragão, mas os outros acham que eu seria um urso. A escolha ainda é minha. Claro que tudo isso é muito relativo quando aplicado a pessoas. Mas e quando aplicamos esse raciocínio a marcas? Vale mais a pena ser o dragão ou o urso? Posso investir em me tornar um dragão, ou posso ser o urso sensacional que eu puder ser.
Uma terceira opção, que eu guardei para o final por razões dramáticas, é encontrar o que você é exatamente entre o que você queria ser e como os outros te veem. Basicamente, essa é a solução urso-dragão. Você não precisa se encaixar em uma categoria, pode ser algo novo, único. Nem só urso, nem só dragão, nem só azul, nem só verde, nem só biscoito, nem só bolacha. Algo que só você pode ser. Como você acha que os unicórnios surgiram?
